Tarifaço dos EUA ameaça mais de 700 mil empregos; ministro do Trabalho garante ações de proteção

Estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) projeta que as novas tarifas impostas pelos Estados Unidos a produtos brasileiros podem levar à perda de até 726.701 empregos no país em um cenário crítico no prazo de um ano (acesse aqui a íntegra do estudo do Dieese).

O impacto seria sentido principalmente no setor de serviços (241 mil postos), indústria de transformação (215 mil) e comércio (142 mil), com reflexos diretos na massa salarial, que teria redução de R$ 14,33 bilhões, e na arrecadação de impostos e contribuições previdenciárias, que cairiam R$ 11,01 bilhões.

A análise foi apresentada pela diretora técnica do Dieese, Adriana Marcolino, durante live das centrais sindicais realizada nesta quarta-feira (13). Os dados são uma estimativa considerando o pior cenário possível, em que as empresas não conseguem redirecionar as exportações afetadas para outros mercados.

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Caso parte dessas vendas seja realocada, o impacto seria menor, mas ainda significativo: um estudo alternativo do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da UFMG (Cedeplar) estima uma perda mínima de 57.302 empregos em dois anos, podendo chegar a 188.707 se não houver compensação.

O secretário-geral da CSB, Álvaro Egea, representou a central no debate e destacou a importância da participação dos trabalhadores na formulação de políticas econômicas diante do tarifaço imposto pelos Estados Unidos. Ele relembrou a crise de 2008, quando o governo Lula adotou medidas como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em diálogo com os sindicatos.

“É essencial que, como em 2008, as ações governamentais priorizem a preservação de empregos e o diálogo com os sindicatos. Diante da complexidade do cenário atual – com cerca de 3.000 empresas afetadas e 1.500 datas-base envolvidas –, apenas o movimento sindical tem condições de monitorar o impacto real do tarifaço diferentes categorias. Sua presença é crucial para fiscalizar a execução das políticas públicas e evitar desvios de recursos destinados à proteção da economia e do emprego”, disse.

Ministro do Trabalho defende cautela

O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, enviou um pronunciamento em vídeo às centrais no qual afirmou que o Brasil não deve “se desesperar” com as novas tarifas impostas pelos Estados Unidos, que hoje respondem por 12% das exportações brasileiras versus 25% em 2003. “Não é que diminuiu as exportações para os Estados Unidos, mas nós abrimos muitos outros mercados”, explicou, citando a abertura de 387 novos mercados nos últimos dois anos e meio.

Marinho detalhou um plano de ação para proteger os empregos com três eixos principais: compras governamentais de produtores afetados, linhas de crédito com cláusulas de manutenção de emprego e utilização de instrumentos da CLT como layoffs.

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Ele destacou também que os sindicatos devem ter cuidado especial nas negociações coletivas que realizarem a partir do próximo mês e não deixar que as empresas se aproveitem da situação para fecharem acordos pouco vantajosos.

“Os principais acordos coletivos ocorrem entre setembro e novembro. Quero pedir que estudem a realidade de cada empresa para caprichar na negociação coletiva. Esse episódio nos obriga a estar mais atentos para não comprar gato por lebre. Pode haver empresas que queiram aproveitar a situação para evitar reajustes salariais ou negociar de forma rebaixada”, afirmou.

Queda na renda e pressão nas negociações

Além do desemprego, os trabalhadores podem sentir os efeitos do tarifaço na renda. Dados do Ministério do Trabalho mostram que, em 2025, os reajustes salariais médios nas empresas exportadoras para os EUA ficaram em 0,85% acima da inflação, uma recuperação após anos de resultados negativos. No entanto, o piso salarial médio dessas categorias permanece baixo: R$ 1.500, equivalente a pouco mais de um salário mínimo.

O relatório do Dieese também alertou para o risco de, com a queda nas exportações, as empresas pressionarem por acordos menos favoráveis nas negociações coletivas. Atualmente, 3.075 empresas que vendem para os EUA possuem acordos diretos com sindicatos, sendo a maioria (1.933) do setor industrial. Essas negociações envolvem 1.459 entidades sindicais, que representam 2,36 milhões de trabalhadores – sendo que um terço está em sindicatos com mais de 10 mil filiados.

Setores mais afetados

O temor quanto ao emprego e à renda decorre da dependência brasileira do mercado americano. Em 2024, o fluxo comercial entre os dois países foi de US$ 81 bilhões, com os EUA respondendo por 12% das exportações brasileiras (atrás apenas da China, com 28%). O Brasil, porém, tem déficit comercial com os americanos desde 2009, e as novas tarifas atingem produtos que, juntos, representam US$ 40,4 bilhões em vendas externas.

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Desse total, US$ 14,5 bilhões (35,9%) estão sujeitos a tarifas extras de 10% a 40%, enquanto outros US$ 7,9 bilhões (19,5%) já sofrem com taxas específicas, como as de 50% para aço e alumínio. Entre os setores mais expostos estão:

  • Carne bovina (tarifa pode chegar a 76,4%, com perdas estimadas em US$ 1 bilhão);
  • Café (o Brasil fornece 34% do consumo americano, mas enfrenta concorrência de Colômbia e Vietnã);
  • Frutas (manga, uva e processadas representam 90% das vendas para os EUA, com risco de demissões sazonais);
  • Siderurgia (já taxada em 50%, com 3,4 milhões de toneladas exportadas em 2024);
  • Autopeças (tarifa de 50% para caminhões e queda de 4,9% nas vendas no primeiro semestre de 2025).

Assista à live na íntegra abaixo:

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