Veja o discurso do presidente Antonio Neto na audiência pública sobre a reforma trabalhista

Sessão temática acontece hoje, 16, no Senado Federal; audiência debate a reforma que irá alterar as leis trabalhistas no Brasil

Leia abaixo o discurso do presidente da CSB, Antonio Neto, na audiência pública para debater a reforma trabalhista; sessão acontece desde a manhã do dia 16 no Senado Federal.

Senhoras e Senhores Senadores

Resgatar a história, neste momento, se faz necessário.

Em pleno Século 21, infelizmente, vemos que a mentalidade atrasada e míope da elite brasileira não se alterou em uma única vírgula.

Manteve-se congelada no Século 18.

O mercado, a economia, o dinheiro, o lucro e o crescimento a qualquer custo sempre foram usados para justificar os maiores crimes contra a civilização e contra os seres humanos.

Foi assim com a escravidão e é assim nos dias de hoje, quando o setor patronal banca uma proposta de retrocesso nos direitos trabalhistas e sociais, chancelada na Câmara com uma rapidez jamais vista na história.

Ao se deparar com o fim da escravidão, um senador gaúcho, Gaspar Silveira Martins, usou a Tribuna do Senado para tentar evitar o que eles chamavam de caos econômico. Dizia ele:

“Quem se atreverá a decretar de chofre uma medida que vai de encontro à vida da nossa Pátria, que será a morte da lavoura e da indústria, o esfacelamento, a destruição e a ruína deste vasto Império? ”.

Infelizmente, essa mentalidade não foi enterrada com esse cidadão e com o fim da escravidão.

Ela se manteve viva, sobretudo nos galhos apodrecidos de sua vertente.

Todo direito humano, social e trabalhista sempre foi e é visto por esta elite atrasada como um entrave para a economia e para o mercado.

Afirmam que ter direito é ruim para a pessoa.

Ei, amigo, dizem, você está desempregado porque tem um monte de aproveitadores que têm carteira assinada, têm direitos.

Mesmo após a abolição, ainda na República Velha, em 1926, ao se discutir a possibilidade de o trabalhador ter direito a férias de 15 dias, cravejou-se na história a mensagem de Otávio Pupo Nogueira – então dirigente da entidade embrionária da Fiesp:

Dizia ele:

“Que fará um trabalhador braçal durante 15 dias de ócio?

Ele não tem o culto do lar, como ocorre nos países de padrão de vida elevado.

Para nosso proletariado, para o geral do nosso povo, o lar é um acampamento – sem conforto e sem doçura. O lar não pode prendê-lo e ele procurará matar as suas longas horas de inação nas ruas.

A rua provoca com frequência o desabrochar de vícios latentes e não vamos insistir nos perigos que ela representa para o trabalhador inativo, inculto, presa fácil dos instintos subalternos que sempre dormem na alma humana, mas que o trabalho jamais desperta! ”.

Veio Getúlio, a CLT foi criada, os direitos trabalhistas foram estabelecidos.

O ingresso dos brasileiros negros e mulatos ao mercado de trabalho foi forçado através da lei dos 2/3, pois o ódio dos escravagistas não permitia a contratação de brasileiros mulatos, pardos e negros.

Os escravocratas preferiram jogar os negros na rua, importar trabalhadores europeus, mas não lhes dar empregos.

Vejam o ódio dessas pessoas!

O Décimo terceiro salário, já com Jango, foi tratado como o fim do mundo. Manchete do Globo estampava a quebra do Brasil, pois a economia e o mercado não resistiriam.

A Ditadura militar fechou os sindicatos. Afinal, para eles os sindicatos eram os inimigos dos trabalhadores, da economia e do mercado. A estrutura financeira das entidades dos trabalhadores agora é tratada como o grande mal da humanidade.

Vejam que os deputados que cortam os direitos trabalhistas e previdenciários, de repente, viraram os defensores dos trabalhadores.

A licença maternidade foi reprimida em 1988 pelos supostos defensores do emprego.

Dar o direito a uma criança ser amamentada, na opinião dos herdeiros de Silveira Martins, seria uma restrição mortal para a mulher ter seu espaço no mercado de trabalho.

Essa mesma linha de raciocínio figura agora na reforma trabalhista.

Para os defensores, é um absurdo não permitir que uma mulher grávida trabalhe em lugares insalubres e perigosos.

Afinal, essa restrição tira o emprego da mulher.

Na década de 90 vivemos a onda do empreendedorismo. A modernidade era o cooperativismo.

Engenheiros disputavam vagas de gari, de vendedores de cachorro quente. Sem nenhum demérito a estas atividades, mas isso não era fruto de escolhas, mas de falta de emprego, de comida, do empobrecimento da população.

Passamos nessa década por um dos momentos de grande desemprego e imensa informalidade.

Conseguimos superar esta fase, geremos empregos.

Mas para a Fiesp, para os bancos, para a CNI, nada mudou. Ainda é preciso mais, temos muitas leis, muitos direitos. Num arroubo de sinceridade, o presidente da CNI se traiu e defendeu uma jornada de trabalho de 80 horas semanais.

Isso é que eles querem.

O senhor Otávio Pupo Nogueira deve estar orgulhoso da CNI, da Fiesp e de uma parte da Câmara dos Deputados.

Senhores e senhoras, infelizmente estamos revivendo isso aqui no Parlamento.

Nunca vi tanto ódio e rancor de parcela da Câmara e do Senado contra os trabalhadores e contra o movimento sindical.

Dizem com raiva que a legislação trabalhista, os sindicatos e as leis são o grande problema do Brasil, do desemprego, da economia e do mercado.

Em discursos inflamados, gaúchos seguidores de Silveira Martins, afirmam que a CLT é velha, que os sindicatos são arcaicos, que a modernidade da livre negociação é a segurança do mercado e da empregabilidade.

Vendem para os trabalhadores que a Reforma trabalhista consiste em duas questões principais:

O fortalecimento dos sindicatos, através da negociação coletiva, e a liberdade perante a lei, pois acabarão com a contribuição sindical e com os sindicatos acomodados.

Vejam só: Fortalecer os sindicatos e a negociação coletiva. Eu lhes pergunto com toda sinceridade.

Onde Senhores Senadores e Senhoras Senadoras ????

Tentam vender para o trabalhador o oposto do que representa esta reforma.

Dizem que ela significa o fortalecimento dos sindicatos, da negociação coletiva, do emprego, da liberdade.

Mas ela é o oposto.

Representa a substituição dos contratos de trabalho por sistemas precários.

Representa o fim do direito e da negociação coletiva e a implementação do acordo individual.

Representa a devastação do Direito do Trabalho.

Repito: O centro desse retrocesso trabalhista é o fim da carteira assinada e dos direitos trabalhistas.

Na prática é isso. A realidade é essa e todos sabem disso.

Não é à toa que mais de 60% dos trabalhadores, mesmo sem saber a fundo o conteúdo desta proposta, são contra.

Não é à toa que, apesar de toda companha contra o financiamento sindical, metade dos trabalhadores defendem a manutenção da contribuição obrigatória para suas entidades, como apontou pesquisa Data Folha.

O trabalhador sabe que a contribuição compulsória é a forma dele contribuir com sua luta, com a melhoria da sua vida, sem a perseguição do Patrão, sem que ele sofra assédio moral ou ameaça de demissão caso se filie ao sindicato.

Sim meus amigos, isso ocorre no Brasil.

Assim como ocorre assassinatos de sindicalistas, massacres de camponeses e índios.

Assim como existe o trabalho escravo, não nos rincões do Brasil, mas no centro de São Paulo, praticado por marcas multinacionais, que vendem roupas caríssimas para as madames.

Esse debate da reforma trabalhista não começou agora.

Ele permeou a última eleição presidencial, que foi decidida entre quem queria manter os direitos trabalhistas e previdenciários e aqueles que defendiam a sua flexibilização.

Isso não mudou.

Quem defendeu a Reforma da Previdência e trabalhista perdeu a eleição.

O mesmo irá ocorrer com a maioria desta casa que venha a apoiar esta desgraça, apenas para lembrar a assertiva da deputada Luiza Erundina.

O povo não é bobo, a mídia não tem mais o controle absoluto da informação.

Todos sabem que a reforma, aprovada na calada da noite na Câmara dos Deputados, vem para dizimar com os direitos.

E isso abre espaço para propostas como a de Nilson Leitão, deputado do PSDB do Mato Grosso, que teve a audácia de propor abertamente o retorno da escravidão, por meio de lei que prevê o pagamento salário no campo com comida e moradia.

Queremos o debate da modernização das relações de trabalho.

Não somos contra, defendemos o exercício da negociação.

Mas vivenciamos a prática, a realidade.

Vivemos num País onde mais de 1,8 milhões de brasileiros declararam ao IBGE que vivem sob regime escravo, que devem mais para o patrão pela comida e moradia.

Vivemos num País onde cerca de 2,6 milhões de crianças e adolescentes são expostos a situações de trabalho infantil no Brasil;

Vivemos num País onde mais de 14 milhões de brasileiros se declaram desempregados;

Vivemos num País onde mais de 20 milhões de brasileiros vivem na miséria;

Vivemos num País onde mais de 13 milhões de brasileiros são analfabetos;

Este é o País que vivemos.

Tudo isso com leis.

E vocês acham que a flexibilização irá diminuir com estas chagas?

Claro que não.

Apenas irá legalizar tudo isso, permitir que a regra geral para os trabalhadores seja esta.

E nos indigna ouvir aqui alguns senadores afirmarem que é melhor o cidadão ficar em casa esperando para ser chamado para um trabalho de duas horas do que não ter emprego.

Mas mesmo assim, a maioria da população sabe o que representa a suposta reforma trabalhista e previdenciária.

Sabem por que?

Por que ela é um engodo.

Na prática, Vossas Excelências sabem que ela irá acabar com os direitos.

Vejam o que acontecerá:

O Trabalho intermitente, por exemplo, ao invés de gerar empregos formais, causará desemprego. Esse é o mais perverso. Todo comércio, bar e restaurante, na prática, irá substituir seus trabalhadores fixos por contratos intermitentes, para serem chamados quando o empregador desejar.

O trabalhador autônomo contínuo causará uma onda de pejotização jamais vista na história deste País.

O trabalhador temporário irá substituir os celetistas fixos para equilibrar a produção e a demanda da indústria.

A rotatividade aumentará, a fila do desemprego forçará a queda dos salários.

O desmantelamento dos sindicatos causará a queda da massa salarial.

Os terceirizados, com menores salários, tomarão o mercado de trabalho e as convenções coletivas dos sindicatos que sobreviveram, serão inócuas.

Afinal a lei diz que os patrões “poderão” oferecer as mesmas condições dos demais trabalhadores ada empresa.

Poderão? Vejam o que está na lei aprovada na Câmara.

As empresas poderão pagar salários equivalentes.

Lei serve para dizer se pode ou não pode. Ou nosso parlamento abandonará de vez o seu papel institucional e passará a redigir manuais de incentivo?

Da mesma forma que o fortalecimento da negociação veio com a proibição dos sindicatos organizarem as comissões de fábrica. Existe algo mais inconstitucional do que isso?

O Estado proibir o sindicato de organizar a comissão de fábrica?

Proibir o Sindicato de organizar a Comissão de fábrica é tão perverso como interferir na sua estrutura financeira.

Mas dizem que querem o fortalecimento das negociações. Sim, que bela maneira de incentivar a negociação, fortalecendo ainda mais a parte forte contra o setor mais fraco que são os trabalhadores.

Acabam com a estrutura financeira dos sindicatos laborais e mantém a estrutura das federações patronais através do sistema S.

A Fiesp gasta uma fortuna em anúncios para defender o fim da contribuição, mas desvia R$ 100 milhões por ano dos recursos do Sesi para se manter.

E os senhores sabem que a contribuição sindical laboral é paga pelo trabalhador.

Já a contribuição patronal, as contribuições para o sistema S, não são pagas pelos empresários, são pagas pela sociedade, estão nos preços dos produtos e serviços.

Portanto os senhores querem que a sociedade financie as entidades patronais e querem proibir o trabalhador de contribuir com sua entidade?

Eis um grande instrumento de fortalecimento das negociações.

E notem que estamos falando de um projeto escrito pelo setor patronal e todos sabem disso.

Escancaradamente um projeto dos patrões para dizer como deve ser a organização sindical e o seu financiamento.

Mas vejam, nobres senadores e nobres senadoras. Vamos mais longe. Quero abordar também a Reforma da Previdência para mostrar a incoerência destas proposições.

O governo alega ser necessário reformar a Previdência.

Apresenta uma proposta que na prática pune o trabalhador mais pobre, os trabalhadores rurais, as mulheres, alegando que a Previdência estaria quebrada, porque o governo não possui recursos para sustentar a aposentadoria.

Divulga dados mentirosos, a ponto de afirmar que a Previdência consome mais de 50% do orçamento.

Os senhores conhecem o Orçamento e sabem o quanto é mentirosa essa afirmação, pois o que consome 50% dos recursos da União são os gastos com a dívida.

Então, na Previdência propõe punir os trabalhadores, os obriga, em muitos casos, a trabalhar até a morte, para – abre aspas – sanear a Previdência e as contas públicas.

Do outro lado, volta a punir os trabalhadores, corta os seus direitos trabalhistas, presenteando os empresários e os bancos com modelos de contrato de trabalho que os permite, legalmente, sonegar as contribuições previdenciárias, as contribuições para o Fundo de Garantia, para o FAT, além de outros impostos que são indispensáveis para o funcionamento do Estado.

O problema do custo do trabalho, se é que isso é importante para o governo, não está na reforma trabalhista e sim na reforma tributária.

Pego como exemplo o meu setor, de tecnologia da informação.

Com a desoneração da folha, mesmo diante da crise, conseguimos manter e ampliar a formalização. Aumentamos a arrecadação. Ampliamos a formalização ao substituir os 20% da Previdência pela tributação na Folha.

Entre 2010 e 2015, foram gerados mais de 95 mil empregos no setor de TI, com forte formalização de mão de obra. A remuneração cresceu 14,3% ao ano, no período, atingindo R$ 28,8 bilhões, enquanto a receita bruta chegava a R$ 78, bilhões, experimentando um crescimento anual de 12%.

Aumentamos a arrecadação do Estado, formalizamos e geramos renda.

O que fizeram os gênios do governo? Acabaram com isso, pois preferem incentivar a informalidade.

Enfim, não é nenhum exagero afirmar que o pacote de reformas pretendidas pelo governo busca desmontar o mercado de trabalho, acabar com o sistema de proteção social civilizatório e, na prática, retroceder o País ao século 17, jogando milhões de brasileiros novamente na escravidão.

As propostas em tramitação no Congresso sobre reforma previdenciária, trabalhista e rural são perversas, destrutivas, nocivas também por promoverem o empobrecimento da população, o desmonte da economia e a diminuição da arrecadação do Estado.

As propostas não são impopulares.

Não são um remédio amargo.

São ruins para o povo e para o País.

Não são modernas e sim um retrocesso.

Por isso, primeiro eu apelo para as vossas consciências.

Não permitam este escárnio.

Não sucumbam.

Não sejam cúmplices desta barbárie.

Não manchem vossas biografias.

Se isso não for suficiente, apelo para vossas bases, seus eleitores.

Alguns ministros do governo afirmam que não são candidatos e que não estão preocupados com popularidade, que já estão com a vida ganha.

Não se iludam senhores, os tempos mudaram, o povo está sensível e não irá perdoar tamanha traição.

Se eles não são candidatos, dois terços desta Casa serão. Os 513 deputados são candidatos.

As redes sociais, o esclarecimento feito pelos sindicatos em suas bases, estão conseguindo superar o poder de mentiras.

Aprovar estes temas prejudiciais para os trabalhadores a toque de caixa não irá esconder o mal que eles promoverão no País.

O povo sentirá isso ao se aposentar, ao ter o seu salário reduzido, ao ter o seu emprego cortado para a contratação de um temporário, terceirizado ou intermitente.

Ao ter sua vida transformada.

Estão tentando suprimir o papel do Senado, tentando evitar o debate e vossa função institucional.

Não permitam, esta Casa precisa, diante dos olhos da Nação, preservar a dignidade do Senado da República.

Por fim, senhores e senhoras.

Como peemedebista, filiado ao Partido a mais de 40 anos, é lastimável ver que uma parcela da direção do Partido é responsável e articulador desta devastação social.

O PMDB foi o fiador e promotor da Constituinte de 1988, um dos processos mais democráticos, profundos e modificadores da nossa história recente.

O PMDB foi o formulador das leis que buscavam suprir as necessidades e os anseios da sociedade brasileira, em especial, da sobreposição dos direitos elementares do ser humano diante das possíveis forças de exploração sobre o próximo.

Na esfera social, asseguramos a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a Previdência Social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, entre outros direitos que fundamentaram programas que libertaram milhões de brasileiros do desamparo histórico a que foram submetidos.

No campo sindical, o PMDB garantiu os princípios elementares para fortalecer as entidades sindicais e as lutas dos trabalhadores, consagrando o direito de greve, a redução da jornada de trabalho para 44 horas, mantendo a unicidade sindical e a contribuição compulsória, instrumentos fundamentais para a independência dos trabalhadores.

Foi de um peemedebista, do deputado José Fogaça, a lavra do Artigo 8º da Constituição.

Mas para a infelicidade do Partido, para a tristeza do povo brasileiro, em agressão à memória de líderes como Ulysses Guimarães, Itamar Franco, Paes de Andrade, Pedroso Horta, Orestes Quércia e tantos outros, são integrantes do PMDB que tentam implementar a atrocidade das reformas trabalhista e previdenciária, rasgando de uma só vez a maior parte dos avanços sociais que custaram o sangue e o suor do nosso povo.

Mas como dizia o saudoso Ulysses Guimarães:

“A história nos desafia para grandes serviços, nos consagrará se os fizermos, nos repudiará se desertarmos”

Portanto, não desertaremos da batalha, vamos à luta em defesa dos nossos direitos, mesmo que em trincheiras distintas.

 

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