Central dos Sindicatos Brasileiros

Petrobras manteve funcionário 11 dias sem voltar para casa durante greve em fevereiro

Petrobras manteve funcionário 11 dias sem voltar para casa durante greve em fevereiro

Estatal é acusada pelo MPT de manter funcionários em cárcere privado; empresa nega

A Petrobras é acusada pelo Ministério Público do Trabalho de ter mantido 73 trabalhadores da refinaria Presidente Bernardes, em Cubatão, em situação de cárcere privado durante a greve deflagrada no início deste ano.

Um funcionário chegou a ficar 11 dias seguidos na função, sem voltar para casa, obrigado a dormir em bancos e colchões improvisados.

A Petrobras diz repudiar a alegação de cárcere privado e afirma exercer atividade ininterrupta e essencial à população.

No dia 6 de fevereiro, um dia antes da data marcada para o início da paralisação convocada pelo Sindicato dos Petroleiros do Litoral Paulista, a empresa teria impedido os funcionários que cumpriam um turno a deixar a refinaria e também os primeiros que chegavam para o período seguinte.

O MPT pede que a empresa seja condenada a pagar R$ 100 milhões por danos morais coletivos, além de indenizações individuais de R$ 100 mil a cada um dos trabalhadores.

A empresa teria alegado, segundo a ação apresentada pela procuradoria, “situação de segurança” para impedir que os trabalhadores deixassem o local.

O coordenador-geral do Sindipetro-LP, Adaedson Costa, diz que cada turno da refinaria tem 8 horas de duração, durante as quais 60 pessoas trabalham. Devido à complexidade da atividade, cada funcionário transfere o turno para aquele que ficará no turno seguinte.

Essa rendição, como os petroleiros chamam, é quando quem está saindo explica a situação de cada operação e o que precisa ser observado nas horas seguintes.

Foi nessa troca de turno, quando alguns já tinham chegado para render os colegas do horário anterior é que a situação de cárcere teria começado, segundo a procuradoria regional do Trabalho.

Na época, a Petrobras ajuizou dissídio coletivo junto ao TST (Tribunal Superior do Trabalho) e conseguiu uma liminar para manter 90% dos empregados trabalhando durante a greve.

O MPT diz que, apesar da decisão garantindo o contingente de funcionários, a estatal impediu que 73 trabalhadores deixassem seus postos de trabalho.

O Sindicato dos Petroleiros do Litoral Paulista chegou a entrar com um pedido de habeas corpus coletivo para liberar o pessoa. A liminar da 2ª vara do trabalho de Cubatão saiu no dia 12 de fevereiro.

Porém, segundo a procuradoria, a empresa ainda ainda manteve 26 pessoas trabalhando até 21 horas do dia 13, somando oito dias consecutivos de trabalho.

Segundo os trabalhadores ouvidos pelo MPT, a empresa sempre deixou claro que eles só poderiam sair dos postos de trabalho se houvesse rendição presencial feita por outro trabalhador.

Um deles relatou que, após ser obrigado a ficar 150 horas na refinaria, só foi liberado quando o oficial de justiça chegou com a ordem judicial, obrigando a empresa a fazer a substituição.

O procurador Rodrigo Lestrade, que representa o MPT na ação, diz que Petrobras afirmou, nos autos do habeas corpus, que não liberou os empregados porque caberia ao sindicato indicar quem os substituiriam.

Costa, do Sindipetro-LP, diz que o sindicato nunca se opôs a fazer as trocas de turno, mas exigia que isso fosse negociado, o que a empresa teria recusado.

“A empresa alega que tem que manter um contingente e a gente entende, mas isso tem que ser negociado. Ela quer que a gente faça greve sem que haja prejuízo operacional, isso não existe”, diz.

A redução na produção diária, segundo Costa, seria uma saída para que a greve fosse respeitada ao mesmo tempo em que a atividade fosse continuada. “Entre 2018 até começo de 2020, antes da pandemia, a própria Petrobras decidiu, por decisão de gestão, manter as refinarias com 60%,70% da capacidade de operação. Então é possível reduzir, sim.”

Na ação, o MPT diz ainda que diversos empregados relataram cansaço, dores de cabeça e pelo corpo ao deixarem a refinaria. Os funcionários mantidos na ativa disseram ter cochilado em bancos e colchões improvisados.

Ainda assim, segundo os relatos recolhidos pela procuradoria, em alguns setores isso não era possível, pois cabia ao funcionário a responsabilidade de manter a unidade operando, o que teria levado os trabalhadores a recorrer diariamente ao serviço médico.

Além dos pedidos de indenização, o MPT quer que a Petrobras seja obrigada a observar os limites de horário e do intervalo de 11 horas entre as jornadas, além do descanso semanal, mesmo em caso de greve.

A refinaria Presidente Bernardes é responsável pelo abastecimento de cerca de 8% da produção nacional de derivados de petróleo.

A ação do Ministério Público do Trabalho está na 2ª vara trabalhista de Cubatão e ainda não houve decisão.

Outro lado

Em nota, a Petrobras diz repudiar a alegação de prática de cárcere privado.

“A companhia já apresentou suas razões preliminares ao juiz responsável pelo caso, para o qual ainda não há decisão. A Petrobras seguirá defendendo seus direitos”, afirma.

A estatal diz também que exerce atividade ininterrupta e essencial à população e que tem como um de seus princípios o respeito à vida, às pessoas e ao meio ambiente.

“Vale registrar que, no movimento grevista ocorrido em fevereiro deste ano, deflagrado dois meses após o fechamento do Acordo Coletivo de Trabalho em vigor, o sindicato, desobedecendo ordem judicial do Tribunal Superior do Trabalho, negou-se reiteradamente a manter o contingente mínimo determinado por aquele Tribunal.”

Fonte: Folha de S.Paulo