Falta de fiscais dificulta combate ao trabalho escravo; 48% dos postos estão vagos

O cadastro de empregadores que submeteram trabalhadores a condições análogas à escravidão, a chamada “lista suja do trabalho escravo” do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), somou 472 empresas até este mês.

De janeiro até o último dia 21, os auditores fiscais do trabalho resgataram 2.847 pessoas exploradas em condição análoga à escravidão no Brasil. Além desses trabalhadores, os auditores encontraram até o mês de outubro 2.064 crianças e adolescentes em trabalho infantil, proibido por lei (Estatuto da Criança e do Adolescente).

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De acordo com as fontes ouvidas pela reportagem, é provável que esses dados, ainda que superlativos, subestimem a exploração ilegal da força de trabalho no Brasil. Segundo as fontes, o quadro de auditores fiscais do trabalho está defasado há anos.

“Se nós tivéssemos o número pleno de auditores fiscais do trabalho, mais operações possivelmente teriam sido realizadas e mais criminosos infratores teriam sido incluídos na lista daqueles que cometem a prática e o crime de trabalho escravo e de submissão ao trabalhador a condições degradantes”, afirma o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Bob Everson Carvalho Machado.

“Hoje nós temos na ativa 1.917 auditores, de um quadro possível de 3.644”, diz Machado. “É uma situação gravíssima que, obviamente, impacta em todas as áreas de atuação da inspeção do trabalho.”

Conforme Machado, a carência tem efeitos negativos em várias atribuições do MTE. “Impacta, por exemplo, na fiscalização do trabalho escravo. Impacta na fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista. Impacta na busca por ambientes de seguros de trabalho, não combatendo assim os acidentes no local de trabalho. Impacta no combate às piores formas de trabalho infantil. Impacta na fiscalização do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), na inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho e também na inserção de aprendizes.”

Denúncias não apuradas

A carência de auditores fiscais do MTE é lamentada por procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT). “Em 2023, já foram mais de 3,5 mil denúncias que chegaram aos órgãos públicos sobre trabalho em condições análogas à escravidão. O atual quadro de auditores torna quase impossível, ou inviabiliza que todas as denúncias sejam fiscalizadas”, reclama o coordenador nacional de Combate ao Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico no MPT, Luciano Aragão Santos.

Aragão assinala que o “prejuízo imediato é dos trabalhadores”, inclusive quando têm direito a benefícios previstos em lei. “O governo concede o seguro-desemprego especial, em três parcelas, para trabalhadores e trabalhadoras resgatados. Mas, para essa liberação, é necessário que o auditor fiscal esteja presente na força-tarefa [que flagra a exploração]. A alternativa, quando eles não estão presentes, é o MPT ajuizar uma ação para liberação judicial de seguro-desemprego. Mas, obviamente, é um processo mais moroso do que a liberação administrativa feita pelo auditor no próprio momento da fiscalização”, explica.

Segundo Aragão, a ausência de auditores nas forças-tarefas pode deixar impunes os empregadores que cometem crimes. “Quando o auditor fiscal não participa, o empregador acaba ficando imune e se livrando de uma série de autos de infração, e uma série de multas administrativas que incidem.”

Concurso anunciado

O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) anunciou que 900 vagas para auditores fiscais do trabalho serão ofertadas em concurso público no primeiro trimestre de 2024. Essa será a carreira com mais vagas no Concurso Nacional Unificado – 13,55% das 6.640 vagas. O edital deve ser publicado em 20 de dezembro.

Na opinião de Aragão, a reposição de 900 auditores “não é suficiente para ter um quadro ideal de fiscais de trabalho.” O presidente do Sinait concorda e calcula que seria necessário contratar um total de 1.727 novos auditores.

“Nós temos a expectativa de que, no prazo de validade do concurso, possam ser chamados os excedentes, aqueles aprovados pelo certame e que estão fora do número inicial de vagas”, diz Bob Machado.

A natureza das atividades dos auditores fiscais do trabalho é bem capilarizada nos diversos setores econômicos e em todo território nacional – no meio rural e no meio urbano, em pequenas cidades e em metrópoles. Assim, a distribuição dos futuros concursados é um ponto crítico.

“O mundo do trabalho está nos rincões espalhados do Brasil”, pondera Machado, alertando que a má distribuição dos concursados pode inviabilizar o trabalho dos auditores. “Não é possível imaginar que um único auditor conseguiria dar conta de toda a profusão de hospitais, comércios e indústrias de São Paulo”, exemplifica.

De acordo com o secretário de Inspeção do Trabalho do MTE, Luiz Felipe Brandão, a distribuição dos concursados por estado ainda não foi estabelecida. Um grupo de técnicos do ministério está mapeando as áreas com maior deficiência de auditores fiscais e onde se encontram situações mais críticas.

Ele admite que o concurso “não vai repor totalmente” o número de auditores necessários, mas ressalta que o recrutamento pelo certame “é o primeiro passo para caminhar nesse sentido.”

De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego, o salário inicial de um auditor fiscal do trabalho é de R$ 21 mil.

Fonte: Agência Brasil

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