Dados do Imposto de Renda mostram distorções na tributação das pessoas físicas no Brasil

Segundo Gobetti, os lucros e dividendos recebidos pelas pessoas físicas responderam por cerca de R$ 350 bilhões do total das isenções de IR no ano passado, ou o equivalente a 40% do total de rendimentos isentos.

“Hoje, pela experiência internacional é injustificável que se mantenha isenção total para lucros e dividendos”, afirma o economista. Ele explica que na maior parte dos países a tributação acontece tanto no âmbito das empresas como para as pessoas físicas.

“Há inúmeros mecanismos para aliviar uma dupla tributação dos lucros na medida em que as empresas já pagaram, mas também temos que evitar a dupla isenção”, opina Gobetti, citando os diferentes regimes tributários especiais em vigor no Brasil e a prática recorrente de profissionais liberais atuarem como empresa para escapar de uma mordida maior do fisco.

Infográfico mostra lista de isenções do Imposto de Renda por faixa de rendimentos (Foto: Infográfico: Alexandre Mauro/G1) Infográfico mostra lista de isenções do Imposto de Renda por faixa de rendimentos (Foto: Infográfico: Alexandre Mauro/G1)

Infográfico mostra lista de isenções do Imposto de Renda por faixa de rendimentos (Foto: Infográfico: Alexandre Mauro/G1)

Sistema tributário complexo
Apesar de defenderem uma revisão do atual montante de isenções, os tributaristas afirmam que qualquer discussão sobre mudanças e correções de distorções no imposto de renda precisam estar inseridas numa ampla revisão do complexo sistema tributário brasileiro. Atualmente, a tributação sobre consumo pesa mais do que a sobre renda e patrimônio, o que é considerado um modelo injusto pelos especialistas consultados pelo G1.

O pesquisador do Ibre/FGV e professor do IDP, José Roberto Afonso, afirma que é preciso repensar o imposto de renda com o resto do sistema tributário e em linha com o resto do mundo. “Se mexer nele isoladamente, é possível danos colaterais para a própria arrecadação e para a equidade que resulte em distorções maiores do que as já existentes”, afirma.

“Nenhum país do mundo tem quase tantos donos de empresas quanto empregados em empresas privadas e isso resulta de contribuições previdenciárias excessivamente pesadas, comparada ao resto do mundo”, observa.

Para Orair, sem uma ampla discussão, propostas recorrentes como a de criação de uma nova faixa de tributação com alíquota de 20% ou 35% (hoje, a máxima é de 27,5%) podem incentivar um aumento ainda maior da chamada pejotização, quando um empregado se torna um prestador de serviço, atuando como microempresa).

“O grosso da renda de quem está no topo da pirâmide já é isenta. Se aumentar a alíquota, quem será afetado é a parte dos contribuintes assalariados e funcionários públicos. O topo do topo não será atingido.”

Para Gobetti, não se trata apenas de passar a tributar mais os mais ricos, mas de tornar o sistema mais neutro e eficiente.

“No Brasil, tributa-se muito as empresas e pouco a renda, sobretudo a do capital. O ideal do ponto de vista de tributação ótima é que as várias fontes de renda, quer seja do trabalho ou do capital, sejam tributadas por alíquotas parecidas paras pessoas da mesma faixa de renda.”

Tendência internacional
O debate em torno de uma tributação de renda mais progressiva tem sido defendido no exterior como instrumento para reduzir a desigualdade social e também como medida de estímulo para o crescimento mais inclusivo. Em relatório publicado em abril, o Fundo Monetário Internacional (FMI) sugeriu que o Brasil deveria aumentar os impostos sobre a renda de indivíduos e reduzir impostos indiretos.

“O debate está muito quente no exterior, é uma tendência internacional. Vários países estão reduzindo a tributação no nível da empresa e aumentando a tributação da pessoa física”, afirma Orair, citando os recentes estudos e medidas dos governos Macron, Trump e Macri.

Os tributaristas destacam ainda o impacto das pesquisas do francês Thomas Piketty, o economista que ganhou fama mundial com seu best-seller “O Capital no Século XXI”, em que mostrou que o capitalismo vem concentrando renda. Uma das conclusões mais contundentes de seus estudos é de que a desigualdade no Brasil não caiu tanto quanto se imaginava nos últimos anos. Veja algumas conclusões do estudo de Piketty:

  • 1% mais ricos concentra 28% de toda a renda no Brasil;
  • 55% da renda nacional está nas mãos dos 10% mais ricos;
  • A participação da classe média na renda caiu entre 2001 e 2015 de 34% para 32%.

“Tanto do ponto de vista de quem valoriza a questão da justiça social e uma menor desigualdade, como também de quem entende a importância de um sistema tributário mais neutro e eficiente, e necessário discutir mudanças”, resume Gobetti.

Os números sobre imposto de renda disponibilizados pela Receita Federal estão disponíveis no relatório “Grandes Números IRPF – ano calendário 2016“.

Fonte: G1

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