Economistas avaliam que MP 936 foi eficiente no curto prazo, mas empresas terão dificuldade para manter emprego quando programa acabar
O programa de suspensão do contrato e redução da jornada ajudou a estancar as demissões nos primeiros meses da pandemia, mas o fim do período de estabilidade previsto no acordo pode levar a um boom de cortes no final do ano, alertam economistas.
Os desligamentos aumentaram 21% entre fevereiro e março, quando eclode o novo coronavírus no Brasil, mas a partir daí o movimento foi de queda. Em julho, foram registradas 912 mil demissões, segundo dados do Ministério da Economia divulgados nesta sexta (21).
Especialistas em mercado de trabalho atribuem o movimento à MP 936, que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, convertida em lei no início de julho.
A medida provisória, que entrou em vigor em abril, permitiu a empresas suspender o contrato de trabalho ou reduzir a jornada e o salário em acordo com os trabalhadores por até 90 dias. Decreto posterior do Executivo permitiu a extensão por mais 30 dias, totalizando 120.
Segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, o governo vai prorrogar a medida por mais 60 dias, totalizando seis meses. Até o momento, foram desembolsados cerca de R$ 20 bilhões com o programa, segundo cálculos da equipe econômica.
Em contrapartida, as empresas não podem fazer demissões durante o período em que vigorar o acordo e por igual período posterior ao seu fim. Se por exemplo um empregador reduzir a jornada por 90 dias, ele fica impedido de demitir o funcionário por mais 90 dias após o fim do acordo.
“Houve um aumento grande de desligamentos e uma redução brusca nas contratações, mas essa curva dos desligamentos poderia estar muito pior se não fosse os programas do governo”, diz Rodolpho Tobler, economista do Ibre/FGV.
A questão que se coloca agora é o que acontecerá com esses trabalhadores quando o período de estabilidade expirar. “Será que em dezembro a atividade vai ter retomado a ponto do empresário manter esse funcionário na folha de pagamento?”, questiona Tobler.
Para Cosmo Donato, economista da LCA Consultores, a iniciativa do governo foi efetiva no curto prazo para estancar as demissões nos primeiros meses de impacto da pandemia. “A grande questão é o médio prazo e 2021, porque você terá um esvaziamento dessas medidas”, diz.
Ele alerta que, com a crise fiscal e o crescimento potencial econômico menor, será um desafio manter os empregos preservados nesse período e gerar novos postos.
Fausto Augusto Júnior, diretor técnico do Dieese, acrescenta que a alta rotatividade entre as empresas brasileiras também explica essa dinâmica. “Mais de 600 mil empresas fecharam durante a pandemia, demitindo os trabalhadores, e junto com isso não vimos novas empresas surgindo ou crescendo, o que explica a queda nas contratações”, diz.
Desde o final do ano passado, o mercado vinha num movimento de recuperação, com expectativa de expansão do emprego formal a partir de março deste ano, após o movimento sazonal de demissões que costumam ocorrer em janeiro e fevereiro, diz Lameiras.
Com a pandemia, no entanto, essa tendência se reverteu e os empregadores deixaram de contratar. Ao mesmo tempo, eles também frearam as demissões num primeiro momento pela incerteza quanto ao impacto e duração do choque provocado pela pandemia, evitando arcar com os custos da rescisão e, num segundo momento, ao aderir à MP 936.
A pesquisadora afirma que é possível antever um boom de demissões no final do ano, quando o período de estabilidade expirar, mas faz a ressalva de que as perspectivas econômicas estão melhorando. “Claro que uma parcela das empresas não vai conseguir manter o trabalhador ao final desse prazo, mas hoje o número de empregadores propensos a demitir é menor do que era há dois meses”, diz.
O diretor técnico do Dieese também é mais cauteloso quanto a possibilidade de demissões no fim do ano dado o cenário de incerteza atual que caracteriza tanto a pandemia quanto a economia.
Por outro lado, ele projeta que parte das empresas já demitam em agosto, especialmente entre os pequenos negócios, sem condições de arcar com a folha de pagamentos porque não conseguem acessar financiamento e nem retomar a atividade no patamar anterior à crise.
Fonte: Folha de S.Paulo