Um trabalhador deve ser indenizado em R$ 30 mil após ser demitido por se recusar a votar em Bolsonaro, candidato do patrão, nas eleições de 2022. A decisão é da 11ª turma da Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 3ª região, que concluiu que autor sofreu assédio eleitoral e tem direito a reparação.
A vítima relatou que, em 30 de setembro de 2022, o encarregado da empresa estava colando nas roupas dos empregados adesivos do candidato à presidência Jair Bolsonaro.
Ele contou que se recusou a usar o adesivo e disse que votaria em Lula, o que foi motivo de chacota dentro da empresa. Acrescentou que, em função disso, foi dispensado sem justa causa na segunda-feira seguinte.
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Após análise do conjunto de provas, o juízo de 1º grau condenou a empresa de bioenergia ao pagamento de indenização por danos morais fixada em R$ 30 mil.
O empregador recorreu, negando os fatos. Ele considerou o valor da indenização exorbitante e desproporcional e argumentou que a dispensa ocorreu por questão de poder diretivo do empregador e que ela já estava em processo desde 22/9/22.
O desembargador Marco Antônio Paulinelli Carvalho, relator do recurso, entendeu que ficou provado o assédio eleitoral promovido pela empresa e indeferiu o pedido.
“Ressalto que a demissão logo após a ocorrência do fato narrado pela testemunha do autor, sem provas contundentes de que o autor seria demitido naquela época, implica concluir que a dispensa ocorreu pela manifestação de posição política contrária ao empregador no ambiente de trabalho”, escreveu na decisão.
Carvalho pontuou que o assédio eleitoral ocorre quando o agressor, aproveitando-se de certa ascendência sobre a vítima, passa a constrangê-la moralmente (ou até fisicamente), a fim de forçá-la a um posicionamento político-ideológico.
Assim, o assédio eleitoral é uma versão mais extremada de assédio moral, já que o agressor ataca determinado valor muito sensível à vítima, algo que a própria Constituição consagra como inviolável: o direito ao voto, o direito de posicionar-se politicamente e de exercer a cidadania com plenitude, nos termos do art. 14 da Constituição.
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No entendimento do magistrado, ficou claro não só que o trabalhador foi coagido, mas também vários colegas de trabalho que, certamente temerosos de perder o emprego, aceitaram a situação humilhante de usar “santinho” de um candidato no local de trabalho.
O reclamante, o único que se insurgiu na tentativa de preservar seus direitos de personalidade, foi dispensado na primeira oportunidade.
“Tal conduta, flagrantemente abusiva, afronta o pluralismo político, o direito à livre convicção política, o valor social do trabalho e a própria dignidade da pessoa humana, ensejando o dever de indenizar, nos termos dos arts. 186 e 927 do CC. O respeito ao exercício do voto e à formação de convicção política de forma autônoma e livre, em especial, no ambiente de trabalho, é condição essencial ao desenvolvimento da soberania, à garantia da cidadania, à democracia e à efetividade dos direitos transindividuais”, diz o documento.
Com base nesse entendimento, o desembargador manteve o valor da indenização por danos morais decorrentes do assédio eleitoral, acrescentando que devem ser considerados o porte e a culpa do ofensor, a extensão do dano e, ainda, o caráter pedagógico da reparação como efeito inibidor para prevenir que empregados da ré tenham o mesmo tratamento dispensado ao autor, o que o relator classificou como “Teoria do Desestímulo”.
Em decisão unânime, o colegiado constatou que houve irregularidades graves, como o assédio moral eleitoral sofrido em ambiente de trabalho, praticado por chefes e por outros colegas de trabalho, assim como a dispensa efetivada logo após o ocorrido, nas vésperas da eleição, reforçando a necessidade de reparação pela ofensa.
Processo: 0011160-92.2022.5.03.0082
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Com informações de Migalhas
Foto: Tânia Rego/Agência Brasil