Adriana Marcolino: Proposta de novo Imposto de Renda é avanço para tributação mais justa

O governo federal deu um passo importante rumo a uma tributação mais justa e progressiva ao apresentar o projeto de lei 1.087 de 2025, que propõe a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para até R$ 5.000 mensais, desconto progressivo para até R$ 7.000 e alíquota efetiva mínima para rendas acima de R$ 600 mil anuais -caso a contribuição das altas rendas não alcance um percentual mínimo, que variará de zero a 10%, será preciso pagar complementação do IR.

Historicamente, o Brasil tem uma estrutura tributária regressiva, com uma arrecadação significativa baseada em tributos indiretos, que representam 40,2% da arrecadação total. Em contrapartida, em 2022, segundo a Instituição Fiscal Independente do Senado, os impostos sobre a renda representaram só 27,4% da arrecadação federal, apesar de terem maior capacidade de promover justiça tributária. Considerando-se essas distorções, a carga tributária dos 10% mais pobres representa 6 pontos percentuais a mais que a dos 10% mais ricos.

Leia: Taxação de 140 mil super-ricos supera valor de isenção do IR para 10 milhões de pessoas

De um lado, o Imposto de Renda no Brasil é limitado por deduções excessivas e pela não tributação de lucros e dividendos. De outro, a defasagem na correção da tabela do IR onera cada vez mais os brasileiros de menor renda. Além disso, o pequeno número de faixas e a alíquota máxima baixa, na comparação com outros países, contribuem para aprofundar a desigualdade de renda no país.

A defasagem da tabela do IR de 1996 até dezembro de 2024 acumula média de 154,67%. Só de 2016 a 2022, o congelamento da tabela resultou em defasagem de 44,11%, aumentando a carga tributária da população.

Outro elemento é que a progressividade da tabela do IRPF caiu desde a década de 1990. De 1976 a 1985, existiam até 16 faixas e alíquotas máximas de 55% a 60%. Nos anos 1990, as faixas foram reduzidas para 3 e a alíquota máxima diminuiu para 25%. Em 2009, a tabela passou a ter 5 faixas, com aliquotas de 7,5% a 27,5%.

A redução de faixas e alíquotas nos anos 1990 limitou recursos para investimentos essenciais. Para compensar a queda na arrecadação, decorrente da diminuição das alíquotas para rendas mais altas, a tabela não foi atualizada, o que incluiu cada vez mais pessoas de baixa renda como pagadores de impostos. Com poucas faixas e alíquota máxima de 27,5% a partir de R$ 4.664,98, quem ganha R$ 5.000 e R$ 80.000 está sujeito à mesma tributação.

O Brasil tem uma das menores alíquotas máximas de Imposto de Renda entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Enquanto aqui a alíquota máxima é de 27,5%, em países como Japão e Dinamarca, chega a 55,95% e 55,90%, respectivamente. Em nações em desenvolvimento, como China (45%), África do Sul (45%) e Chile (40%), a tributação também é mais elevada. Mesmo nos Estados Unidos, a alíquota máxima para pessoa física é de 37%.

A proposta do governo beneficiará 9,6 milhões de pessoas com a isenção, segundo a Unafisco, e garantirá desconto adicional para quem ganha de R$ 5.000,01 a R$ 6.999,99, reduzindo a carga das menores rendas. Com isso, o acréscimo anual na renda pode chegar a R$ 4.170,82.

Ao reduzir a carga para os trabalhadores de menor renda e ajustar a tributação para os mais ricos, o PL 1.087 de 2025 contribui para diminuir a desigualdade social e recuperar o poder de compra das famílias, propondo um sistema tributário que se guia pela capacidade contributiva de cada indivíduo.

No entanto, o sistema tributário brasileiro precisa de mais mudanças: correção anual da tabela do IRPF pela inflação, elevação do número de alíquotas e da alíquota-teto do imposto, considerando os padrões da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), e eliminação das distorções que propiciam a concentração de renda oriunda da renúncia fiscal.

Adriana Marcolino é diretora técnica do Dieese (Departamento Intersindical de Estatistica e Estudos Socioeconómicos). Socióloga, é mestre em sociologia do trabalho no programa de pós-graduação em sociologia da USP e doutoranda no programa de pós-graduação em Sociologia da USP. Tem experiência nas áreas de sociologia e ciência politica, com ênfase nas temáticas relacionados ao mundo do trabalho e movimentos sociais.

*Texto publicado originalmente em Poder360
Foto: reprodução

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