O decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, cancelou na última segunda-feira (5/12) a suspensão nacional de processos em instâncias inferiores que discutem se o negociado pode prevalecer sobre o legislado em matérias trabalhistas. Segundo os especialistas no assunto ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico, os impactos dessa decisão deverão ser sentidos muito rapidamente.
Em junho deste ano, o STF estabeleceu a seguinte tese: “São constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”.
Para sanar dúvidas de advogados e tribunais sobre o assunto, o ministro lavrou o despacho que encerrou a suspensão. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, havia pelo menos 50.346 processos suspensos.
A ConJur ouviu especialistas em Direito do Trabalho para entender os efeitos da medida. Viviane Rodrigues, sócia do escritório Cescon Barrieu na área trabalhista, acredita que, além do impacto direto nas decisões dos casos pendentes, pode-se esperar novas ações baseadas no tema.
“Empregados, empregadores e sindicatos terão maior segurança jurídica para seguir com negociações coletivas que sejam relevantes aos seus setores e negócios, o que pode auxiliar na flexibilização das relações trabalhistas”, pondera ela.
Sergio Pelcerman, advogado trabalhista de Almeida Prado & Hoffmann Advogados, segue a mesma linha. “A decisão apresenta relevância no cenário atual, na medida em que retorna a validação e o protagonismo da entidade sindical, uma vez que sustenta a validade do acordado em face do legislado (desde que não haja infração a direitos líquidos dos empregados, os quais são inegociáveis) e incentiva a negociação entre as partes, conferindo segurança jurídica ao acordo coletivo de trabalho e à convenção coletiva de trabalho.”
Efeito raso
Um dos questionamentos sobre o despacho do ministro Gilmar Mendes diz respeito ao impacto que a retomada dos processos anteriormente suspensos pode ter na já congestionada Justiça do Trabalho. No entanto, segundo os especialistas consultados pela ConJur, o efeito não deve ser muito profundo.
Carlos Eduardo Dantas Costa, especialista em Direito do Trabalho e sócio do escritório Peixoto & Cury Advogados, lembra que a Justiça do Trabalho, historicamente, tem se mostrado resistente ao cumprimento de determinações do STF para suspensão de tramitação de ações.
“De todo modo, o número de cerca de 50 mil processos que, supostamente, estavam suspensos, é ínfimo frente ao total de quase dois milhões de ações em tramitação (número conforme relatório ano-base 2021, do banco de dados da Justiça do Trabalho).”
Rodrigo Marques, sócio coordenador trabalhista do Nelson Wilians Advogados, tem a mesma impressão de que os julgamentos suspensos não vão sobrecarregar a Justiça especializada.
Pelcerman, por sua vez, discorda. Segundo ele, a retomada dos processos paralisados vai gerar a necessidade de intervenção para preparação de sentenças, despachos e até mesmos acórdãos, o que pode causar algum tipo de sobrecarga.
Henrique Andrade Alves de Paula, especialista em Direito do Trabalho da banca Weiss Advocacia, pondera que o impacto será limitado, já que a tramitação desses casos não deve gerar novas demandas. “Não há interesse por parte do empregado em ajuizar uma ação pedindo o legislado, a partir do momento em que se está dando prevalência a aquilo que foi acordado. Dessa forma, o impacto será imediato no Judiciário, mas, futuramente, poderá gerar a redução no ajuizamento de novas demandas trabalhistas.”
Por fim, o professor e coordenador editorial trabalhista Ricardo Calcini diz que desde a decisão do STF, em junho, alguns magistrados do Trabalho já estavam aplicando o enunciado.
“A problemática que ficará será a interpretação e a aplicação da tese de repercussão geral por juízes, desembargadores e ministros na Justiça do Trabalho. Afinal, mesmo que chancelado o entendimento de que o negociado prevalece sobre o legislado, o STF fixou o limite de que sejam respeitados os direitos absolutamente indisponíveis, e, na falta de parametrização traçada pelo Supremo, entendo que o rol de matérias hoje previsto no artigo 611-B da CLT deve ser representativo desse limite.”
ARE 1.121.633 (Tema 1.046)
Por Rafa Santos, para a revista Consultor Jurídico
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