Diferença na remuneração aumenta entre funcionários que têm maior qualificação; multinacionais trazem políticas de inclusão para o Brasil
Os menores salários das mulheres não são só uma desigualdade, mas também um paradoxo, diz Lais Abramo, da Cepal. Isso porque no Brasil elas são mais educadas dos que eles (segundo o último Censo, 12,5% das mulheres tem nível superior, contra 9,9% dos homens).
Abramo aponta causas para a diferença. Segundo ela, há “uma série de mitos e preconceitos”, como o de que os homens vestem mais a camisa da empresa e a de que elas se devotam mais à vida doméstica do que à profissional.
Outro motivo que cita é a segmentação ocupacional — algumas profissões bem remuneradas, como a de engenheiros, ainda são dominadas por homens.
Irene Natividad, da Cúpula Global das Mulheres, diz que a diferença de 14,38% apontada pelo Caged no salário de admissão de homens e mulheres (veja mais abaixo) é sintomática, já que esta é a base a partir da qual evolui a remuneração.
Para a professora Regina Madalozzo, do Insper, essa diferença de base tende somente a crescer conforme aumenta a qualificação.
Assim, quanto menor o nível de educação dos trabalhadores, menor é a disparidade de salários entre os dois géneros. “Ao comparar trabalhadores que têm ensino superior completo, a diferença [de remuneração] sobe para 40%>”, explica.
Outra causa por trás dessa distância, segundo a gerente do programa da ONU para mulheres no Brasil, Ana Carolina Querino, é que as mulheres são mais vulneráveis ao movimento do mercado de demissões e recontratações com remunerações menores.
Também sintoma da disparidade entre homens e mulheres no mercado de trabalho são as salas de reunião dos conselhos administrativos das grandes empresas, majoritariamente ocupadas por homens.
Uma delas, Marília Rocca, do conselho do Santander Brasil, afirma que parte da explicação está no histórico da entrada no mercado: como elas demoraram mais para fazer parte da população economicamente ativa, demoram mais para alcançar posições de chefia.
A presença de mulheres em cargos mais altos pode ser aumentada por influência externa —como multinacionais que trazem para as filiais do país políticas de inclusão.
Andrea Alvares, 43, é a di-retora geral de salgados da PepsiCo para a América do Sul e Caribe, o posto mais alto da empresa no Brasil. Ela tem apenas colegas homens (seis ao todo) em cargos semelhantes ou superiores.
Segundo Alvares, existem diretrizes da matriz para instalar programas de empode-ramento de mulheres na operação.
Executivas se dividem sobre a adoção de cotas nos conselhos
O governo estuda uma medida para que as empresas tenham uma cota mínima de mulheres em um lugar central das empresas: o conselho de administração.
A Secretaria de Políticas para as Mulheres não tem uma equipe para o assunto, mas avalia um pedido do Grupo Mulheres do Brasil, liderado por Luiza Helena Traja-no, presidente do Magazine Luiza, sobre o tema.
Ela diz que levará o proje-to à presidente Dilma. O grupo sugere como meta reservar 15% das cadeiras.
“Fui patrona de uma turma que formou executivas para conselhos e garanto que existe gente capaz. [Sem cotas] vamos levar cem anos para termos 10%.”
Mas as cotas não são unanimidade entre as mulheres. Marta Viegas, do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, diz ser contrária porque há risco de estigmatizar as profissionais, que podem ser vistas como incompetentes, e que a política criaria cargos laranjas, só para a empresa se adequar à lei.
No país, quem tem a maior porcentagem de mulheres no conselho é o Santander. De nove cadeiras, elas ocupam duas. Marília Rocca, uma delas, diz que cotas podem desvalorizar a funcionária e que o banco fez um esforço voluntário para ampliar a presença feminina.
A segunda com a maior proporção é o Banco do Brasil Seguridade, que tem uma conselheira, a engenheira Isabel da Silva Ramos, em um quadro de cinco pessoas.
Ela levanta dúvidas sobre a proposta: “Eu queria ver as mulheres chegando lá por mérito e não por cota.”
O argumento é rebatido por Regina Madalozzo, do Insper: “Não há igualdade de condições para chegar lá”. Para ela, um conselho mais diverso daria atenção ao tema das oportunidades para mulheres, o que faz com que as cotas se tornem prescindíveis depois de algum tempo.
Países como Alemanha e Noruega adotaram cotas. Israel e Áustria estabeleceram porcentagens mínimas em empresas públicas.
Fonte: Folha de São Paulo