“Cúmplices? A Volkswagen e a ditadura militar no Brasil” narra como a empresa e seus diretores contribuíram com o regime, torturando e perseguindo funcionários
Lágrimas e aplausos de pé. Esta foi a reação dos participantes do Encontro da Executiva Nacional ao final a exibição do documentário Cúmplices? A Volkswagen e a ditadura militar no Brasil, produção da TV Pública Alemã que revela a participação da montadora na repressão cometida pelo regime militar brasileiro.
O filme conta com a participação de historiadores, procuradores do Ministério Público e de um personagem central, que conduz o documentário: Lúcio Antônio Bellentani, ferramenteiro da Volkswagen, que foi preso e torturado por policiais do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) dentro das dependências da montadora, em São Bernardo do Campo (SP), no dia 29 de julho de 1972.
Bellentani, que atualmente é presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados do Brasil, entidade fundada e filiada à CSB, ficou 48 dias preso e sofreu com as terríveis torturas aplicadas pelos militares, como o pau de arara e choques elétricos.
Militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) na época, o ex-metalúrgico conta como o Departamento de Segurança Industrial da Volkswagen investigava os funcionários que militavam pelo partido e/ou tinham atividades político-sindicais.
“Quando se passa a ter consciência política, isso te traz um certo receio. Às onze e meia da noite vieram os caras do DOPS, me prenderam e me algemaram”, conta o ex-ferramenteiro no documentário.
Uma das cenas do filme foi gravada na sede da CSB, em São Paulo, onde Lúcio Bellentani reuniu-se com o historiador Christopher Kopper, contratado pela Volkswagen, que estava preocupada com as consequências das revelações de cooperação com o regime.
Lúcio Bellentani é categórico ao dizer que não quer qualquer indenização financeira da montadora alemã.
“Ela foi responsável por várias torturas e perseguições. Vamos levantar o tapete e ter a dignidade de se responsabilizar por esses atos. Continuo brigando por eles, pelo estabelecimento da verdade. É simples, a verdade, somente a verdade”, desabafa o dirigente.
Luta por reparação
A iniciativa do filme se deu após a denúncia aceita pelo Ministério Público de que empresas como a Volkswagen, Petrobrás, o Metrô de São Paulo, Antarctica e Embraer financiaram o golpe civil-militar no Brasil. Tal denúncia é baseada no trabalho da Comissão Nacional da Verdade, criada em 2011, que organizou relatos sobre os crimes cometidos durante a ditadura. O MP instaurou um inquérito civil para exigir reparação da Volks.
Após a exibição do filme na reunião da Executiva Nacional, nesta terça-feira (22), o presidente da CSB, Antonio Neto, reiterou a importância da produção e da luta de Lúcio Bellentani.
“Tivemos sorte de ele estar aqui firme e forte. Recebi do estado brasileiro a desculpa pelo que fizeram com o meu pai, mas ele não estava aqui para receber. Aqui temos um exemplo, o orgulho, para nos dar o norte das coisas. Posso afirmar que hoje você mostra para nós o quanto de dignidade você tem”, disse Neto ao ex-ferramenteiro da Volks.
Guarino Fernandes dos Santos, pai de Antonio Neto, era presidente da União dos Ferroviários da Estrada de Ferro Sorocabana, um dos principais instrumentos de organização trabalhista do Brasil, e foi preso e torturado pela ditadura.
Alvaro Egea, secretário-geral da CSB, destacou a importância da Comissão da Verdade. “A parte dos trabalhadores era a mais obscura das investigações. O trabalho continua sendo feito mesmo com todo o cenário difícil que vivemos. Sabendo das limitações da Comissão, decidimos criar um fórum para continuar esse trabalho para investigar as empresas que participaram da ditadura”, explicou.
Lúcio Antônio Bellentani irá, em novembro, para a Alemanha a convite da produção do documentário a fim de contribuir em outras ações, que têm o objetivo de criar na ONU um tribunal de violação dos direitos humanos.
“A denúncia serve para levar um pouco de Justiça aos trabalhadores que ainda hoje estão sendo perseguidos pelo capital. Essa é a grande vitória. A grande luta é que a Volks reconheça que ela é responsável pela tortura, prisão e morte de muitos companheiros. Que venha a público reconhecer isso. Que a luta da classe operária vá para os bancos das escolas, para que a juventude saiba da história do Brasil”, concluiu Bellentani.
O documentário está disponível abaixo.
Versão legendada:
Versão sem legenda:
https://www.youtube.com/watch?v=DLzSjuJUipU