Entre todas as novas ações judiciais, as relativas à ”rescisão do contrato de trabalho e verbas rescisórias” representaram 11,75% do total, ou 4.980.359 novas ações, sendo o assunto mais recorrente do Poder Judiciário brasileiro. Dentro da própria Justiça do Trabalho, o tema corresponde a 49,47% dos novos casos.
Os dados fazem parte do Relatório Justiça em Números 2016 (ano-base 2015), divulgado recentemente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O dado, que não ganhou projeção no debate público, é ao mesmo tempo um sintoma da crise econômica pela qual passa o país, mas também reafirma a importância da mediação do Estado brasileiro na relação capital e trabalho, principalmente para proteger a parte mais fragilizada neste momento – ou seja, os trabalhadores.
É paradigmático, portanto, que, em meio a essa mesma crise, a Justiça do Trabalho esteja sendo alvo de críticas disparadas a partir do Supremo Tribunal Federal, do Congresso Nacional e de diferentes níveis do Poder Executivo, fazendo coro a diferentes associações empresariais.
Com o aprofundamento da crise econômica, os trabalhadores são os primeiros a sofrerem perdas substanciais, com a negação de respeito aos direitos mais básicos. E sem eles, o trabalhador não come, não paga aluguel, não quita a dívida da conta de luz e de água. Ou seja, tornar a vida do trabalhador impraticável significa piorar o quadro global, freando ainda mais a economia.
O que se vê, contudo, são movimentos que acabam por proteger muito mais o capital em detrimento à qualidade de vida das pessoas, tratadas como tema de menor importância diante da proteção a investimentos, maquinários e estruturas. Acabam, dessa forma, por piorar a situação econômica que eles mesmos desejam promover.
É em momentos de crise que o respeito ao Direito do Trabalho se faz mais necessário. Quando tratamos de verbas rescisórias não pagas ou pagas em valor menor do que o estipulado legalmente após uma demissão, estamos falando de recursos necessários para a sobrevivência do recém-desempregado e sua família, do pagamento de contas no final do mês. E também de recursos para aquecer o sistema.
Nesse sentido, autoridades judiciais deveriam guardar discrição quanto às suas opiniões em temas trabalhistas para o espaço que é de direito, ou seja, os autos dos processos. Pois certas declarações, de casos polêmicos em julgamento, dadas de forma extemporânea e gratuita, podem gerar sérios prejuízos para milhões de pessoas ao antecipar debates que deveriam ser tocados nos tribunais ou no Parlamento.
A pergunta que temos que fazer é se o Brasil quer ter empresários inovadores e capazes de se inserir no mundo com tecnologia e produtividade, respeitando os direitos fundamentais de seus empregados, ou deseja manter a velha cumplicidade com o Estado e partes do Judiciário para, violando a lei, superexplorar o trabalhador e, através da redução de custos pelo desrespeito aos direitos e de uma operação anacrônica, praticar concorrência desleal e dumping social.
Cumplicidade reforçada pelo apoio garantido por uma estrutura que fornece incentivos fiscais sem contrapartidas sociais, não combate à sonegação de forma satisfatória e apresenta um sistema tributário injusto, que arranca mais do trabalhador do que dos donos e executivos de corporações.
O país, diante do desespero de uma crise econômica, propõe uma Reforma da Previdência que irá impor uma idade de 65 anos para a aposentadoria, ignorando que milhões de brasileiros pobres começam a trabalhar muito cedo em atividades braçais que destruíram seu corpo, como o corte de cana e a construção civil.
E tenta construir uma Reforma Trabalhista, inclua um projeto para que a negociação entre patrão e empregado possa se sobrepor à CLT, mesmo em prejuízo ao trabalhador.
O detalhe é que há 4.980.359 boas razões para provar que o caminho mais rápido para o capital e par o governo nem sempre é o que garantirá a dignidade ao maior número de pessoas.
Fonte: Blog do Sakamoto