Representantes de associações de juízes federais e de membros do Ministério Público classificaram a reforma da Previdência proposta pelo governo Temer de desumana e indigna. Eles foram ouvidos em audiência pública da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Previdência na última segunda-feira (5). Foi a oitava audiência da CPI.
Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Jayme Martins de Oliveira Neto afirma que a reforma, que ainda tramita na Câmara, destrói os princípios sociais da Constituição e não é nociva somente à magistratura ou ao Ministério Público, mas a todos. Ele negou que a reforma seja fundamental para a sobrevivência econômica do país.
— É uma reforma em que se procura estabelecer uma guerra sistemática entre números desconsiderando que atrás deles existe um povo, o povo brasileiro — lamentou.
O jurista declarou que a reforma previdenciária ignora a realidade no serviço público e procura colocar o servidor como o “grande vilão”. O representante da AMB lembrou que vários servidores que estão próximos da aposentadoria já estão cumprindo um regime de transição — resultante da última reforma previdenciária, durante o primeiro mandato de Lula — e ponderou que a reforma da Previdência deveria ocorrer somente para os novos ingressantes no sistema.
— O que se está fazendo, e por isso eu insisto que ela é desumana, é alcançando as pessoas que estão no meio do caminho, que não tiveram a oportunidade de fazerem as escolhas, porque a escolha foi feita quando o sistema previdenciário era bem outro — explicou.
Antonio Rodrigues da Silva, presidente da Associação Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais (Anprev) destacou que a reforma, além de não conter nenhum novo benefício aos contribuintes, ataca os três fundamentos para sua concessão: a idade mínima, que é aumentada, o tempo de contribuição, que é ampliado, e o valor do benefício, que é diminuído.
Diante de tantas “perversidades” constantes na reforma, ele destacou a redução do acesso ao benefício de prestação continuada para o idoso e a ampliação do prazo de carência para acesso ao benefício previdenciário de 15 para 25 anos. O representante da Anprev citou dados do INSS segundo os quais com o novo prazo de carência em vigor, apenas 24% dos atuais aposentados por idade estariam em gozo de benefício e 76% não teriam conseguido comprovar os 25 anos de carência.
— A PEC 287 tem por objetivo privatizar a previdência pública. Ela está sendo feita para atender aos desejos dos bancos e seguradoras privadas. Não tem qualquer preocupação de natureza social — protestou.
Para Antonio Rodrigues da Silva, se o objetivo for corrigir distorções e promover a inclusão de novos beneficiários, é possível promover reformas sem necessariamente cortar ou reduzir direitos.
Crimes contra a Previdência
Representando a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Antônio José de Carvalho Araújo ressaltou que o governo foca no déficit de R$151,9 bilhões em 2016, mas não leva em consideração os crimes diversos contra a Previdência.
De acordo com ele, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional estima que o Brasil deixe de arrecadar cerca de R$ 500 bilhões ao ano em tributos devido à sonegação fiscal, principalmente das grandes empresas.
— Nesse mundo de devedores, das 100 empresas que mais devem a União as dez primeiras são da indústria do cigarro — alertou.
O representante da Ajufe ressaltou que a dívida ativa da União já alcança mais de R$ 1,8 trilhão, dos quais mais de R$ 400 bilhões são de dívidas relativas à Previdência. O valor, ressaltou, é quase três vezes superior ao “déficit”. Ele disse ainda que cerca de 1% dos devedores de tributos são responsáveis por 70% do estoque da divida previdenciária e fiscal. Ainda segundo Araújo, 42% das dívidas de contribuições previdenciárias que o governo tem cobrado tem entre média e alta recuperabilidade.
Devedores contumazes
Ele destacou ainda que muitos desses devedores da Previdência são contumazes. E pediu punições severas. Conforme explicou, o devedor contumaz, diferente do devedor eventual, é aquele cidadão ou empresa que, mesmo em uma crise econômica, têm condições de pagar suas tributações, mas não pagam.
— Não pagam porque se aproveitam de uma prática desleal, não pagando a tributação, esperando uma benesse do governo, que são os planos de recuperação fiscal, muitos deles oriundos desde o ano 2000 e intensificados. Eles se aproveitam e fazem disso uma atividade econômica estratégica de sua atividade — argumentou, defendeundo a cassação da permissão para atividades empresariais do devedor contumaz.
Auditoria
Os debatedores defenderam uma auditoria nas contas da Previdência e a melhoria da fiscalização. Segundo eles, a reforma da Previdência não pode avançar sem que as contas sejam abertas e que os números sejam mostrados e auditados.
Entre as medidas para a existência de uma previdência pública, de caráter solidário, Antonio Rodrigues da Silva destacou o combate à sonegação fiscal e a exigência das autoridades competentes responsáveis pela gestão, no âmbito da Secretaria da Receita Federal e da Procuradoria da Fazenda, a efetiva cobranças das dívidas ativas, “que estão paralisadas e, via de consequência, sendo alcançadas pelo instituo da prescrição”.
Paulo Penteado Teixeira, representante da Associação Paulista do Ministério Público (APMP) afirmou que, quando se fala em déficit, não é uma questão de Previdência, mas de gestão.
— O caminho aqui não é cortar benefício social. É abrir novas possibilidades de se recuperar esse dinheiro perdido — afirmou o juiz Guilherme Guimarães Feliciano, da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra).
Fonte e Foto: Senado Notícias