72,2% do montante poupado foram usados pelas instituições bancárias em títulos públicos e revertidos em ganhos para o sistema financeiro
Uma pesquisa do Centro de Mercado de Capitais (Cemec) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) revelou que uma fatia considerável do que é poupado pelos brasileiros é reutilizado pelo sistema bancário para drenar o desiquilíbrio das contas públicas. Só no fim do ano passado, 72,2% de todos recursos captados via poupança financiavam o setor público, como foi noticiado em reportagem desta terça-feira (18), no jornal Valor Econômico.
Na prática, o que os bancos fazem é não deixar o dinheiro do poupador no banco parado para render. A instituição, na realidade, reutiliza esse valor ou parte dele para investir em títulos públicos e retirar um lucro bem maior do que o repassado ao investidor. Os títulos públicos são papéis emitidos pelo Tesouro Nacional para financiar a dívida pública. Isso significa que os investidores emprestam dinheiro para o governo e recebem, de volta, uma rentabilidade, um valor extra, por isso.
Além de pagar os impostos como cidadãos, o dinheiro desse lucro repassado aos bancos pertence à população. Inclusive, os títulos públicos não só medem o quão o Brasil é bom pagador e é seguro investir no País, por meio das famosas agências internacionais de classificação, como também garantem a sobrevivência dos bancos, que possuem um fundo disponível no dinheiro arrecadado pelo Tesouro, caso um grande banco quebre. Com tais práticas, os bancos conseguem manter um lucro exorbitante até em um período de crise, usando dinheiro de todos e do Estado.
Crise e desequilíbrio
Ainda conforme os números apresentados pelo Valor, o Estado teve pouca condição de poupar, devido à situação econômica e das contas públicas. Em 2012, era poupado o equivalente a 0,57% do PIB; em 2017, esse número ficou negativo em 7% do PIB. No mesmo período, a poupança de empresas e famílias subiu de 17,5% para 21,8% do PIB. Quem poupa paga dobrado para os bancos manterem os lucros altos e mascarar essa situação de contas que não estão equilibradas, comprometendo os reais investimentos para que a economia, de fato, reaja para além do único objetivo dos bancos: o aumento do próprio lucro e em detrimento dos serviços sociais, do investimento sadio na economia e do ciclo produtivo do Brasil.
Antes da crise, em 2014, os títulos representavam 37% da carteira dos investidores institucionais, enquanto em 2017, o número chegou a 52%. A dívida pública também cresceu consideravelmente no período antes e durante a crise. Em 2013, a dívida pública bruta em relação ao PIB era de menos de 51% e o número saltou para mais de 73% do PIB em 2017.
Os números mostram que o investimento dos bancos nos títulos públicos cresceu, enquanto a dívida pública crescia, uma medida que serve à lógica de manutenção de lucros dos bancos, visto que a venda de títulos do Tesouro é uma das formas que o Governo tem de arrecadar dinheiro mesmo sem ter e paga bem por isso, com juros que são os melhores do mercado. E os bancos sabem disso, por isso usam indevidamente os recursos financeiros dos brasileiros para obterem lucros em cima de uma conjuntura desfavorável da economia, sem tirar “um tostão” do próprio bolso.