O Supremo Tribunal Federal (STF) deve retomar em até 30 dias o julgamento que definirá a validade do vínculo empregatício entre trabalhadres e aplicativos como Uber e Rappi, disse o presidente da Corte, ministro Edson Fachin, após a audiência que ouviu as sustentações orais de empresas, trabalhadores e da Advocacia-Geral da União (AGU). A decisão terá repercussão geral, afetando cerca de 10 mil processos judiciais paralisados em todo o país.
O julgamento, que começou no dia 1º de outubro, analisa recursos das plataformas contra decisões da Justiça do Trabalho que reconheceram a existência de relação de emprego. As empresas defendem que atuam como intermediárias tecnológicas e negam subordinação, elemento central para a caracterização do vínculo.
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Na sustentação, a Rappi afirmou ser uma plataforma que promove a “união digital” entre quem vende e quem compra serviços. Já a Uber alegou que o reconhecimento do vínculo empregatício poderia reduzir a renda dos motoristas em 30,7% e elevar o preço das viagens em 34%. Ambas negam subordinação e rejeitam a aplicação da CLT.
Já o advogado-geral da União, Jorge Messias, defendeu a garantia de direitos básicos, como piso salarial, limites de jornada, contribuição previdenciária, seguro de vida e garantia de representação sindical, sem, no entanto, reconhecer o vínculo empregatício. Ele propôs que o Congresso Nacional regulamente a atividade.
“É necessária a garantia de proteção contratual e social aos prestadores de serviço por aplicativos, sem deixar de se preservar o ambiente de inovação tecnológica e de oportunidades de trabalho e renda”, afirmou.
Falsa autonomia
Representante da CSB no GT que discutiu a regulamentação do trabalho em aplicativos de entrega e em audiência pública do STF sobre o tema, Nicolas Souza Santos, que é entregador e secretário da Aliança Nacional dos Entregadores por Aplicativos, desmente o argumento de autonomia dado pelas plataformas. Segundo ele, a suposta liberdade é, na prática, um “simulacro cuidadosamente construído”.
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Ele afirma que os trabalhadores são submetidos a controle algorítmico por meio de sistemas de aceitação de corridas, métricas de desempenho e penalidades por recusas. “Na Rappi, se você recusar corridas, sua taxa de aceitação cai e, com ela, sua renda e sua visibilidade na plataforma”, escreveu. No iFood, recusas geram bloqueios e “paradas técnicas”, com cronômetros que forçam o entregador a correr e se arriscar.
Ele defende que, enquanto houver “subordinação algorítmica”, é justo e necessário que os trabalhadores acessem os direitos derivados dessa subordinação.
“Não pedimos esmola, não imploramos por proteção. Exigimos direitos humanos, dignidade e justiça real. Não queremos que nossa existência seja apenas uma estatística, um dado econômico ou um espetáculo abstrato. Queremos que a primazia da realidade – que é princípio jurídico, mas também moral – seja respeitada: não somos autônomos; somos subordinados, controlados por algoritmos que decidem nossas condições de vida e nosso sustento”, pontua.
Nicolas critica também a transferência de custos e riscos para os trabalhadores. “Jovens mutilados, acidentes graves, mortes diárias – e o Estado, através do SUS, absorve a conta. Enquanto isso, empresas lucram bilhões”, destacou.
“O STF está diante de uma escolha histórica: pode legalizar um modelo predatório, consolidando exploração e mortes, ou pode enxergar a realidade, garantir direitos e dignidade”, resumiu Nicolas.
Com informações de Agência Brasil
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil