Para o deputado André Figueiredo, projeto da Previdência não tem chances de ser aprovado nos termos do governo
A tão comentada união das esquerdas está mais perto de se tornar realidade. Nesta semana, as bancadas de PT, PSB, PCdoB, PSOL, PDT e Rede selaram acordo para barrar a reforma da Previdência. Juntos, os 133 deputados esperam enterrar a proposta já nas primeira discussões.
Um dos principais articuladores dessa união é o deputado cearense André Figueiredo, líder do PDT na Câmara. Na semana passada, o partido fincou o pé contra a reforma, frustrando quem esperava votos a favor — na campanha de Ciro Gomes, o partido defendia uma reforma no sistema. Mas não a de Bolsonaro.
“Como preliminar, essa proposta é praticamente impossível de ser discutida”, diz o deputado. Segundo ele, o primeiro passo é impedir que o debate previdenciário saia da Constituição, conforme prevê o texto enviado pelo governo. Idade mínima, cálculo do benefício e outros temas ficariam sujeitos à Lei Complementar, que precisa de menos votos no Congresso.
“Isso aí já nos dá uma salvaguarda, e acho que sairemos vitoriosos”, prevê Figueiredo, que também coordena (junto com Paulo Paim, do PT) a reedição da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social, nascida na época de Temer.
Em entrevista a CartaCapital, o deputado detalha os planos da oposição e analisa as chances de o projeto de Guedes e Bolsonaro vingar no Congresso.
CartaCapital: Quais são os próximos passos da oposição?
André Figueiredo: O primeiro passo é barrar a desconstitucionalização, primeiro na CCJ e depois na Comissão Especial. Acredito que conseguiremos ganhar, até porque os partidos de centro também estão contra. Remeter tudo para a Lei Complementar para facilitar mudanças na Previdência e tirar a proteção que a Constituição de 88 deu ao nosso país.
CC: E há alguma proposta alternativa?
AF: Somos contra essa proposta de Bolsonaro. Não vemos sequer como remendá-la, de tão ruim que é. Mas apresentaremos tópicos para levar essa discussão para a sociedade. Tirar esse debate de dentro do parlamento e levá-lo para as ruas. Uma eventual reforma tem que partir do pressuposto de não tirar direitos de quem já não tem quase nada.
CC: Poucas semanas atrás, Ciro Gomes e Mauro Benevides reforçavam a intenção de dialogar com o governo, sob o discurso de “conter danos”. Agora, o PDT fecha questão contra a reforma. O que mudou de lá pra cá?
AF: Na convenção nacional do dia 18, maior órgão de deliberação do partido, nós fechamos questão contra essa Previdência. Como preliminar, essa proposta do Bolsonaro é praticamente impossível de ser discutida. A bancada se reuniu com o presidente Lupi e deixou muito claro: o PDT é contra esse projeto de reforma. Eu e o deputado Mauro [Benevides] vamos discutir temas que serão levados à bancada e à executiva. E só aí nos posicionar. Estão na pauta idade mínima, regras de transição, regime de servidores públicos e a capitalização como regime complementar.
CC: A chance de a PEC ser aprovada cresceu ou diminuiu desde que o texto chegou no Congresso?
AF: Do jeito que está, não será aprovada. O governo está completamente perdido na articulação política. E está à deriva em vários setores, basta ver o que aconteceu no Ministério da Educação de alguns dias pra cá. É uma desarticulação nunca antes vista na Câmara. Acho que Bolsonaro ainda não caiu na realidade. Ele agora é presidente da República e os brasileiros querem um presidente que tenha comando. E não um presidente que, em plena terça-feira, abandona agenda para ir ao cinema. Se quer ver filme, que vá à noite.
CC: A recusa do Paulo Guedes de ir à CCJ vai atrasar a votação da reforma? Qual foi a repercussão entre os deputados?
AF: O líder do governo garantiu que ele vem no dia 3, então demos essa chance a ele para evitar o constrangimento de ter que convocá-lo. Até o presidente da CCJ [o deputado Felipe Francischini], que é do partido do Bolsonaro, ficou indignado com a falta de consideração. Não acredito que a PEC passe pela CCJ antes do dia 16. Depois, vai para comissão especial, e são quarenta sessões ordinárias. Não vejo possibilidade de votarmos a reforma antes do primeiro semestre.
CC: O PL dos militares já está no Congresso, mas a oposição não tem falado sobre as aposentadorias e pensões das Forças Armadas. Por quê?
AF: Por uma questão de tática. Se o próprio governo não se entende, por que vamos entrar no mérito dessa discussão? Para nós, essa reforma parte de um pressuposto equivocado: discutir reforma e readequação de carreiras ao mesmo tempo. Isso mostra como o governo está perdido. Mas é claro que, se vamos conceder benefícios aos militares, também temos que lembrar das outras categorias que cuidam da segurança. Policiais federais, rodoviários e PMs têm os mesmos pré-requisitos dos militares e deveriam ter as mesmas condições. Vamos discutir tudo isso dentro do bojo do projeto.
CC: Circula nos bastidores que o centrão, em retaliação a Bolsonaro, considera até ressuscitar a proposta do Temer. Acha possível que isso aconteça?
AF: Temos escutado isso. Os partidos do centro se reuniram, mais de 230 parlamentares. Mas isso não significa que todos esses votariam pela reforma do Temer. Tem gente do Solidariedade e do Podemos, por exemplo, que já se manifestou frontalmente contra ambas as propostas. A julgar pela forma como foi aprovada a do Temer na Comissão Especial, e como está se encaminhando a do Bolsonaro agora, nenhuma tem condições de passar.
Fonte: CartaCapital