Central dos Sindicatos Brasileiros

A Previdência que sonhamos está aqui

A Previdência que sonhamos está aqui
Artigo do presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros sobre a reforma da Previdência

 

*Antonio Neto

Há mais de duas décadas os sucessivos governos abordam a necessidade de reformar o sistema previdenciário brasileiro. Nesse tempo, desde Fernando Henrique, inúmeras alterações já foram implementadas no regime geral, nas pensões e na aposentadoria dos servidores públicos. Nenhuma delas foi para melhorar a remuneração dos aposentados ou pensionistas. Pelo contrário, só piorou.

Mesmo assim, a Seguridade Social brasileira mantém um sistema vigoroso de distribuição de renda. São 30,2 milhões de brasileiros que recebem da Previdência, sendo 61,29% do total o valor de até um salário mínimo. Isso representa 40,36% do gasto total da Previdência; até dois salários, o montante de beneficiados chega a 80,85%.

Chegamos a 2019, uma forte e corrosível pressão se instalou novamente para reformar a Previdência, caso contrário o Brasil quebraria. Para tanto, a máquina de propaganda do governo, formado majoritariamente por militares e atores do mercado financeiro, diz que irá combater privilégios e democratizar o sistema.

A proposta enviada pelo presidente Bolsonaro ao Congresso causa arrepios em todo os brasileiros, sobretudo nos trabalhadores mais sofridos e mais pobres, como agricultores, operários do chão de fábrica e trabalhadoras domésticas.

Diante da aterrorizante proposta, todos nos perguntamos: será que não existe algum sistema de aposentadoria que seja mais justo? Será que nenhum país conseguiu ofertar tranquilidade e bem-estar para um aposentado e sua família? Sim, esse sistema existe.

Numa determinada nação, cujo nome revelaremos mais adiante, os trabalhadores se aposentam, em média, entre 45 e 50 anos de idade, mulheres e homens, e não aos 62 e 65 anos, respectivamente, como quer Bolsonaro. Há casos registrados de aposentadorias com 33 anos de idade, o que não corresponde nada à situação brasileira, na qual em algumas regiões do País, incluindo a periferia de capitais, a expectativa de vida não atinge a idade proposta na reforma.

Nesse país, o valor médio das aposentadorias equivale a 13,7 salários mínimos e suas pensões, em caso de falecimento do titular, são estendidas integralmente a seus filhos até completarem 24 anos (se estudantes) e vitaliciamente a suas filhas, caso solteiras. Bem diferente da proposta apresentada pelo governo de aumentar a idade de 65 para 70 anos para ter acesso a um salário mínimo aos mais miseráveis e de cortar para 50% a pensão do cônjuge em caso de morte, mais 10% por filho até atingir a maioridade.

Além de possuírem estabilidade em seus empregos, como rege a Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho, ao se aposentarem esses trabalhadores ganham uma promoção salarial, recebendo não só o salário imediatamente acima do seu cargo, mas integral. Devido à idade baixa, muitos se dedicam a palestras e consultorias, aumentando suas rendas.

Nada parecido com a situação do trabalhador brasileiro; cerca de 50 milhões estão na informalidade e 13 milhões, desempregados. Como o tempo de contribuição exigido pela reforma é de 40 anos para ter 100% de aposentadoria, um pobre que começa a trabalhar aos 14 anos como jovem aprendiz terá de contribuir 48 anos (mulher) ou 51 anos (homem) para atingir a idade mínima de aposentadoria (62/65 anos). Isso se ele for o maior sortudo do planeta e nunca for demitido.

Pois bem, meus caros. O modelo de aposentadoria citada acima é dos militares brasileiros, os próceres proponentes da reforma que irá impedir milhões de brasileiros de obterem a aposentadoria. E o soldado que se aposentou aos 33 anos, aliás, capitão, é Jair Bolsonaro, o presidente que está propondo esse sacrifício para todo o povo, afirmando que irá acabar com regalias, uma grande mentira, pois já é notório que a reforma proposta aos militares irá aumentar ainda mais seus soldos.

Muito contraditório, uma vez que o rombo nas aposentadorias dos militares é de R$ 40,5 bilhões. Em 2018, as receitas somaram R$ 2,1 bilhões, enquanto as despesas, R$ 42,614 bilhões.

Certamente o povo brasileiro tem alta estima pelas Forças Armadas e devemos fortalecer cada vez mais esta instituição. Mas nos parece um tanto injusto, para não dizer hipócrita, que um governo formado por militares tente nos forçar a acatar uma reforma que praticamente acaba com a Previdência Pública Brasileira, jogando milhões de pessoas na miséria, mantendo e ampliando seus benefícios de aposentadoria.

Dizem que os militares possuem particularidades e podem até arriscar suas vidas em caso de guerra. Creio que os militares brasileiros não estão correndo mais risco de vida do que os trabalhadores em geral. Todos os dias, a cada 3 horas, 38 minutos e 43 segundos, um trabalhador ou uma trabalhadora morre vítima de acidente de trabalho. O que dizer para uma viúva de um policial civil, federal ou militar assassinado no cumprimento do dever? Diferente do militar que pode passar a pensão integral para sua filha, e até para a neta, se o policial vier a morrer, sua esposa receberá, dependendo da idade, apenas 50% da pensão. Injusto, não acham?

Por essas e outras, é possível afirmar com toda certeza: essa reforma é injusta, hipócrita e danosa para o trabalhador e trabalhadora, e por isso devemos refutá-la.

*Presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros