Na terça (15), o FMI revisou para baixo suas expectativas para o crescimento da economia mundial, que estaria atravessando o que chamou de uma “desaceleração sincronizada”.
A estagnação do comércio global em meio às tensões entre Estados Unidos e China, e a crise profunda de países como Argentina, Venezuela, Irã e Turquia explicariam o fenômeno, que só não representa um banho de água fria maior nas perspectivas de recuperação da economia brasileira do que a insistência do governo em aprofundar a agenda estagnacionista e concentradora de renda adotada no país nos últimos anos.
Sem nenhuma ajuda do resto do mundo e com o setor privado brasileiro cortando seus gastos e investimentos para pagar dívidas acumuladas, só mesmo o Estado poderia atuar como motor de crescimento da demanda, dinamizando o mercado interno.
Não à toa, dados recentes mostram que a liberação de R$ 20 bilhões em depósitos compulsórios pelo Banco Central em julho deste ano acabou empoçada no sistema financeiro, sem atingir o objetivo de ampliar a oferta de crédito: com a economia estagnada, empresas e famílias não têm interesse em tomar mais empréstimos.
Da mesma forma, a queda da taxa de juros não foi suficiente para ativar novas decisões de consumo e investimento, na medida em que famílias ainda tentam segurar seus gastos em meio a um quadro de desemprego elevado e instabilidade da renda, e empresas não têm interesse em expandir sua capacidade produtiva enquanto enfrentam um alto grau de capacidade ociosa e baixo crescimento das vendas.
A deflação registrada em setembro é outro sinal de que o Banco Central superestimou sua capacidade de estimular a economia nesse contexto.
Ainda que os juros possam (e devam) cair ainda mais, quadros como esse costumam exigir a ação estimulativa da política fiscal. Mas como, se não há dinheiro, perguntará o leitor?
Primeiro, é importante compreender que o teto de gastos de Temer não chegou a impedir o crescimento da dívida bruta do governo que, aliás, está em patamar recorde.
Isso não impediu, aliás, que os juros caíssem, dado o quadro de inflação mais baixa. Ou seja, a discussão é menos sobre o governo poder ou não poder endividar-se neste ano ou nos próximos —pois isso ocorrerá em qualquer cenário— e mais sobre o horizonte temporal e a forma pela qual essa dívida se estabilizará e passará a cair em relação ao PIB.
Sendo a economia um sistema complexo e dinâmico, a estabilização da dívida em relação ao PIB depende da configuração de um conjunto de variáveis interdependentes.
Quanto crescerá a arrecadação do governo, que por sua vez depende do próprio crescimento do PIB
Quanto cairá a taxa de juros? Quanto ambas as coisas responderiam a um eventual crescimento dos gastos públicos —sobretudo se esse for destinado a itens de alto retorno no curto e no longo prazo, como investimentos em infraestrutura?
Hoje, o governo já tenta estimular a economia de forma disfarçada, seja por meio de medidas ditas para-fiscais, como a liberação de FGTS ou o corte de juros da Caixa, seja pela liberação de recursos no Orçamento a partir das receitas obtidas com leilões de petróleo e a transferência de recursos para estados e municípios por fora do teto de gastos.
O problema é que, por não comporem uma agenda coordenada de retomada da economia, essas medidas não refletem as melhores escolhas sobre onde, quando e como gastar. A necessária expansão de investimentos em infraestrutura, por exemplo, exigiria a adoção de uma agenda explícita para esse fim, com revisão das regras fiscais correspondentes.
Na prática, quando o governo finge que não quer estimular a economia, piora a qualidade de sua intervenção.
Fonte: Folha de S.Paulo
Link: http://bit.ly/AguaFria1810