A praça é do povo como o céu é do condor

Quando os grevistas metroviários ofereceram transportar passageiros sem cobrar nada, mostraram a genialidade deste povo

*Jorge Mautner

Já declarei e declaro novamente: as manifestações desde o início deste ciclo em junho do ano passado foram e são a exuberância da democracia. São os direitos humanos exercidos em sua plenitude.

A desobediência civil é essencial por ser o poder de dizer não e de reivindicar, de maneira pacífica e pacificante, os direitos básicos de sobrevivência digna e de cidadania. A desobediência civil é a irmã gêmea do direito de greve e do direito-dever de votar e, se assim quiser o eleitor, de não votar em ninguém, de anular o seu voto.

Desde o ano passado, quando nas primeiras manifestações, vi uma enorme faixa dizendo: “O gigante acordou!!!!”, vi o salto de uma sinapse. Nossos neurônios funcionam através de sinapses. Uma vez ocorrida essa sinapse, seus efeitos não têm retorno. É a partir desse novo patamar de desejos-descobertas e novas sínteses que se perpetua e se movimenta toda a história do autodenominado ser humano.

É como no filme “A Batalha de Argel”, de Gillo Pontecorvo. Esse filme genial nos mostra os guerrilheiros-libertadores da Argélia surpreendidos em um momento de profundo desânimo e pessimismo pelo imediato abraço e engajamento dos moradores da Casbah, espécie de Mangueira da Argélia. A melancolia das forças libertadoras da Argélia naquele momento se transforma radicalmente em entusiasmo vitorioso.

Aquele momento eternizado pelo cinema mundial foi uma sinapse: em um salto, a realidade das ideias, paixões e ímpetos assume uma nova forma, sem retorno. Há um ano, o povo brasileiro nas ruas deu um salto em uma sinapse de aprofundamento total da democracia e não há recuo.

Tudo hoje em dia é na velocidade da luz e tudo é simultaneidade, isto é, tudo ocorre quase ao mesmo tempo-espaço. Um exemplo disso é a atitude da volta por cima quando os grevistas metroviários ofereceram transportar passageiros sem cobrar nada. Situações novas e que trazem a genialidade deste povo brasileiro sem catracas!

São séculos de injustiças que, pela novidade da tecnologia, da irradiação dos direitos humanos, vão ser superados. Superados sem sangue de revoluções, mas pela voz da concórdia e do debate sagrado da democracia! Maiorias e minorias amalgamadas! Neste país que é um continente e que tem um marechal que é índio e que se chama Rondon e que disse: “Matar jamais, morrer se preciso for!”.

Quero concluir este texto com um verso da minha nova canção em parceria com o José Miguel Wisnik que diz: “A liberdade é bonita, mas não é infinita. Me acredite, a liberdade é a consciência do limite!”.

Jorge Mautner, 73, é compositor, músico e escritor.

Fonte: Folha de São Paulo

Compartilhe:

Leia mais
Declaração Imposto de Renda 2025
Declaração do Imposto de Renda 2025 passará por mudanças, anuncia Receita Federal; saiba
Antonio Neto e Lula lançamento crédito do trabalhador
CSB acompanha lançamento do "Crédito do Trabalhador", nova modalidade de consignado
reunião centrais marinho e macedo 12-03-25
Centrais sindicais se reúnem com ministros Luiz Marinho e Márcio Macêdo em Brasília
juros consignado clt
Trabalhadores CLT pagam mais juros no consignado que servidores e aposentados
crise saúde mental mulheres afastamentos
Afastamentos relacionados à saúde mental crescem 68% em um ano; mulheres são maioria
semana 4 dias de trabalho aumento produtividade
Produtividade aumenta em empresas que adotaram semana de 4 dias de trabalho no Brasil
IRPF 2025
Imposto de Renda 2025: confira tabela, prazos e quem precisa fazer a declaração
regulamentação trabalho aplicativos união europeia
União Europeia: o trabalho em plataformas digitais exige regulação, por Clemente Ganz
processos justiça trabalhista
Sobre números e narrativas na Justiça Trabalhista, por Guilherme Guimarães Feliciano
campanha contra escala 6x1 presidente prudente
Conselho Intersindical de Presidente Prudente intensifica campanha contra escala 6x1