Trabalhadores em movimentação de mercadorias: representação sindical específica é direito histórico

No Brasil, o enquadramento sindical é, em regra, definido pelo ramo de atividade das empresas, ou seja, pela atividade preponderante. Entretanto, há uma exceção prevista na legislação: as chamadas categorias diferenciadas. Nelas, a representação sindical não é determinada pela atividade principal da empresa, mas sim pela profissão exercida pelo trabalhador. É o que se denomina sindicalização horizontal, baseada na identidade de condições de vida e de trabalho ou na existência de estatuto profissional próprio.

Entre essas categorias diferenciadas estão os trabalhadores em movimentação de mercadorias, uma representação consolidada e prevista historicamente no quadro anexo do artigo 511 da CLT, hoje respaldada também pelo §3º do mesmo dispositivo legal. Todos os sindicatos que representam essa categoria já existiam muito antes não apenas da decisão do TST sobre o tema, mas também da edição da Lei nº 12.023/2009, sendo regularmente criados com autorização formal do Ministério do Trabalho e Emprego, de acordo com as exigências legais.

Tradicionalmente, esses trabalhadores eram conhecidos como chapas. Muitos se posicionavam nas entradas das cidades, em barracas improvisadas, aguardando que caminhões os contratassem para carregar ou descarregar mercadorias. Era um serviço braçal e extenuante, marcado pela informalidade e pela precarização.

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Com o tempo, e com a evolução tecnológica, esse trabalho passou a ser desempenhado com o auxílio de máquinas, como as empilhadeiras. As funções se modernizaram, mas a essência da atividade permaneceu a mesma: movimentar mercadorias. Assim, os antigos chapas e saqueiros se transformaram em operadores de empilhadeiras e outros equipamentos, sem que isso descaracterizasse sua identidade de categoria diferenciada.

Apesar dessa evolução natural do trabalho, parte do movimento sindical não reconheceu, ou não quis reconhecer, essa transformação. Projetos de lei e iniciativas pontuais vêm tentando restringir a representação dos sindicatos de movimentação de mercadorias apenas aos trabalhadores avulsos, excluindo aqueles contratados diretamente por empresas.

Curiosamente, enquanto esses profissionais estavam expostos à insegurança das estradas, sem qualquer garantia, pouco se discutia sobre sua representação. Para muitos, eram considerados trabalhadores de “segunda categoria”. No entanto, à medida que a atividade ganhou estrutura e tecnologia, surgiram tentativas de incorporar esses profissionais ao escopo de sindicatos de outras áreas, em especial dos vinculados à atividade preponderante das empresas.

Em São Paulo, um acordo firmado entre o sindicato dos comerciários e o sindicato dos movimentadores de mercadorias trouxe uma solução prática: o uso dos Códigos Brasileiros de Ocupação (CBO) para identificar com precisão quais trabalhadores pertencem à categoria diferenciada. O objetivo era claro: respeitar a lei e assegurar que a representação sindical seguisse a lógica da profissão, e não da empresa.

Contudo, o que se observa é a falta de respeito a esse pacto, inclusive por parte de signatários que agora buscam, de forma injusta, enfraquecer a representação histórica dos sindicatos de movimentação de mercadorias. Muitas das narrativas que circulam sugerem uma suposta ampliação indevida dessa representação. Mas, na realidade, o que está em jogo é o reconhecimento de que trabalhadores em movimentação de mercadorias, sejam avulsos ou empregados, pertencem a uma categoria diferenciada e, portanto, devem ter sindicato específico.

Essa disputa não é apenas corporativa: é a defesa da identidade profissional de uma categoria que, por décadas, enfrentou condições adversas e que, com novas ferramentas e métodos, continua exercendo função essencial para a logística e abastecimento do país.

Proteger a representação específica dos trabalhadores pelo Sindicato dos Trabalhadores em Movimentação de Mercadorias é garantir que esses profissionais tenham voz, direitos e um sindicato comprometido com suas demandas específicas e reais, como sempre ocorreu nos momentos mais difíceis da história da categoria.

Para isso, a unidade das Centrais Sindicais é fundamental, pois somente por meio de uma ação articulada e solidária será possível encontrar soluções que fortaleçam tanto a categoria quanto o conjunto do movimento sindical, assegurando avanços concretos para os trabalhadores.

*Por Paulo de Oliveira, secretário de Mobilização da CSB e presidente do Seaac (Sindicato dos Empregados dos Agentes Autônomos do Comércio) de Presidente Prudente – SP.

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