Entraram para a pauta desta semana do Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento de diversos temas trabalhistas, dentre eles o trabalho intermitente, a proteção dos trabalhadores em processos de automação, o regime de trabalho de servidores públicos e a demissão sem justa causa.
Em relação ao trabalho intermitente, autorizado pela reforma trabalhista de 2017, há três ações que discutem o modelo.
As ações foram propostas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI) e por entidades de trabalhadores de postos de combustível e de operadores de telemarketing.
O trabalho intermitente estabelece que os períodos de trabalho não precisam ser contínuos. É diferente, por exemplo, de contratos de trabalho que estabelecem uma jornada fixa, como 35 ou 40 horas semanais.
Na prática, o empregador pode formalizar um contrato de trabalho intermitente remunerando o trabalhador por hora trabalhada. O valor da hora de trabalho não pode ser menor que o valor horário do salário mínimo, e o empregado precisa ser avisado com antecedência sobre quando o empregador precisará dos seus serviços.
Segundo o Ipea, o número de ações trabalhistas que questionam os contratos de trabalho intermitente cresceu 116%, entre 2021 e 2023, apesar de o número de contratos neste modelo ainda representar menos de 1% do total. O volume de ações gira, atualmente, na casa dos 3 mil processos.
As entidades que acionaram o Supremo argumentam regimes flexíveis de trabalho violam princípios consagrados na Constituição, como o da dignidade humana e o do valor social do trabalho.
O caso é analisado há anos pelo STF. O relator, ministro Edson Fachin, já votou para declarar a modalidade inconstitucional, assim como a ministra aposentada Rosa Weber. Alexandre de Moraes e Nunes Marques, por outro lado, votaram a favor da constitucionalidade.
Um pedido de destaque feito pelo ministro André Mendonça, em 2022, interrompeu o julgamento, que deve ser retomado nas sessões do tribunal desta semana.
Proteção contra automação
Na quarta-feira (21), está na pauta da Corte uma ação que questiona se o Congresso Nacional foi ou não omisso sobre a regulamentação da proteção de trabalhadores à automação.
A ação foi apresentada em 2022 pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que considera que o Legislativo não cumpriu a determinação de um trecho da Constituição que estabelece que os trabalhadores devem ser protegidos dos processos de automação.
A automação é o fenômeno em que o trabalho humano é substituído por dispositivos mecânicos e eletrônicos, como robôs e máquinas. O atendimento bancário feito por robôs é um exemplo de processo de automação.
Como o Legislativo jamais criou uma lei para regulamentar a proteção ao trabalhador prevista na Constituição, segundo a PGR, a situação “provoca uma redução arbitrária e injustificada do nível de proteção do direito social prevista na referida norma constitucional, infringindo o princípio da proporcionalidade”.
Regime dos servidores
A pauta do STF inclui também previsto o julgamento de uma ação apresentada no ano 2000 pelo PT, PCdoB, PDT e PSD. As siglas questionam as mudanças feitas no regime de trabalho de servidores públicos, durante a reforma administrativa promovida no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
À época, a reforma fez com que a União, estados e municípios não precisassem mais estabelecer planos de carreira para servidores públicos, nem estabelecer um regime jurídico único, que prevê a estabilidade para o servidor após dois anos de atividade e a admissão por concurso público.
Em 2007, porém, uma decisão liminar do Supremo suspendeu os efeitos da norma que eliminava o regime jurídico único. As siglas questionam a forma como a mudança no texto constitucional foi feita, argumentando que não houve aprovação em dois turnos na Câmara e no Senado.
Demissão sem justa causa
Os ministros podem decidir ainda se é válido um decreto assinado em 1996 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso que desobrigou o Brasil de cumprir a convenção 158 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que proíbe demissão sem justa causa.
O caso é analisado pelo Supremo há 27 anos, desde 1997. Nesse período, o tema foi julgado em diversas oportunidades, mas ainda falta uma decisão da maioria do plenário se o decreto de FHC deve ser ratificado ou derrubado.
No julgamento da ação, além de analisar a constitucionalidade do decreto, o Supremo avalia se um presidente da República pode denunciar tratado internacional sem a manifestação do Congresso Nacional.
Já há maioria de votos para que um presidente seja impedido de revogar a participação do Brasil em convenções internacionais sem que o Congresso seja consultado.
Os ministros, contudo, já apresentaram quatro entendimentos distintos sobre a eficácia do decreto assinado por FHC. Os votos foram os seguintes:
- o decreto é válido, mas precisa do aval do Congresso para valer plenamente (votaram assim os ex-ministros Maurício Corrêa e Carlos Ayres Britto);
- o decreto é válido, e antes disso, ao aprovar o texto da convenção, o Congresso já tinha autorizado ao presidente que poupasse o país de cumprir o texto (votou assim o ex-ministro Nelson Jobim)
- um presidente da República só pode retirar o país de tratados internacionais mediante autorização do Congresso, mas essa decisão só vale para novos casos, o que manteria a eficácia do decreto de FHC (votaram assim o ex-ministro Teori Zavascki e os ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, André Mendonça e Nunes Marques);
- o decreto é inconstitucional, e caberia ao Congresso decidir se o Brasil deve ser retirado da convenção 158 da OIT (votaram assim os ex-ministros Joaquim Barbosa, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski).
Essa não é a primeira vez que o STF julga o decreto de Fernando Henrique Cardoso. Ao analisar outra ação sobre o tema em 2015, por maioria de votos, o Supremo decidiu manter a eficácia do ato assinado pelo ex-presidente.
Naquela ocasião, ficou definido que a denúncia de tratados internacionais por um presidente da República exige a concordância do Congresso, mas esse entendimento não pode retroceder para derrubar atos do passado.
Com informações de Carta Capital e R7
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebon