Renda que mais cresce é a do empregado doméstico

Em uma economia que caminha rumo à formalização, a renda que mais cresceu em nove anos é justamente a do trabalhador com menor nível de registro em carteira: a dos serviços domésticos. Entre dezembro de 2002 e igual mês de 2011, o rendimento real desse tipo de ocupação cresceu 38%, maior variação entre os sete grupos de atividade pesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e quase o triplo do aumento médio de 13% nas seis principais regiões metropolitanas do país.

Mesmo com a alta expressiva, o salário médio do empregado doméstico ainda é o menor de todos os segmentos da economia analisados pelo IBGE. Em janeiro de 2012, de acordo com a Pesquisa Mensal do Emprego (PME), era de R$ 669,70, equivalente a apenas 28% da renda de um ocupado na administração pública – R$ 2.300, a maior entre os sete setores.

Para especialistas, a política de valorização do salário mínimo – que indexa os rendimentos nos serviços domésticos e mais que triplicou em termos nominais desde 2002 – impulsionou os ganhos desse trabalhador. Além disso, um número cada vez menor de pessoas dispostas a atuar no ramo, em um cenário de mercado de trabalho apertado e expansão da escolaridade, também aumenta o poder de barganha das domésticas: segundo dados do IBGE, em 2011, 94,8% dos ocupados no setor eram mulheres, e apenas 5,2%, homens.

“Já havia um vetor de valorização dessa renda via mínimo. Com a formalização e o crescimento econômico, abriu-se a possibilidade para que essas pessoas trabalhem com carteira assinada, em ramos que não exigem muita qualificação, principalmente no comércio e em serviços”, diz Fabio Romão, da LCA Consultores.

Dados da PME corroboram a explicação: enquanto a população ocupada cresceu 21,3% entre 2003 e 2011, o emprego nos serviços domésticos avançou apenas 10,8% no período, menor variação de todos os segmentos pesquisados. Em 2003, 7,6% da população ocupada estava no segmento. Em 2011, o número caiu para 6,9%, ou 1,5 milhão de pessoas, fatia menos expressiva dentre os empregos pesquisados pelo IBGE.

Rosângela Dantas chegou a ganhar R$ 1.700 em um mês como diarista, mas abandonou o trabalho em casas de família para se tornar microempresária. Desde setembro de 2011, ela administra com o marido uma pequena loja de materiais de construção em Itapevi, cidade da Grande São Paulo, onde mora.

Há três anos, a ex-diarista, de 44 anos, já havia tentado deixar o serviço doméstico para cuidar do negócio familiar – que existe desde 2007 -, mas como as contas de casa não fechavam, teve que voltar a ser doméstica temporariamente. “Eu estava sem capital de giro, mas agora estamos firmes. Não tem mais como voltar atrás, porque a clientela aumentou muito”, conta Rosângela, que também já foi dona de casa e costureira.

Ela estudou até a oitava série e agora pretende fazer cursos técnicos no Senai para gerir melhor seu negócio. Também incentiva os quatro filhos a ter bom desempenho na escola. A mais velha, de 22 anos, está se graduando em contabilidade e vai ajudar os pais na loja quando se formar.

Naercio Menezes Filho, professor associado da FEA-USP e coordenador do Centro de Políticas Públicas, do Insper, aponta que, além da escassez de oferta, o aumento da renda da população faz com que a procura por esse tipo de profissional também suba e pressione os salários. “A demanda está aumentando muito e a oferta caminha em sentido contrário”, movimento que, no entanto, ainda não foi suficiente para que o rendimento dos serviços domésticos ultrapasse o de algum outro setor da economia, diz ele.

“A maioria das trabalhadoras está no setor informal e, como a renda partiu de um nível muito baixo, não consegue atingir a de outras ocupações”, explica Menezes Filho. Poucas delas saíram da informalidade, de acordo com o IBGE: em 2003, 64,8% não tinham registro em carteira, número que caiu para 61,4% no ano passado.

Para Luiz Scorzafave, professor do Departamento de Economia da FEA-USP-Ribeirão Preto, a pouca instrução é um fator estrutural por trás da remuneração menor dos serviços domésticos, profissão que, historicamente, não tem o mesmo status de outras ocupações. A escolaridade dos ocupados nessa área melhorou em nove anos, mas segue baixa em relação a outros profissionais. Em 2011, 56,4% dos trabalhadores domésticos tinham oito anos ou menos de estudo – em 2003, esse percentual chegava a 69,7%.

Dependendo da evolução da oferta e da demanda, sustenta Menezes Filho, é possível que a renda desse segmento ultrapasse a de outro setor da economia já no curto prazo. Como reflexo dessa escalada, as pessoas terão de fazer elas mesmas suas tarefas domésticas ou, como ocorre em países desenvolvidos, a demanda será suprida por estrangeiras. “Já acontece isso no Brasil, mas vejo mais como casos isolados do que tendência por enquanto”, diz ele.

Romão, da LCA, espera que a diferença entre o rendimento do empregado doméstico com relação a outras ocupações continue diminuindo, mas, segundo ele, é difícil imaginar uma renda maior que a média para esse trabalhador, devido à baixa qualificação. “A relação entre instrução e renda não é direta, mas existe.”

Fonte: Valor

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