Especialistas criticam a reforma da Previdência durante seminário da Unafisco

Palestrantes analisaram os números da Seguridade Social brasileira e os regimes próprios, além das inconsistências da PEC 287

 

Polêmica e amplamente comentada em 2017, a reforma da Previdência foi um dos temas discutidos, nesta quinta-feira (02), durante o segundo dia do seminário “Os desafios para o próximo governo – Justiça Fiscal e Combate à sonegação e corrupção”, organizado pelaAssociação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco Nacional) com o apoio da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB); o evento aconteceu em São Paulo e começou na quarta (01).

Combate à corrupção, sistema tributário e Refis são destaque em seminário da Unafisco

Crítico à atual proposta do Governo, o diretor de Defesa Profissional e Assuntos Técnicos da Unafisco Nacional, Mauro José Silva, explicou que a discussão deveria ir além dos argumentos de déficit e superávit.

“Cientificamente, não podemos usar o critério de déficit e superávit para tratar de sustentabilidade de um regime previdenciário. Seria o mesmo que o médico resolvesse analisar a febre de seus pacientes com um aparelho de pressão. Estão usando o critério errado, o instrumento errado e estão dando os sinais errados. E é exatamente isso que acontece quando eu avalio o sistema de Previdência usando o critério de déficit e superávit, eu obtenho informações erradas”, falou Silva.

Segundo o especialista, a PEC 287 não respeita à Carta Magna brasileira. “Esta reforma nasceu com o DNA da inconstitucionalidade, pois, antes de retirar quaisquer direitos sociais, é preciso primeiro usar saídas menos restritivas. Antes, que se combata um nível elevadíssimo de sonegação, antes, que retirem as desonerações de contribuições previdenciárias ineficientes, antes, que se combata as fraudes na Previdência, antes, que se pare de dar Refis e premiando os sonegadores, antes, que se tomem todas essas medidas. Não se revela necessária a reforma da Previdência”, completou.

Além de fazer uma análise do Regime Geral da Previdência (RGPS) e mostrar seu superávit acumulado de 2000 a 2015, os valores da Desvinculação de Receitas da União (DRU) e dos desvios, nos anos 60 ,70 e 80, dos recursos da Previdência para concepção de obras de infraestrutura no País, o promotor e 1º secretário da Associação Paulista de Ministério Público (APMP), Paulo Penteado Teixeira Júnior, fez uma análise do suposto déficit.

“Déficit em Seguridade Social é um conceito descabido, porque se fala em segurança do amanhã e na segurança de todos nós, e isso é um investimento, não é um gasto. Um suposto déficit de R$ 242 milhões, mas R$ 92 bilhões foram drenados por intermédio da DRU; R$ 144 bilhões são renúncias da Seguridade Social, R$ 186 bilhões foram drenados por erros, fraudes, sonegação e inadimplência. Um déficit legislativo, pois basta vetar a DRU e basta acabar com as renúncias da Seguridade para nós termos um resultado de R$ 235 bilhões, o que daria um resultado negativo de R$ 6 bilhões ou 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Reformar o sistema de Seguridade por um déficit pontual de 0,3% do PIB? Em um país com 14 milhões de desempregado? O que significa receita menor do RGPS?”, questionou Júnior.

Após o contexto histórico da Seguridade Social na conjuntura da Constituição Federal de 88, feito pela procuradora-regional da República Zélia Luiza Pierdoná, Luiz Alberto dos Santos, doutor em Ciências Sociais, finalizou o painel fazendo uma análise geral do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) após a implantação do Regime de Previdência Complementar.

“Esse regime cobre um pouco mais de 4 milhões de pessoas entre participantes, aposentados e pensionistas. Os ativos totais têm crescido, mas ainda sim muito abaixo do seu potencial, tendo em vista o fato de que muitos poucos no Brasil têm renda para economizar. Recentemente, tivemos alguns dados importantes sobre fragilidade da previdência complementar e a ineficiência da fiscalização e regulação. Temos ainda situação graves de má aplicação e desvio de recursos”, falou Santos.

O palestrante analisou o cenário dos regimes de previdência. “A sustentabilidade financeira dos regimes próprios continuará sendo um tema relevante, na medida em que vai haver perda de receita, e com a segregação de massas poderá haver tentações no sentido de desconstituir direitos em fase de aquisição, como já tentava fazer a PEC 287, que desrespeitava as regras de transição estabelecida pelas Emendas Constitucionais 20/98, 41/2003 e 47/2005. Será uma corrida de obstáculo, onde o obstáculo vai correndo também e a gente nunca vai alcançar.  Precisamos também da criação de uma entidade gestora única do Regime Geral” falou Santos, que também é consultor legislativo.

Reforma Tributária

A segunda parte do dia foi reservada para a discussão sobre a reforma tributária e Justiça Fiscal. Com uma palestra intitulada a “A Impossível Reforma Tributária”, o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Ubaldo Cesar Balthazar, apresentou um contexto histórico das reformas tributárias e apontou as dificuldades na aprovação no Brasil.

“A reforma de [19]65 foi realizada em um governo autoritário, um governo militar, que impôs a reforma ao Congresso Nacional. Uma reforma tributária precisa conciliar interesses múltiplos, primeiro dos entes federativos, que são divergentes. Temos que conciliar interesses da classe empresarial e comercial, sindicatos e corporações, ONGS e por aí vai; e como conciliar todos esses interesses? É impossível na realidade brasileira de hoje. Para isso, nossos representantes teriam que ser lúcidos, que deixassem de olhar o próprio umbigo e pensassem na sociedade brasileira”, argumentou.

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