O déficit habitacional brasileiro registrou queda de 10,7% entre 2010 e 2014, embora ainda seja expressivo e corra riscos de retrocesso em meio ao cenário recessivo e de corte de despesas do governo federal.
Estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), mostra que, após andar de lado no período anterior, o déficit habitacional no país caiu a uma taxa de 2,8% ao ano entre 2010 e 2014 ou o equivalente a 742,4 mil famílias fora dessa estatística no período. Em números absolutos, a queda foi de 6,941 milhões de famílias vivendo de modo inadequado em 2010 para 6,198 milhões em 2014.
A política habitacional de interesse social do governo voltada basicamente para famílias cuja renda total vai até 3 salários mínimos foi fundamental para a redução desse déficit, diz Carlos Eduardo Auricchio, diretor do Departamento da Indústria da Construção da Fiesp. “Sem dúvida, o programa Minha Casa, Minha Vida foi o grande vetor dessa queda.”
O temor é que a redução no ritmo de obras e o desemprego façam o setor andar para trás. O problema está concentrado nas áreas urbanas e a elevação do desemprego pode trazer ainda mais gente para os grandes centros. Cerca de 90% do déficit habitacional se concentrava na área urbana em 2014. No Sudeste, essa taxa chegava a 98% e, em São Paulo, a 98,7%.
Pelo volume de contratações de obras para habitação popular visto ao longo de 2014, Auricchio estima que o déficit deve ter continuado a cair em 2015 em ritmo semelhante ao desenhado entre 2010 e 2014. “A sensibilidade do setor é que as contratações caíram de modo significativo em 2015 e isso traz muita preocupação para 2016 e 2017.” Auricchio defende transformar os programas habitacionais do governo em programas de Estado, além do estímulo às parcerias públicoprivadas (PPPs) habitacionais, ainda tímidas no Brasil.
A queda do déficit habitacional ocorreu em todas as regiões do país, com destaque para as mais pobres. No Norte, a redução chegou a 6,4% ao ano, ou o equivalente a 192 mil famílias. No Nordeste, a queda foi de 3% ao ano, com destaque para a Bahia, em que 115,6 mil famílias passaram a ter moradia.
O Sudeste não apresentou números tão expressivos. A taxa média de queda foi de 1,1% ao ano entre 2010 e 2014, passando de 2,674 milhões para 2,562 milhões de famílias. No Rio, a queda foi de 2,2% ao ano, para um déficit habitacional total de 472 mil famílias. Já em São Paulo, a queda foi de 1,1% ao ano, com déficit de 1,432 milhão.
Em termos relativos, porém, os maiores déficits continuam concentrados nas regiões mais pobres do país. No Norte, faltam moradias para 11,9% das famílias. No Amazonas, essa proporção chega a 14,6%. No Nordeste, o déficit atinge 10% das famílias, com destaque para o Maranhão, Estado com o maior déficit habitacional do país (18,1% das famílias). Na outra ponta, faltam moradias a 6,2% das famílias do Sul abaixo da média nacional, de 8,8% das famílias no déficit habitacional em 2014.
Com base na Pnad, o levantamento aponta ainda que o ônus excessivo com aluguel é o grande fantasma dos que moram de modo inadequado, ao atingir famílias que comprometem mais de 30% da renda com esse tipo de despesa. O problema foi mencionado por 50% das famílias que compõem o déficit e atinge 4,6% do total das famílias no país. Sudeste e CentroOeste puxaram essa relação, com destaque para o Distrito Federal.
Na coabitação familiar, havia 30,2% das famílias que compunham o déficit total, com destaque para a região Norte (Amazonas e Amapá). O estudo ressalta que pode haver famílias que são afetadas por dois componentes, como alugueis caros e coabitação.
Ana Maria Castelo, coordenadora de projetos de construção da FGV, lembra que o déficit ainda é alto e contém desafios importantes, sendo o maior deles o gasto com aluguel, componente essencialmente urbano puxado pela terra mais cara e pelo desejo das famílias de morar em regiões com melhores ofertas de trabalho. “À medida que a renda das famílias cai, esse ônus pode assumir dimensão ainda maior”, diz Ana Maria. Para ela, o déficit precisa ser encarado pelos municípios das regiões metropolitanas em parceria com Estados, União e entes privados. “Difícil imaginar que a solução vai sair de um ente público sozinho.”
Fonte: Valor Econômico