Comissão do Senado debate riscos e prejuízos causados pela Reforma Trabalhista

Prejuízos causados pela Reforma Trabalhista – Subnotificação do trabalho informal, prejuízos causados pela flexibilização de horários e casos de desrespeito aos direitos dos empregados domésticos foram pontos discutidos em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) na segunda-feira (15).

A reunião integrou um ciclo de debates proposto pelo presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), a fim de aprofundar a discussão sobre os efeitos da reforma trabalhista de 2017 e instruir a Sugestão (SUG) 12/2018, apresentada ao Senado por entidades de defesa dos direitos dos trabalhadores, que propõe a criação do Estatuto do Trabalho.

O tema da audiência foi “O Estatuto do Trabalho e meio ambiente do trabalho: trabalho digno; plataformas; teletrabalho; normas regulamentadoras e responsabilidade civil”.

A SUG 12/2018 foi elaborada durante o funcionamento de Subcomissão do Estatuto do Trabalho, criada no âmbito da CDH em 2017 para reavaliar e propor alternativas à reforma trabalhista promovida pela Lei 13.467, de 2017. O texto foi arquivado em dezembro de 2022, com o encerramento da legislatura, mas um requerimento de Paim, aprovado no Plenário em março, desarquivou o projeto, que continua tramitando na CDH. Relator, Paim afirmou que a proposta tem objetivo de fortalecer a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que completou 80 anos em 1º de maio de 2023.

“Defendo a CLT, e continuarei defendendo sempre. Quando falamos do Novo Estatuto do Trabalho, trata-se de uma atualização fruto de uma sugestão legislativa da qual tenho a honra de ser relator. É um debate do século 21, um passo à frente, e não um retrocesso. Em todos os eventos que realizamos e vamos realizar, sempre o aprimoramos”, afirmou Paim.

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Ambiente de trabalho seguro e saudável

Cirlene Luiza Zimmermann, procuradora do Ministério Público do Trabalho e substituta eventual da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, lembrou que o trabalho é como uma “segunda identidade”, e por isso não pode ser algo que “adoece, que causa dor e sofrimento”, mas precisa ser “digno, sustentável, seguro e saudável”.

“Em 2022, o direito ao meio ambiente de trabalho saudável e seguro foi considerado pela OIT [Organização Internacional do Trabalho] como um principio e direito fundamental. No mesmo ano, a Assembleia das Nações Unidas declarou o meio ambiente limpo, saudável e sustentável – e sempre que se fala em meio ambiente, inclui a perspectiva do trabalho – como um direito humano fundamental”, explicou a procuradora.

Ela afirmou que o novo Estatuto do Trabalho ajudará na evolução nas relações trabalhistas, assegurando um ambiente saudável para os empregados. Ela salientou que as empresas que querem se manter no mundo dos negócios devem cumprir os requisitos mínimos em relação aos trabalhadores.

A procuradora disse que a jornada de trabalho está vinculada à segurança da atividade laboral. E manifestou preocupação com projetos de lei que tramitam no Congresso e condicionam o cumprimento das regras trabalhistas pelas empresas ao porte do empreendimento, por exemplo.

“Na realidade, o que traz o risco [para uma empresa] é a atividade [em si], então precisamos desvincular questões que não têm vinculação alguma. É um cenário de preocupação que merece nosso registro”, disse Cirlene Zimmermann, que acredita que é necessário fomentar uma cultura de prevenção de doenças e acidentes de trabalho, visto que a saúde é valor inalienável.

Os riscos da informalidade

Representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Ana Luiza Horcades apontou que a pandemia de covid-19 trouxe uma necessidade de revisão das formas de trabalho para os empregados, de maneira geral, a fim de que o Estatuto do Trabalho não nasça “já velho”.

A auditora do trabalho afirmou que a informalidade dificulta o dimensionamento das mortes ocorridas no desempenho da atividade laboral, por exemplo, e que essa ausência de dados atrapalha a elaboração de políticas de prevenção de acidentes de trabalho e de preservação da saúde.

“Muita gente morreu [na pandemia] porque precisava trabalhar. Mas é um número que a gente não consegue de fato conhecer em função, principalmente, da informalidade. A gente tem um grupo enorme de pessoas que morreram, por exemplo, pela falta de trabalhadores em determinados serviços. Além disso, temos as pessoas que trabalham na área da saúde, cujos índices de contaminação foram altíssimos e, por isso, carregam sequelas. Então, para seguirmos nesse projeto de melhorar o nosso estatuto do trabalho, podemos incorporar questões macro, como esse gerenciamento dos riscos ocupacionais”, defendeu Ana Horcades.

Para o procurador do Trabalho e vice-coordenador nacional da Coordenadoria de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho, Renan Bernardi Kalil, a flexibilidade de horários adotada por empresas de entrega por aplicativos, por exemplo, gera prejuízos financeiros aos empregados.

Segundo ele, apesar de parecer um benefício, essa modalidade gera riscos e acarreta mais carga de trabalho, principalmente para aqueles que dependem economicamente da atividade. O debatedor considerou a audiência pública da CDH fundamental para ajudar a sociedade a reconhecer, inclusive, as desigualdades econômicas verificadas entre empregadores e trabalhadores.

“Em geral, essas plataformas de empresas de entrega têm um sistema de remuneração que paga muito pouco, mas resultam numa margem de manobra que gera um grau de arbitrariedade muito grande para os trabalhadores”, afirmou.

Representante do Movimento da Advocacia Trabalhista Independente (Mati), Rosildo Bomfim observou que não se trata de uma “demonização da tecnologia”, mas é preciso fazer separação entre as empresas que usam as plataformas digitais como meio de negócios e aquelas que usam esses instrumentos apenas para tentar fraudar as leis trabalhistas.

O advogado disse também que é preciso evitar que o trabalhador seja transformado em uma “mercadoria” e pediu atenção dos congressistas quanto aos projetos de lei em tramitação sobre o assunto.

“Não fazemos reforma na nossa casa para piorá-la. Reformas são para melhorar, são para pegar, por exemplo, trabalhadores fora do sistema protetivo e colocá-los dentro”, argumentou.

Violação de direitos trabalhistas

A ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Delaíde Alves Miranda Arantes ressaltou que os juízes trabalhistas têm o dever de controlar as normas e verificar se essas regras estão seguindo as diretrizes internacionais. Ela disse que a proteção ao trabalhador é a razão de ser da CLT e defendeu uma atuação conjunta do Legislativo, do Executivo e do Judiciário para fortalecer os trabalhadores.

A ministra citou a atualização da legislação trabalhista em países como Portugal, que estão punindo com prisão empregadores domésticos que não cumprem seus deveres.

“Está em vigor desde 1º de maio [em Portugal], dentre outras medidas, pena de prisão para o empregador doméstico que não fizer o registro desse profissional. É um processo criminal. Enquanto isso, a reforma trabalhista [no Brasil] contribuiu para a exploração do trabalho infantil, para o trabalho escravo, para a terceirização ampla com contratos precários, onde tudo contribuiu enormemente para a piora dos indicadores. Está sendo muito violado o trabalho digno previsto na nossa Constituição”, alertou a magistrada.

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O diretor do Departamento de Segurança e Saúde do Trabalhador do Ministério do Trabalho e Emprego, Henrique Mandagará de Souza, destacou os índices de trabalho análogo à escravidão verificados especialmente em áreas rurais e a cultura do trabalho escravo doméstico que ainda persiste. O representante do governo observou que essa violação de direitos se mostra maior em relação às mulheres.

“A gente continua afastando crianças e adolescentes de trabalhos proibidos […]. Precisamos pensar, por exemplo, formas de fortalecer as representações [sindicais] dos trabalhadores. São desafios complexos, já que as novas formas de trabalho dificultam a própria organização dos trabalhadores, seja na terceirização irrestrita, seja no crowdworking [modalidade onde pessoas são contratadas via plataforma digital e executam tarefas online para empresas ou outros indivíduos]”, pontuou. 

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Também participaram do debate o presidente da Associação Latino-americana de Juízes do Trabalho (ALJT), Hugo Cavalcanti Melo Filho, e o representante do Núcleo de Pesquisa e Extensão “O Trabalho Além do Direito do Trabalho” (NTADT) e do Grupo de Pesquisa “Meio Ambiente do Trabalho” (GPMAT), ambos vinculados ao Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), professor Guilherme Guimarães Feliciano.

Fonte: Agência Senado, com edições por CSB

Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

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