Apesar da insegurança jurídica, Brasil tem práticas de sucesso

Na ABRH-Nacional, palestra de Antonio Neto destaca questões legais e sindicais sobre o trabalho a distância

As empresas precisam se preparar para um futuro muito próximo: a previsão é de que, em 2015, o mundo terá 1 bilhão e 300 milhões de profissionais trabalhando a distância. O número da IDC, consultoria especializada em tecnologia, foi divulgado por Sónia Boiarov, da Argentina, na semana passada, durante o I Fórum ABRH-Nacional de Teletrabalho.

Realizado no auditório da Editora Abril, em São Paulo, o evento fez uma abordagem em 360 graus sobre as questões legais, sindicais, tecnológicas e trabalhistas, entre outros aspectos do trabalho a distância.
Fundadora do Torres dei Teletrabajo, um “edifício” virtual que promove o encontro de teletrabalhadores com as empresas, Sônia participou, via tecnologia, do painel Ferramentas tecnológicas indispensáveis para o trabalho a distância, que também teve a participação de Thiago Paretti e Tawan Pimentel, ambos da diretoria de Tecnologia da Sobratt – Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividade, apoiadora do fórum.

“Quando começaram a surgir os pri-meiros PCs, Bill Gates disse: ‘Temos de investir muito dinheiro na mudança de comportamento’. Hoje, isso se aplica ao teletrabalho”, frisou Pimentel.

Difusão nacional

No painel de abertura, o consultor Olímpio de Melo Alvares Júnior, que trabalhou por 25 anos na Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), abordou os prejuízos que a alta circulação de veículos causa à saú¬de das pessoas e defendeu a adoção do trabalho a distância como solução para reduzir o trânsito nos grandes centros.

Ele citou a experiência do Metro de São Paulo, que adotou home office para parte de seus funcionários e, em troca, recebeu ganho de produtivida¬de. E apontou o RH como ator resistente à mudança pela suposta falta de controle sobre os colaboradores. “Minha experiência diz que não adianta o funcionário estar dentro da empresa para ser produtivo”, disse.

Depois foi a vez de Andréa Leal, consultora em Políticas Públicas do Banco Mundial e do World Resources Institute (WRI), falar do projeto Mobilidade Corporativa, uma parceria do BMAVRI com empresas privadas para melhorar a mobilidade nos centros urbanos e que tem, como uma de suas ferramentas, o home office.

O projeto teve sua fase experimental com dez empresas da região da Benini, um dos principais centros empresariais da capital paulista, e, agora, segue para o Rio de Janeiro.

“Nos horários de pico da Berrini, só para sair com o carro da garagem as pessoas levam cerca de 30 minutos”, exemplificou Andréa, para dar a dimensão do problema.

Depois da apresentação, Leyla Nascimento, presidente da ABRH-Nacional, anunciou que a associação, por meio de sua diretoria de Sustentabilidade, liderada por Françoise Trapenard, e juntamente com a Sobratt, pretende estabelecer uma parceria com o BM para contri­buir na expansão do projeto, divul-gando-o para os RHs de empresas dos demais centros urbanos do país.

“Como uma associação focada em RH e gestão de pessoas, temos que ‘mergulhar’ nas questões da qualidade de vida, do estresse e das doenças causadas pela urbanidade. A ABRH possui 22 seccionais no Brasil e, por meio de sua capilaridade, pode difundir iniciativas que contribuem com o desenvolvimento sustentável do país”, assinalou.

Como fica a liderança?

Junto com os fatores ambientais e de qualidade de vida, uma mudança importante nas relações de trabalho tem contribuído para a crescente demanda por home office: cada vez mais, os profissionais estão optando por trabalhar por processo ou por projeto, e não em tempo integral para uma única organização. Isso significa, também, uma revisão do conceito de liderar.

Esse foi o mote do painel Como liderar a distância, que contou com a participa­ção – e os alertas – dos consultores Sidnei Oliveira e Edson Mattos.

Para Mattos, a definição de liderança utilizada até agora – “ter a habilidade de influenciar pessoas para alcançar resul­tados” – precisa ser revista. “Ser líder, na verdade, é ter a habilidade de influenciar. positivamente as pessoas para alcançar resultados superiores, e isso vale também para o trabalho a distância”, frisou, passando, em seguida, a detalhar como essa influência se dá.

Oliveira, por sua vez, salientou que a matriz “controle-maturidade” precisa ser aplicada com mais atenção pelas lideranças. Para ele, a ideia de que o controle deve ser maior quanto menos amadurecido for o profissional tem extrapolado limites. Isso porque, por receio de delegarem aos subordinados e estes não corresponderem como deveriam^ os gestores tomam para si cada vez mais as responsabilidades da equipe. Com isso, os gestores sobre­carregam seu dia a dia e impedem os liderados de amadurecerem.

“E, muitas vezes, querem controlar o incontrolável”, comentou. “Não adianta bloquear o Facebook nos computadores da empresa, porque qualquer smartphone hoje permite esse acesso”, lembrou.

Atraso na legislação

As questões legais e sindicais foram as mais questionadas pela plateia, interessada em saber como se proteger de possíveis ações trabalhistas por conta da falta de uma legislação específica.

Todos esses aspectos foram abordados em dois painéis, um com Antonio Neto, presidente do Sindpd (sindicato dos trabalhadores de processamento de dados de São Paulo), e outro com Wolnei Ferreira, diretor Jurídico da ABRH-Nacional e coordenador do fórum; e o advogado trabalhista Luiz Otávio Camargo Pinto.

Em ambas as apresentações, os palestrantes frisaram que, apesar da Lei 12.551, que alterou o artigo 6o da CLT para regulamentar o trabalho a distância, a falta de uma legislação mais ampla e a consequente insegu­rança jurídica ainda mantêm os empregadores na defensiva.

Além das leis já existentes em países como Estados Unidos, Argentina, Colômbia e Costa Rica, foram lembradas a Recomendação 184 e a Convenção 177, de 1996, da OIT (Organização Internacional do Trabalho), ambas sobre o trabalho a distância e não ratificadas pelo Brasil.

A expectativa é de que, além do engajamento do país nas iniciativas da OIT, os projetos de lei que tratam do tema (4505/2008, 4793/2012,274/2013 e 326/2013) sejam rapidamente avaliados e votados pelo Legislativo.

A visão de quem pratica 

Uma das contribuições mais enrique­cedoras deixadas pelo fórum foi a de gestores de RH relatando suas experiências com o trabalho a distância. Pelo setor privado, partici­param Patrícia Gaspar, gerente de RH e gestora do programa Trabalho Remoto da Promon Engenharia; Silvio Paciello, diretor de RH da Cisco; e Eduardo Martins, diretor de RH no Brasil e diretor de Remuneração para América Latina da Philips. Já pela área pública, o TCU (Tribunal de Contas da União) foi representado por Claudia Mancebo, secretária de Gestão de Pessoas. Ela contou como a instituição derrubou o paradigma da ineficiência da gestão pública e tornou-se ben-chmark em teletrabalho.

Outra referência do setor público, esta internacional, foi levada por Jorge Llubere, diretor de Teletrabalho e Videocomunicação do ICE – Instituto Costarricence de Eletricidad -primeira organização do governo da Costa Rica a participar do programa de trabalho a distância iniciado em 2007 -, e coordenador da Comissão Nacional de Teletrabalho.

Em uma participação viabilizada pela teleconferência, Llubere foi entrevis­tado por Alvaro Mello, presidente da Sobratt. Ele confirmou que, também no exterior, o maior desafio a ser superado é a resistência causada por mitos como, por exemplo, o de que, fora do alcance dos olhos dos gestores, as pessoas não trabalham.

Quem esteve no fórum teve a oportu­nidade de constatar que, apesar das diferenças visíveis eritre a gestão do setor público e a do setor privado, ambas têm um ponto em comum: a adoção do trabalho a distância trouxe ganho de produtividade, redução de custos (economia nos gastos com transporte, viagens e espaço físico) e maior satisfação dos colaboradores. E, o que é ainda melhor, sem qualquer registro de ação trabalhista.

Fonte: O Estado de São Paulo

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