O Supremo Tribunal Federal (STF) realizará na próxima segunda-feira (6) uma audiência pública para debater a pejotização – prática em que empresas contratam trabalhadores como pessoas jurídicas, fugindo dos direitos trabalhistas previstos pela CLT e pelas convenções coletivas de trabalho. A Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB) participará do debate, representada por seu presidente, Antonio Neto, que alertará o tribunal a respeito dos prejuízos que a prática causa aos trabalhadores e aos cofres públicos.
A audiência ocorre no contexto do Tema 1.389 de Repercussão Geral, que discute se processos envolvendo pejotização são de competência da Justiça Cível ou da Justiça do Trabalho, e se esse tipo de contratação é legal. Em abril, Gilmar Mendes determinou a suspensão de todos os processos judiciais sobre o assunto em todo o país, até que o STF defina um entendimento.
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Dados da Justiça do Trabalho mostram que somente nos dois primeiros meses de 2025, 53.678 ações foram abertas pedindo o reconhecimento de vínculo empregatício. Desde 2020, mais de 1,2 milhão de processos questionam relações de trabalho camufladas como PJ.
Crescimento e prejuízos da pejotização
Estudo do economista Nelson Marconi, da Fundação Getulio Vargas (FGV), estima que o Estado deixou de arrecadar até R$ 144 bilhões entre 2012 e 2023 devido ao avanço desse modelo de contratação. A migração em massa de trabalhadores da CLT para o regime PJ também impactou drasticamente o recolhimento previdenciário e o FGTS.
Enquanto entidades patronais defendem a flexibilidade e a redução de custos, centrais sindicais e o Ministério Público do Trabalho alertam para a precarização do trabalho, a destruição dos direitos dos trabalhadores e a fraude à legislação. Antonio Neto deve reforçar a defesa pela manutenção da competência da Justiça do Trabalho para analisar esses casos e pelo combate à pejotização forçada.
“Há casos em que a pessoa não tem um CNPJ para empreender, mas é obrigada a isso para ter acesso ao emprego”, afirma Dercylete Loureiro, coordenadora-geral de Fiscalização do MTE. Ela ressalta que a terceirização, embora permitida em situações específicas, não pode servir para precarizar relações de trabalho.
Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) revelam a magnitude dessa transição: entre 2022 e 2024, 4,8 milhões de trabalhadores demitidos retornaram ao mercado como PJs – sendo 3,8 milhões como Microempreendedores Individuais (MEI) e 1 milhão em outras modalidades, como o Simples Nacional. A pasta identificou que uma parcela significativa foi coagida a abrir CNPJ para manter o emprego, caracterizando a pejotização como uma mudança imposta e não uma opção livre.
Esse movimento tem gerado prejuízos bilionários à Previdência Social e ao FGTS. Estima-se que, apenas com a migração desses 4,8 milhões de trabalhadores, empregadores e empregados deixaram de recolher R$ 61,4 bilhões à Previdência e R$ 24,2 bilhões ao FGTS no período. Enquanto um trabalhador formal contribui, em média, com R$ 33,1 mil por ano em impostos e encargos, um PJ no regime MEI ou Simples recolhe cerca de R$ 4,1 mil anuais.
Além dos impactos econômicos, especialistas alertam para a perda generalizada de direitos. Trabalhadores pejotizados ficam privados de férias remuneradas, 13º salário, FGTS e proteção contra demissão sem justa causa. Muitos também acabam arcando com custos antes cobertos pelas empresas, como equipamentos de trabalho, e ficam desprotegidos em casos de acidentes de trabalho ou enfermidades.
Economistas alertam que, a longo prazo, a redução nas contribuições pode comprometer o financiamento da Previdência, sobrecarregando o sistema. Enquanto empresas lucram com a redução de custos, os trabalhadores assumem riscos antes divididos com os empregadores, aumentando a insegurança econômica e a desigualdade.
Além de Gilmar Mendes, participarão da abertura do evento o subprocurador-geral da República, Luiz Augusto Lima, e o ministro da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias. Também estarão presentes juristas, representantes de confederações empresariais, Receita Federal e MP do Trabalho.
A audiência está entre as mais relevantes do semestre no STF e seu resultado deve influenciar milhares de ações em todo o país, além de balizar futuras políticas tributárias e trabalhistas sobre o tema.
Com informações de Folha de S.Paulo
Foto: divulgação/CSB