O endividamento das famílias brasileiras bateu recorde, com o valor total das dívidas chegando a 59,9% da renda média anual, segundo dados mais recentes do Banco Central. O resultado de junho é o maior patamar desde o início da série histórica do BC, em 2005
Com a inflação em alta e a perspectiva de um aperto maior de juros, analistas alertam que o orçamento comprimido das famílias com dívidas será um limitador adicional ao crescimento da economia nos próximos meses.
Mesmo sem considerar os financiamentos imobiliários — um crédito mais “saudável” por ser de longo prazo e representar um investimento das famílias — o endividamento é recorde: 37%. Até julho do ano passado, este patamar nunca tinha superado 30%.
Pressão no orçamento
Em média, segundo dados do BC, o comprometimento mensal de renda das famílias com o pagamento de juros e prestações — incluindo dívidas mais longas, como financiamento imobiliário, e outras de curto prazo, como cartão de crédito ou parcelamento de compras — chegou a 30,9% em agosto, também em alta.
A inadimplência se mantém estável, em 4,2%, mas analistas temem que o peso da inflação — que chegou a 10,25% na taxa acumulada em 12 meses até setembro — force as famílias a atrasarem as prestações com o orçamento já apertado.
—Quando o consumidor paga mais caro por gasolina, alimentos, energia, começa a enfrentar dificuldades de honrar compromissos financeiros assumidos previamente. É um risco pela inflação, não por excesso de endividamento — diz Luis Rabi, economista sênior da Serasa Experian.
Simão Davi Silber, professor sênior do Departamento de Economia da USP e Pesquisador da FIPE, lembra que o consumo das famílias representa dois terços do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país).
Dívidas mais caras
E, a partir de agora, as dívidas ficarão mais caras com a perspectiva de aumento na taxa de juros pelo BC, hoje em 6,25% ao ano, justamente para conter a inflação:
— Para famílias com renda comprometida, o dilema vai ser tomar banho frio para comer. Estamos chegando a este nível, dada a pressão sobre o orçamento. Isso indica que as famílias têm capacidade de (consumo) comprometida ao longo de 2021 — avalia Silber.
Para Fabio Bentes, economista sênior da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o desemprego elevado, que atinge mais de 14 milhões de pessoas, agrava o quadro.
Mas ele avalia que a curto prazo, parte do desconforto poderá ser aliviado pelo avanço da vacinação e o aumento da circulação de consumidores no fim do ano. A expectativa da CNC é que esse movimento faça a contratação de temporários para o Natal ser a maior dos últimos oito anos:
— Há uma espécie de válvula que vai aliviar, ao menos até dezembro. Mas depois disso a gente não sabe porque entramos em um ano complicado.
Fonte: O Globo