Central dos Sindicatos Brasileiros

Centrais entregam manifesto para Arthur Lira e exigem retirada da PEC 32 da pauta do Congresso

Centrais entregam manifesto para Arthur Lira e exigem retirada da PEC 32 da pauta do Congresso

Após mais de um mês de mobilizações digitais e nas ruas contra a proposta de reforma administrativa que tramita no Congresso Nacional, as Centrais Sindicais e Servidores Públicos foram recebidos em audiência pelo presidente da Câmada dos Deputados Federais pelo presidente da Casa, Arthur Lira.

Durante o encontro que contou com a presença de deputados da bancada de oposição ao governo federal, foi entregue ao congressista um manifesto das centrais sindicais pedindo a não tramitação do projeto que representa um retrocesso de proporções enormes para a sociedade brasileira. O documento apresenta um laudo técnico elaborado por diversas entidades atestando a inviabilidade técnica de aprovação da PEC 32.

“Os servidores públicos estão aflitos, mas o cerne da questão é o prejuízo que essa PEC trará ao Brasil, retirando a proteção social que é dever do Estado perante seus cidadãos e entregando de bandeja para o mercado as atividades do setor. É necessário que o presidente Arthur Lira retire essa proposta da pauta da Câmara e abra o diálogo com a sociedade.” afirmou Cosme Nogueira, Presidente da Seccional Minas Gerais da CSB, que representou a entidade na reunião.

Leia abaixo a íntegra do documento entregue a Arthur Lira:

MANIFESTO DO ENCONTRO NACIONAL DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS DO SERVIÇO PÚBLICO

O presente Encontro Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Setor
Público é fruto do esforço de construção e de um amplo processo de unidade
das centrais sindicais CUT, CSP-CONLUTAS, CTB, PÚBLICA, CGTB, UGT, Força
Sindical, Intersindical Central da classe trabalhadora, NCST – Nova central,
CSB, Intersindical – Instrumento de luta e organização da classe trabalhadora,
além de outras entidades representativas do movimento de trabalhadores e
trabalhadoras como FONASEFE, Movimento BASTA, UPB – União dos Policiais
do Brasil, e também da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público.

Os resultados desse evento, estampados neste documento, apontam o
caminho para o combate à política criminosa e destruidora dos serviços e dos
servidores públicos estabelecida na Proposta de Emenda Constitucional 32,
que impõe um duro golpe às políticas sociais de saúde, educação, segurança,
dentre várias outras, e a extinção dos regimes jurídicos únicos nas esferas dos
municípios, estados e União, vilipendiando de forma perversa os preceitos
constitucionais da Carta Magna de 1988.

Esse encontro aponta o caminho da luta e da resistência e chama o povo
brasileiro a somar-se nessa cruzada para evitar um duro golpe nas conquistas
e direitos sociais de nosso povo consignados nessa terrível reforma
administrativa.

A derrota da PEC-32 é a vitória do povo trabalhador brasileiro. Esse é o nosso
propósito e essas são nossas tarefas!

esde o início do governo de Jair Bolsonaro, têm sido implantadas no país
várias ações que que diminuem o papel do Estado brasileiro. São medidas para
privatizar as empresas e os serviços públicos, reduzir investimentos, a oferta
de serviços públicos, mesmo os essenciais, as políticas que combatem as
desigualdades (entre homens/mulheres; negros/não negros; campo/cidade;
LGBTQIA+; pessoas com deficiência (PcD); geracional etc.), retirar direitos dos
servidores(as) e dos trabalhadores(as) do setor privado e enfraquecer a
representação dos trabalhadores.

Ao contrário do que tem sido afirmado pelo governo Bolsonaro e seus
apoiadores, a reforma administrativa altera e retira direitos e garantias já
consagrados para os servidores públicos, ao mesmo tempo que protege as
forças armadas, a cúpula do judiciário, do parlamento e do executivo.
De maneira sintética, pode-se dizer que ocorrerão impactos diretos e
indiretos para o conjunto de trabalhadores, para a atuação sindical e para a
sociedade brasileira como um todo, caso essa reforma seja aprovada.

Talvez, a mais importante alteração que consta da PEC 32 é a que se pode
chamar de relativização da estabilidade. A estabilidade é regra constitucional
e é a maior garantia para a sociedade de que o servidor poderá desempenhar
seu trabalho de forma impessoal, sem se preocupar com qualquer tipo de
represália, tendo o mínimo de influências de ordem político-partidária e sem
comprometer a missão final de bem atender ao cidadão.

Atualmente, a Constituição prevê, no artigo 41, as seguintes condições para
que o servidor público estável venha a perder o cargo: I – em virtude de
sentença judicial transitada em julgado (quando não há mais possibilidade de
recurso); II – mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada
ampla defesa; III – mediante procedimento de avaliação periódica de
desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa.

A proposta em análise prevê que o atual servidor público estável e o futuro
servidor ocupante de cargo típico de Estado possam perder seus cargos a
partir de uma decisão proferida por órgão judicial colegiado. Essa alteração
representa um gravíssimo retrocesso, visto que atualmente a perda do cargo
só pode ocorrer após o processo transitar em julgado. Desde a Constituição de
1934, a hipótese de perda judicial do cargo público somente acontecia depois
do trânsito em julgado, o que foi mantido na redação originária da Carta de
1988. Caso a PEC32 seja aprovada, veremos um retrocesso sem precedentes.

Nessa perspectiva, o governo apresentou uma proposta de Reforma
Administrativa (PEC 32/2020) que irá destruir os serviços públicos. O debate
público, diante do desempenho pífio da economia do país, tem sido pautado
pelo interesse do mercado e da grande mídia, que condenam os gastos
públicos e depreciam a atuação dos servidores, propondo uma agenda de
Estado Mínimo como solução para os problemas brasileiros. Na prática, isso
significa que os recursos públicos estão sendo transferidos do Estado para o
mercado, em detrimento dos interesses da sociedade. Ou seja, favorecendo
apenas os grandes empresários e banqueiros, que saqueiam os cofres
públicos.

O governo utiliza a premissa de que é preciso realizar a reforma
administrativa para solucionar a questão fiscal e assim retomar o crescimento
da economia. A alegação foi a mesma com a Emenda Constitucional 95
(emenda do teto), com as reformas trabalhista e da previdência. Como é visto
e sentido pelo povo brasileiro, nenhuma dessas medidas teve qualquer força
para gerar empregos, impulsionar o crescimento e o desenvolvimento do país.
Bem diferente do discurso da mídia e do governo, o número de servidores
públicos em relação à população brasileira está abaixo do verificado em
muitos países desenvolvidos. E em relação aos rendimentos, a maior parte dos
funcionários públicos (53%) tem rendimentos concentrados na faixa de até 4
salários mínimos, ou seja, de R$ 3.816,00 (RAIS 2018). No serviço público
municipal, 75% dos servidores auferem até R$ 3.381,00 (RAIS 2018).

A perda de cargo mediante processo administrativo não sofre alterações na
PEC. Todavia, outro dispositivo do texto diz que a perda do cargo por esses
servidores pode se dar a partir de uma avaliação periódica de desempenho,
sendo que os critérios dessa avaliação deverão ser definidos em lei ordinária.
Apesar de a Constituição Federal já prever a avaliação de desempenho o fato
da PEC32 determinar a definição de critérios por meio de lei ordinária facilita a
aprovação e, posteriormente, possíveis alterações. Desta forma, o serviço
público pode facilmente ser submetido a conjunturas políticas momentâneas,
atendendo a intenções governamentais episódicas e a variações ideológicas
do governo de plantão. Adicionalmente, decisões monocráticas de chefias
poderão acentuar, ainda mais, as práticas já consagradas de assédio moral no
âmbito do setor público.

Infelizmente, apesar da estabilidade, a arbitrariedade já é uma realidade
que os trabalhadores e trabalhadoras do serviço público estão submetidos.
Pela força do movimento de luta e pelas legislações vigentes, muitas dessas
decisões arbitrárias são revertidas. Porém, com a Reforma Administrativa,
esta situação de instabilidade e arbitrariedade passará a ser regra.

Assim, uma coisa é aperfeiçoar instrumentos existentes de avaliação, o que
é e sempre será bem-vindo quando aliado à melhora da prestação do serviço
público; outra é, sob a justificativa de aumentar a produtividade e se
intensificar o ajuste fiscal a qualquer preço, sujeitar o servidor à perda do
cargo, por subjetividade das chefias e/ou arbítrio dos governantes em
avaliações pseudo-meritocráticas. Esta relação entra em conflito com o
próprio princípio da continuidade dos serviços públicos, uma vez que toda a
população fica vulnerável com a falta de trabalhadores e trabalhadoras.
Importante destacar que as áreas técnicas, administrativas ou
especializadas da administração pública serão preenchidas na forma de
cargos por prazo indeterminado, o que significa na prática que a maior parte
dos servidores não terá estabilidade durante todo o seu período laboral.

Adicionalmente, outra questão importante é que haverá alterações
também na ocupação de cargos de chefia e direção pelos atuais servidores. A
regra atual prevê que as funções de confiança sejam destinadas
exclusivamente aos servidores efetivos e que os cargos em comissão sejam em
parte preenchidos pelos servidores estáveis e em parte por servidores não
estáveis. A proposta prevê que os cargos em comissão e as funções de
confiança serão progressivamente substituídos pelos cargos de liderança e
assessoramento, de livre nomeação e exoneração. Serão destinados às
atribuições estratégicas, gerenciais ou técnicas, sem fazer distinção entre
aqueles cargos que poderão ser ocupados apenas por funcionários públicos,
selecionados via concurso. Dessa forma, a ocupação de funções técnicas na
administração pública por indicação pode levar ao aumento da ineficiência e à
politização de decisões que deveriam ser de ordem estritamente técnica. Será
a ampliação do apadrinhamento político e a prática inescrupulosa dos
famosos “cabides de emprego”.

Diretamente relacionadas às alterações de ocupação dos cargos estão as
mudanças propostas para o Art. 84 da Constituição, que aumentam
demasiadamente os poderes do presidente da República. De acordo com a
proposta, caso não implique em aumento de despesa, o presidente, por meio
de decreto, poderá, entre outras medidas, extinguir cargos em comissão, de
liderança e assessoramento, funções de confiança e gratificações de caráter
não permanente, estando esses cargos ocupados ou não. Também estando
vagos ou não, o presidente poderá transformar cargos em comissão, cargos de
liderança e assessoramento, funções de confiança e gratificações de caráter
não permanente. Nota-se, que há uma relação desproporcional que garante
poderes que ultrapassam as características do chefe do executivo, em uma
nítida medida de autoritarismo.

Além das questões abordadas anteriormente, a partir da análise da PEC
32, estão previstos também impactos indiretos, dentre eles: 1) Redução do
financiamento dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) e
consequente aumento dos déficits atuariais e financeiros das previdências dos
servidores; 2) Instrumentos de Cooperação e vínculos por Prazo Determinado,
o que pode implicar em fragilização da carreira e das lutas e reivindicações por
direitos e garantias. Estes instrumentos constitucionalizam a terceirização e a
privatização do Estado brasileiro. Isto sem contar que além de prejudicar de
maneira direta os trabalhadores e trabalhadoras atuais, ataca ainda os que já
se aposentaram, completamente diferente do discurso do governo de que só
novos trabalhadores serão afetados.

Assim, a reforma administrativa afeta não somente os futuros, mas
também, os atuais servidores públicos e mesmo aqueles que já se
aposentaram. E, ainda pior que isso, afeta o conjunto da sociedade com a
destruição dos serviços públicos, especialmente as populações mais
vulneráveis.

O desafio para o movimento sindical – que também será impactado com
essa reforma – é desmistificar o discurso oficial de que a reforma não afetará
os atuais servidores públicos, dialogando e informando os trabalhadores
sobre os efeitos nefastos para servidores e serviços públicos e atuando no
Congresso Nacional durante a tramitação e votação da PEC. Mais do que isso,
construir fortes mobilizações para levar esse debate a toda a sociedade, na
medida em que a precarização dos vínculos de trabalho no serviço público
deverá levar a uma série de comprometimentos no atendimento aos
trabalhadores e trabalhadoras em suas demandas sociais.

A Constituição de 1988 consagra vários direitos que, para existirem na
prática, precisam ser efetivados por políticas públicas. Sem elas, tais direitos
não poderiam ser acessados pelos(as) brasileiros(as).
Dentre esses direitos, destacamos os chamados direitos sociais, que são a
educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer,
a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a
assistência aos(às) desamparados(as). As políticas públicas relacionadas a
esses direitos atingem todos(as) os(as) brasileiros(as), não somente os(as)
mais pobres. Aqueles(as) que usufruem de alguns desses direitos
eventualmente por meio de empresas privadas ainda assim são
beneficiários(as) de políticas públicas.

A PEC 32 propõe retirar a primazia do concurso público como instrumento
de seleção de pessoal, enfraquecer e/ou eliminar a estabilidade dos(as)
servidores(as) estatutários(as) e reduzir os patamares salariais, além de
transferir atividades públicas para a iniciativa privada e dar amplos poderes
ao presidente da República para reorganizar o funcionamento do Estado de
forma arbitrária e sem qualquer discussão com o Congresso Nacional e com a
sociedade.

Isso pode ensejar maneiras de efetivação da corrupção e o fomento da
arbitrariedade de agentes privados no âmbito do Estado. Logo, a proposta de
reforma administrativa não se restringe aos(às) servidores(as) públicos(as),
embora este seja praticamente o único aspecto tratado pela imprensa. Se
aprovada, tal reforma beneficiará interesses econômicos privados em
detrimento do bem da coletividade, desprotegendo ainda mais a população
pobre e a classe média.

A proposta de reforma administrativa ataca conquistas democráticas e
pactos sociais construídos desde a redemocratização. As consequências de
uma eventual aprovação dessa reforma serão sentidas não apenas pelos(as)
servidores(as) públicos(as), mas por todos(as) os(as) brasileiros(as), uma vez
que todos(as) – sem exceção – utilizam o serviço público. Situação que deixa a
classe trabalhadora e aqueles que vivem em situação mais vulneráveis de
maneira extremamente desprotegidos e desamparados.

As reformas propostas por esse governo representam a disputa pelos
recursos públicos e tem o objetivo de diminuir ainda mais o papel social do
Estado, não para que ele seja mais ágil, mas para que o setor privado lucre com
as atividades que antes eram públicas. O resultado desse modelo voltado para
o mercado é a ampliação da fome, da pobreza, da concentração de renda e da
barbárie.