De cada 100 benefícios concedidos pelo INSS, 66 são para eles e 33, para as trabalhadoras
Um dos pontos mais polêmicos da reforma da Previdência apresentada pelo governo é a criação de um idade mínima para a aposentadoria, em 65 anos, sem distinção de gênero. Especialistas ouvidos pelo R7 explicam que essa mudança radical não preserva condições especiais de aposentadoria para as mulheres e pode agravar ainda mais as desigualdades no mercado de trabalho.
Atualmente, as regras da aposentadoria são diferentes para homens e mulheres. Mesmo assim, de cada 100 aposentadorias por tempo de contribuição concedidas nos postos do INSS, apenas 33 são para as mulheres enquanto que o dobro (66 benefícios) são para homens.
A trabalhadora pode se aposentar a partir dos 30 anos de contribuição e tem direito ao benefício integral (equivalente a 100% do salário de contribuição), se a soma da idade e do tempo de contribuição for igual a 85.
Para os homens, a regra atual exige 35 anos de contribuição, no mínimo, e o benefício integral é atingido se a soma da idade e do tempo de contribuição for igual, ou superior, a 95.
Mesmo com exigências mais brandas, que compensam a dupla jornada, a discriminação na seleção de vagas e os períodos que a trabalhadora deixa o mercado de trabalho para cuidar dos filhos, o número de mulheres que conseguem atingir as condições mínimas para a aposentadoria é pequeno se comparado ao dos homens. Em 2013, cerca de 195 mil homens se aposentaram por tempo de contribuição, contra apenas 96 mil mulheres.
Em 2014, o INSS contabilizou um total de 291.468 novas aposentadorias por tempo de contribuição: 32,65% para mulheres e 67,35% para homens. No ano passado, o volume de aposentadorias para mulheres ficou na faixa dos 34%.
“Essa desigualdade gritante acontece com a regra de 30 anos de contribuição para mulher e 35 anos para o homens. Imagina então se aprovarem a idade mínima de 65 anos, vai ser muito pior. É uma proposta que vai na contramão da realidade”, diz o advogado Guilherme Portanova, da diretoria jurídica da Cobap (Confederação Brasileira dos Aposentados e Pensionistas).
A proporção de mulheres na sociedade e no mercado produtivo não reflete no percentual de trabalhadoras que conseguem se aposentar. Segundo o IBGE, as mulheres são 51% da população e 44% da mão de obra em idade para trabalhar, muito acima dos 33,4% que finalmente conseguem se aposentar.
Segundo Clemente Ganz, diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), as trabalhadoras são as mais prejudicadas com a reforma. “O fim da diferenciação no tempo exigido para se aposentar vai limitar drasticamente a chance da mulher conseguir se aposentar”, disse.
Viver mais não é desculpa
A regra que garante uma aposentadoria com exigência menor do tempo de contribuição foi aprovada na Constituição 1967 (artigo 158) e confirmada também na Constituição de 1988, após o fim da ditadura militar.
No ano passado, quando foi promulgada a lei 13.183/15, que criou a regra 85/95, o governo e o Congresso mantiveram regras diferentes de acordo com o gênero para garantir que mais mulheres tenham a chance de se aposentar.
Contra a regra diferenciada para as mulheres o argumento recorrente é o de que as trabalhadoras têm uma expectativa de vida maior do que a dos homens e por isso vão receber o benefício por mais tempo.
Porém, para a análise dos impactos na conta da Previdência, os dados que deveriam ser analisados é o da sobrevida a partir de uma determinada idade.
Realmente, aos 20 anos, a sobrevida das mulheres é 6,7 anos maior que a dos homens. Ou seja, uma jovem de 20 anos tem, segundo o IBGE, mais 60,1 anos de vida pela frente contra 53,4 anos de um rapaz da mesma idade. Por outro lado, essa diferença diminui para faixas etárias mais elevadas.
Aos 65 anos, que é o limite de idade que o governo quer implantar para a aposentadoria, a mulher tem uma sobrevida estimada em 19,5 anos, enquanto a do homem é de 16,4 anos. A diferença cai para 3,1 anos. Aos 79 anos, essa diferença é ainda menor, a sobrevida da mulher é de apenas 1,7 ano maior que a do homem. “É um despautério mesmo falar em igualdade de gênero sem observar as diferenças”, disse a advogada Tonia, do Sindinapi.
Fonte: R7