Ao completar seis meses em vigor, a reforma trabalhista tem impactado de maneira mais relevante setores marcados por baixos salários e alta rotatividade, como o comércio, aumentando a precarização para os empregados desse segmento, apontam pesquisadores da Unicamp, em artigo.
No artigo, os pesquisadores Barbara Vallejos Vazquez, Euzebio Jorge Silveira de Sousa e Ana Luíza Matos de Oliveira, do programa de pós-graduação em Desenvolvimento Econômico da Unicamp, analisam os efeitos da reforma trabalhista, que entrou em vigor em novembro do ano passado, em três aspectos: o nível de emprego formal, as demissões por comum acordo e o trabalho intermitente.
Quanto ao nível de emprego celetista, os pesquisadores destacam que a tímida recuperação de 2018, com a criação líquida de 311 mil empregos formais até abril, “está longe de significar recomposição do estoque de empregos”. Segundo os especialistas, o estoque de empregos formais chegou a 41,3 milhões de postos em setembro de 2014, nível máximo da série, caindo para 38,2 milhões em abril de 2018.
Quanto à variação do saldo de emprego nas regiões do país entre janeiro e abril deste ano, os pesquisadores destacam que o Nordeste é a única região que apresenta saldo negativo de emprego formal (-0,61%) e o Norte apresentou crescimento inexpressivo (0,04%), enquanto o Sudeste (0,98%), Sul (1,72%) e o Centro-Oeste (1,87%) tiveram variações positivas no saldo de empregos formais.
“Considerando-se que o estoque de empregos formais é muito maior nos Estados do Sudeste e Sul, e estas regiões registraram crescimento no acumulado do ano, verifica-se uma ampliação da desigualdade regional na geração de empregos formais no país”, escrevem os pesquisadores.
Eles mesmos ressaltam, porém, que “a reforma trabalhista entra em vigor em um período de profunda crise econômica e persistente piora nos indicadores do mercado de trabalho, o que dificulta a distinção entre fenômenos associados aos reflexos da reforma daqueles associados à recessão na economia brasileira”.
A reforma trabalhista criou a figura da demissão por comum acordo, que autoriza a extinção do contrato de trabalho mediante pagamento pela empresa de apenas metade do aviso prévio e metade da indenização sobre o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Já o funcionário pode sacar até 80% do FGTS, mas não tem direito ao seguro-desemprego.
Os pesquisadores destacam que, de janeiro a abril, já foram realizados 52,9 mil desligamentos nesta modalidade. Também houve um gradual aumento da utilização desta forma de desligamento, saindo de 805 em novembro e 5,8 mil em dezembro, para um pico de 13,5 mil em março, caindo novamente a 12,2 mil em abril — quando foram realizados menos desligamentos na economia em geral.
Por tipo de ocupação, as demissões por comum acordo foram mais comuns para vendedor do comércio varejista (2.904 entre novembro de 2017 e abril de 2018), seguida por auxiliar de escritório (1.968), vigilante (1.720) e faxineiro (1.714).
Por setores de atividade, o mais impactado foi o de restaurantes e outros estabelecimentos de serviços de alimentação e bebida (2.787), seguido por transporte rodoviário de carga (1.752), atividade de vigilância e segurança privada (1.721) e comércio varejista (1.681).
Quanto ao trabalho intermitente, 17 mil trabalhadores foram contratados desta maneira desde a aprovação da reforma trabalhista. As ocupações com maior saldo de empregos nesta modalidade de contrato são respectivamente “assistente de vendas”, “servente de obras” e “faxineiro”. Além disso, 93% dos trabalhadores com contratos intermitentes possuem até o ensino médio.
“Com os dados iniciais, pode-se inferir que a reforma tem impactado setores marcados por baixos salários e alta rotatividade, como o comércio, relegando os empregados desse setor a uma situação mais aguda de precariedade”, avaliam os pesquisadores da Unicamp.
Além disso, segundo eles, não está provado que flexibilizar o mercado de trabalho efetivamente gere empregos. “O que os estudos mostram é que a geração de empregos está ligada ao crescimento econômico”, argumentam. “Mas, com os gastos do governo engessados e o crédito escasso, o crescimento hoje no Brasil patina por depender quase que somente do consumo das famílias (e por isso obviamente do mercado de trabalho), que é justamente a variável que se queria ajustar em 2015 com o choque recessivo”, concluem.
Fonte: Valor Econômico