Modificações feitas pelo relator da PEC favorece militares, políticos e desonerações de empresas
Enquanto os trabalhadores ainda sofrem com as novas regras de aposentadoria determinadas pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287, categorias milionárias e benefícios às empresas permanecem fora da reforma da Previdência Social. Divulgadas no parecer do relator da PEC, deputado Arthur Maia (PPS/BA), nesta quarta-feira (19), mudanças propostas pelo parlamentar ainda sacrificam direitos previdenciários históricos e protegem militares e a classe política brasileira.
Justificada pelo suposto déficit de R$ 151,9 bilhões, mesmo com as modificações de Maia, a reforma pretende estabelecer uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos para homens e 62 para mulheres; o acesso a 100% do benefício após 40 anos de contribuição; recolhimento de modo individual definido em lei para todos os trabalhadores rurais de economia familiar e equiparação de regras entre trabalhadores de empresas privadas e servidores – critérios que não incluem os militares e as pensões às suas famílias, responsáveis por um rombo de R$ 17,2 bilhões aos cofres públicos só no ano passado, e o fim às desonerações e renúncias de receitas pertencentes ao orçamento da Seguridade Social.
Com relação aos militares, de acordo com o levantamento do Valor Econômico por meio do Relatório Resumido de Execução Financeira e o Boletim de Informações de Previdência Social, a média do benefício mensal do militar chegou a R$ 9,1 mil em 2016 contra apenas R$ 1 mil da média dos que recebem o benefício do INSS. Ou seja, a despesa do governo com a pensão paga às famílias dos militares é nove vezes maior comparada ao gasto com as pensões em geral, valor (R$ 8 bilhões) que não representou nem a metade do tido com a categoria no ano passado.
Já sobre as desonerações, apesar de o relator introduzir uma modificação no texto original da Proposta para “restringir benefícios fiscais correlacionados a receitas previdenciárias […] com o intuito de determinar que não se promova concessão de isenção, redução de alíquota ou de base de cálculo de contribuições”, ele ainda abriu uma brecha ao permitir as vantagens se houver uma compensação “ao sistema de aposentadorias e pensões custeado por tais receitas”. Uma torneira para o desvio de milhões de reais da Seguridade Social segundo estudo da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP) divulgado este ano.
Conforme o documento-síntese da entidade, R$ 157 bilhões foram capturados da Seguridade por meio das desonerações em 2015, ano em que se anunciava um déficit de R$ 85,8 bilhões na Previdência Social. Na pesquisa, a ANFIP ainda alerta que no mesmo ano R$ 502 bilhões do orçamento da União foram utilizados para o pagamento dos juros da dívida (R$ 66 bilhões a mais do que foi destinado à Previdência) e R$ 63 bilhões foram desvinculados da receita do País por meio da DRU.
Os políticos são outra classe da sociedade que também está sendo privilegiada pela reforma. No texto do parecer do relator da PEC 287, a aplicação das novas regras só será efetivada aos novos eleitos que não estiverem já previamente vinculados ao regime de Previdência parlamentar da Casa para a qual se reelegeram.
Expectativas de vida diferenciadas
Permanecendo o estabelecimento da idade mínima para homens em 65 anos e para mulheres, 62 no relatório do deputado Arthur Maia, seguem legítimos os argumentos da nota técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) publicada em janeiro de 2017. De acordo com o Departamento, “a suposição [de que os brasileiros começam a trabalhar com 16 anos e contribuem desde então ininterruptamente] é totalmente irrealista”.
Na nota, o Dieese critica a fixação da idade mínima baseada na expectativa de vida da população brasileira sem considerar as diferenças regionais. Segundo últimos dados do IBGE, a expectativa de vida no Brasil é de 75,5 anos, porém em estado como Maranhão e Piauí é de 70 anos, o que torna a lógica do estabelecimento da idade mínima injusta para 18 estados brasileiros que estão abaixo da média nacional.
Mesmo para os trabalhadores rurais e os profissionais da segurança pública que tiveram suas idades mínimas à aposentadoria reduzidas para 60 anos (homens/ rurais), 57 (mulheres/ rurais) e 55 (homens e mulheres/ policiais), respectivamente, no texto apresentado nesta manhã, dados mostram que os profissionais de ambas categorias tendem a falecer mais jovens do que aponta a expectativa de vida do País.
Segundo a Federação Nacional dos Policiais Federais (FENAPEF), a expectativa de vida da categoria policial gira em torno dos 60 anos, sendo que cerca de 500 policiais morrem no Brasil a cada 12 meses. Dados estatísticos da Previdência Social (IPEA, 2016) ainda apontam que os trabalhadores rurais aposentados e aposentadas por idade vivem menos que os aposentados urbanos, especialmente as mulheres aposentadas rurais que estão vivendo, em média, cinco anos a menos que as mulheres aposentadas urbanas.
Além das regras citadas, também estão previstas na reforma após a divulgação do parecer do relator da Proposta: o acúmulo de pensão por morte e aposentadoria limitado a dois salários mínimos; o aumento da idade mínima ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) para 68 anos; o pedágio de 30% para quem se enquadrar na regra de transição e o estabelecimento de uma idade mínima à aposentadoria de 60 anos para professores (hoje, não existente).
Para o presidente da CSB, Antonio Neto, as entidades sindicais, os trabalhadores e a sociedade precisam permanecer alertas mesmo com a postura adotada pela grande imprensa e por parte da classe política, que têm tratado as mudanças no projeto de reforma da Previdência como soluções. “As alterações ainda não resolvem o grande malefício que esse projeto trará para toda a classe trabalhadora. Vamos permanecer firmes no combate contra os retrocessos”, completa o dirigente.