As restrições aprovadas para a concessão de seguro-desemprego poderiam ter afetado até 1,3 milhão de trabalhadores se as novas regras já estivessem em vigor no ano passado.
O cálculo é do Dieese e considera os beneficiados do ano passado que não haviam trabalhado por 12 meses ininterruptos antes de fazer o primeiro pedido de benefício, o tempo de 9 meses para a segunda solicitação do benefício e de 6 meses para a terceira.
Pela regra anterior, essa exigência era de 6 meses ininterruptos de trabalho antes de fazer o pedido. As mudanças foram aprovadas no Congresso e constam na medida provisória 665, que restringe o acesso a benefícios trabalhistas com o objetivo de cortar gastos públicos obrigatórios.
O 1,3 milhão que havia trabalhado menos de 12 meses representa 16% dos 8,165 milhões de assalariados que no ano passado receberam R$ 31,893 bilhões de seguro-desemprego. Dotal de pedidos feitos no ano passado, 43% solicitaram o benefício pela primeira vez.
Nos cálculos do Dieese, a economia ao governo se não tivesse que pagar o benefício a essa parcela seria de R$ 5,9 bilhões. PERFIL A maioria dos trabalhadores afetados pelas novas regras pertence ao setor de serviços, comércio e construção civil. Entre os que deixariam de receber o benefício, 43% têm de 18 a 24 anos e quase metade tem ensino médio completo. “São justamente os mais vulneráveis são os mais prejudicados.
Trabalham em setores com rotatividade mais elevada, muitos estão entrando no mercado de trabalho, sem ensino superior em funções de qualificação mais baixa”, diz Patrícia Pelatieri, coordenadora executiva do Dieese. A taxa de rotatividade média do país é de 43,4%, segundo dados do Ministério do Trabalho de 2013.
No caso da construção civil, chega a 88,1%, cita a especialista. No ano passado, quando se discutia por que o seguro-desemprego era tão alto se a taxa de desemprego era tão baixa, muitos economistas defendiam que um dos fatores poderia se relacionar à “indústria da rotatividade”. Ou seja, o seguro-desemprego de alguma forma incentivaria os trabalhadores a sair da vaga, principalmente porque, com o mercado de trabalho aquecido, não teriam dificuldade para se recolocar depois.
ROTATIVIDADE
Para o professor Theodoro Agostinho, especialista em previdência social da Fipecafi (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras), a mudança no seguro-desemprego pode ter como contrapartida frear a rotatividade mais intensa do mercado de trabalho. “Pode haver impacto positivo para o empregador, porque essa mão de obra pode parar de ‘rodar’ no mercado de trabalho”, afirma. “Mas é bom destacar que esses trabalhadores, com menor fidelização ao emprego, têm em sua maior parte menor qualificação, portanto ocupam funções menos bem remuneradas, por isso se apegam menos ao emprego. Trocam de vaga muitas vezes por causa dos baixos salários”, completa. Com as novas regras, entretanto, que exigem mais tempo com carteira assinada para receber o seguro, o professor acredita que vão permanecer mais tempo em uma mesma função.
EFEITO INVERSO
A especialista do Dieese chama a atenção ainda para o efeito que o não pagamento do benefício pode causar à arrecadação do governo, uma vez que esses trabalhadores não teriam o seguro-desemprego para consumir. “O dinheiro do seguro é para ajudar o trabalhador até que ele consiga uma nova ocupação e, portanto, direto para o consumo. Sem esse recurso, que é da ordem de R$ 5,9 bilhões, o governo economiza de um lado, mas deixa de arrecadar do outro ao menos R$ 2,6 bilhões”, diz a coordenadora.
Para chegar a essa estimativa, o Dieese considerou que a tributação indireta nessa faixa de renda dos afetados pelo não recebimento do seguro-desemprego ficaria em torno de 44%, explica. “Quem mais acessa o seguro-desemprego são os trabalhadores com menores ganhos (até dois salários mínimos). Isto porque essas ocupações, no nosso mercado de trabalho, são as que têm maior rotatividade, e menores benefícios.
São inclusive os trabalhadores com maior dificuldade de comprovar contribuição previdenciária para conseguir aposentadoria. Porque há muitas lacunas, como períodos de desemprego e sem contribuição, em sua vida laboral. O professor da Fipecafi concorda com a avaliação do Dieese. “O seguro-desemprego não vai para a poupança, mas sim para o consumo. Em um primeiro momento, a mudança é interessante ao governo pela economia que gera. Mas, a médio prazo, terá de pensar em outras saídas porque esses recursos geram menos consumo e têm impacto na geração de receita com imposto”, explica.
REAÇÃO
Para a Força Sindical, a única forma agora de evitar a mudança é pressionar para que o STF avalie a Adin (ação de inconstitucionalidade) que a central ingressou para impedir a mudança de regra no benefício. “Não houve união das centrais na votação para impedir que essa medida prejudicasse os trabalhadores. É preciso fazer ajustes, mas não se pode penalizar quem mais precisa do benefício”, diz Miguel Torres, presidente da Força.
Para a CUT, os protestos realizados nesta sexta-feira e a proposta de uma greve geral são formas de “expor o Congresso Nacional e cobrar do governo a manutenção dos diretos dos trabalhadores”.
Fonte: Folha de S.Paulo – CLAUDIA ROLLI