O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira (PTB), disse ontem que o governo “não pode surpreender o trabalhador” com a inserção, na reforma trabalhista, de pontos que não haviam sido acordados com entidades patronais e centrais sindicais no início do ano, quando encaminhou sua proposta ao Congresso Nacional.
Ele citou como exemplos o trabalho intermitente e o fim da contribuição sindical obrigatória, que o relator Rogério Marinho incluiu em seu parecer lido em comissão especial na semana passada.
“Precisamos manter a coerência naquilo que foi construído com trabalhadores e empregadores. E não houve consenso com relação ao trabalho intermitente. E também não houve a discussão no que diz respeito à contribuição sindical”, disse o ministro. “É coerente por parte do governo não surpreender o trabalhador com pontos novos além daqueles que foram construídos como consenso.”
Mais cedo, em um debate na Câmara, seu assessor direto Admilson dos Santos havia feito críticas a vários pontos do relatório de Marinho, como rescisão, bancos de horas, aprendizagem e trabalho intermitente. Após a audiência, Marinho disse a jornalistas que poderia alterar alguns pontos, mas que fazia questão de manter o fim do imposto sindical em seu parecer.
Para o ministro, os deputados têm “autonomia” para modificar a proposta. Mas isso não significa necessariamente que o presidente Michel Temer irá sancionar a íntegra do texto que for por eles aprovado. “O governo quer uma reforma que consolide direitos, dê segurança jurídica e gere empregos. O que o governo não pode é surpreender o trabalhador e o empregador no que diz respeito àqueles pontos que se sobrepõem àquilo que foi construído no acordo”, afirmou. “Depois que a Câmara deliberar, aí o governo vai avaliar ponto a ponto, podendo vetar ou não.”
Mais cedo, em audiência na Câmara, Admilson Moura dos Santos, assessor especial do ministro já havia feito críticas a diversos pontos da reforma, como rescisão, bancos de horas, aprendizagem e trabalho intermitente, que precisam ser “aprimorados”.
A proposta que o governo encaminhou ao Congresso em janeiro previa a alteração em 12 pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O Marinho, entretanto, modifica mais de cem artigos da legislação promulgada por Getúlio Vargas na década de 1940.
Uma crítica de Santos está relacionada à multa imposta às empresas por não registrarem seus trabalhadores. Na proposta do governo, ela subiria de R$ 402 para R$ 6.000, e R$ 1.000 para microempresas. O relatório baixou a R$ 3.000. Para Santos, dado que a CLT prevê desconto de 50% sobre o valor da multa caso a empresa autuada não recorra da punição, ela perderia o efeito de inibir essa prática.
Ao comentar uma alteração feita no artigo 5º da lei, Santos afirmou que a mudança “acaba com o banco de horas como nós conhecemos” e cria incentivo para que “todas as empresas migrem para o banco de horas individual”. Atualmente, ele só pode ser pactuado mediante convenção coletiva de trabalho. Mas o substitutivo permite que banco de horas possa ser pactuado também através de acordo individual, “sem qualquer benefício extra, a não ser a limitação do período de seis meses”.
Em relação ao trabalho intermitente, sua principal crítica é o caráter irrestrito dado por Marinho a essa figura, hoje inexistente na lei brasileira. Para ele, é preciso delimitar as áreas específicas e por quanto tempo o trabalho intermitente pode ser realizado. “Se permitirmos a intermitência sem salvaguardas, isso permitirá a troca de trabalhadores [contratados em regime regular] por outros em trabalho intermitente”, afirmou.
Quanto à aprendizagem, Santos mostrou preocupação com um parágrafo inserido por Marinho no artigo 429 da CLT, determinando que o aprendiz que teve seu contrato transformado em contrato por prazo indeterminado fará parte do percentual de 5% a 15% de participação de aprendizes ante o quadro de trabalhadores das empresas. Segundo ele, essa modificação “tenderá a acabar com a aprendizagem na empresa”.
Ele também criticou a supressão feita por Marinho de trechos da CLT que determinavam que a rescisão contratual só será válida quando feita perante o Sindicato ou autoridade do Ministério do Trabalho. Ou, na ausência deles, na presença de um juiz de paz.
Sem essa mediação, diz Santos, o trabalhador que não concordar com os valores oferecidos pela empresa no ato da demissão terá que se submeter um acordo extrajudicial ou entrar na Justiça contra a empresa, o que pode levar de oito meses a dois anos para ser concluído. “Só restará ao trabalhador entrar na Justiça ou fazer acordo extrajudicial”, disse. “Isso pode forçar o trabalhador a aceitar qualquer coisa.”
Fonte: Valor Econômico