Juiz do TRT 2ª Região destaca que trabalhador que não contribui pode não ser beneficiado pelos direitos adquiridos nas negociações coletivas
O Juiz Marcelo Donizeti Barbosa, da 81ª Vara do Trabalho de São Paulo, declarou improcedente o pedido de ação declaratória apresentado pela empresa SoftPlan Planejamento e Sistemas LTDA, solicitando que a Justiça determinasse que a contribuição sindical fosse paga apenas pelo trabalhador que autorizasse individualmente o desconto.
Na decisão publicada no último dia 22, Donizeti Barbosa afirma que “o âmbito de atuação e vigência das contribuições destinadas ao custeio do sistema sindical, segundo decorre da Constituição Federal, não é o dos direitos individuais, mas sim o dos direitos coletivos”.
Segundo a argumentação do juiz, “não se vislumbra, no contexto dos limites previstos nas normas constitucionais vigentes, a possibilidade de o trabalhador, agindo individualmente, opor-se à contribuição destinada ao custeio do sistema sindical do qual ele também faz parte.”
“A Constituição Federal afirma que é a assembleia geral quem fixará a contribuição destinada ao custeio do sistema de representação sindical, deixando claro que a sistemática de custeio da vida sindical seja feita pela vontade coletiva da categoria, em assembleia, e não pela vontade individual isolada de cada trabalhador. Aceitar a escolha individual como controladora do custeio do sistema sindical seria impor um mecanismo de inércia contra o regime de independência sindical afirmado pela Constituição Federal”, argumenta o juiz.
Nesta ótica, Marcelo Donizeti é categórico na fundamentação de que as contribuições são imprescindíveis para o custeio do sistema coletivo de representação de toda a categoria, o que impede que a autorização do recolhimento das contribuições seja submetida apenas à vontade individual do trabalhador.
O juiz destaca também que o trabalhador é livre para não querer integrar nenhuma categoria, entretanto “pela mesma lógica, também é evidente que assim agindo, o trabalhador poderá não ser beneficiado pelos direitos previstos em normas coletivas negociadas pelos integrantes da categoria do qual não queira fazer parte. Trata-se da consequência mais lógica e direta, mas inversa, da liberdade conferida ao trabalhador”.
Marcelo Donizeti Barbosa discorre sobre as alterações propostas pela Lei 13.467 na legislação trabalhista, sobretudo no que tange à contribuição sindical, e argumenta que “a pretendida escolha facultativa e individual, para o custeio da representação sindical nacional, se acolhida, em desconformidade com nosso sistema constitucional, poderia permitir que elementos externos interfiram na sobrevivência do próprio sistema”.
O texto da decisão destaca também que “a mencionada autonomia individual de vontade, seja do trabalhador, quanto a do empresário, poderia permitir que fatores externos à própria categoria agissem com a finalidade de tolher sua livre atuação jurídico-constitucional. Nesse contexto, este fato, possível de se concretizar, implicaria na indireta intervenção do Estado e de terceiros na organização sindical”.
Leia abaixo os principais trechos da sentença do juiz Marcelo Donizeti Barbosa
“Os empregadores vêm argumentando, de forma bem singela e direta, que a autorização dos trabalhadores para o desconto das contribuições destinadas ao seu próprio Sindicato, conforme as novas disposições da CLT, deveria ser efetuada pelos próprios trabalhadores, mas individualmente.
Este argumento, contudo, apesar de aparentemente sustentado em disposição da Lei, esconde uma perigosa sutileza: a de permitir que se inviabilize a própria existência dos Sindicatos de trabalhadores, provocada por um lento e gradual estrangulamento econômico, singelamente coordenada pelos empregadores que integram a categoria econômica correspondente.
Ocorre que, e aí se encontra toda a sutileza do argumento, o âmbito de atuação e vigência das contribuições destinadas ao custeio do sistema sindical, segundo decorre da Constituição Federal, não é o dos direitos individuais, mas sim o dos direitos coletivos.
O Sindicato da categoria é pessoa jurídica cuja atuação se insere no mundo dos direitos coletivos, e não dos direitos individuais. Tanto assim é, que é muito comum os Sindicatos de trabalhadores não transigirem direitos individuais de cada um dos integrantes de sua base.
Não se vislumbra, no contexto dos limites previstos nas normas constitucionais vigentes, a possibilidade de o trabalhador, agindo individualmente, opor-se à contribuição destinada ao custeio do sistema sindical do qual ele também faz parte.
As contribuições são destinadas ao custeio do sistema coletivo de representação de toda a categoria e, nesse passo, não se deve submeter seu custeio apenas à vontade individual de cada trabalhador.
Salvo se, no ápice de sua manifestação individual de vontade, o trabalhador não queira integrar nenhuma categoria, porque, o trabalhador é livre para não integrar nenhum grupo sindical. Esta é a forma mais expressa que decorre do direito de associação.
No entanto, pela mesma lógica, também é evidente que assim agindo, o trabalhador poderá não ser beneficiado pelos direitos previstos em normas coletivas negociadas pelos integrantes da categoria do qual não queira fazer parte. Trata-se da consequência mais lógica e direta, mas inversa, da liberdade conferida ao trabalhador.
A Constituição Federal afirma que é a assembleia geral quem fixará a contribuição destinada ao custeio do sistema de representação sindical, deixando claro que a sistemática de custeio da vida sindical seja feita pela vontade coletiva da categoria, em assembleia, e não pela vontade individual isolada de cada trabalhador.
Aceitar a escolha individual como controladora do custeio do sistema sindical, seria impor um mecanismo de inércia contra o regime de independência sindical afirmado pela Constituição Federal.
Sim, um mecanismo de inércia, e invertido. Porque, pela interpretação que pretende defender aqueles que vislumbram a imposição da vontade individual sobre a da categoria, se o trabalhador nada fizer, nada ocorrerá, ou seja, se ele nada fizer e não autorizar nada a ninguém, nenhuma contribuição será devida ao seu Sindicato.
Nos tempos idos do antigo imposto sindical, não estava em jogo a existência do próprio sistema sindical nacional, segundo os contornos dados pela Constituição Federal. Agora, está em questão a existência do sistema e a própria eficácia da Constituição Federal, questionada por interpretação fundada em Lei ordinária e, com o devido respeito, não há necessidade de se reiterar que a Constituição Federal não pode ser interpretada a partir da Lei.
Na relação jurídica de direito sindical, parece muito normal ver o empregador no lado oposto àquele em que está o Sindicato dos trabalhadores.
Nesse passo, não há porque admitir que a autorização para desconto destinado ao custeio da atividade sindical deva ser de forma individual e organizada pelo empregador em sua sede.
Admitir essa interpretação, será admitir a possibilidade de interferência externa, permitida pelo próprio Estado, por meio da Lei.
A interferência que é vedada pela Constituição Federal, na organização sindical, não é somente aquela praticada pelo próprio agente público, mas também aquela que é praticada indiretamente por terceiro, facultada ou estimulada pelo próprio Estado.
Aceitar como legítimo que somente a escolha individual decida o custeio da representação sindical da categoria, exigirá, por uma razoável dose de coerência, que aquele que se exclui do sistema sindical não pode por ele ser beneficiado, resultado esdrúxulo que conflitaria diretamente com todo o sistema de proteção dos direitos sociais mínimos, previsto na Constituição Federal”.
Fonte: Sindpd