Imposto mínimo para super-ricos em análise aproximaria Brasil da média internacional dos países da OCDE
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, confirmou nesta quinta-feira (10) que o governo estuda a criação de um imposto mínimo para milionários para compensar uma eventual reforma do Imposto de Renda.
Essa é uma das possibilidades que estão sendo analisadas por Lula como contrapartida para isentar o IR para salários até R$ 5 mil, conforme prometeu o presidente durante a campanha eleitoral em 2022.
“Não é um compromisso de campanha. É um compromisso de justiça. Você não pode fazer com que as pessoas que ganhem R$ 5 mil paguem Imposto de Renda, enquanto os caras que têm ações da Petrobras recebem R$ 45 bilhões de dividendos sem pagar. Você não pode cobrar 27% ou 15% de um trabalhador que ganha R$ 4 mil e deixar os caras que recebem herança não pagar”, disse Lula nesta sexta (11) em entrevista à rádio O Povo.
Atualmente, a faixa de isenção é de dois salários mínimos (R$ 2.824) e as demais faixas não foram corrigidas. A última correção foi em 2015, e a defasagem da tabela do IR já ultrapassa os 160%.
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Segundo Haddad, foram encaminhadas quatro propostas ao presidente, cada uma delas com exercícios sobre parâmetros. “O presidente está avaliando cada um desses cenários e pedindo exercícios novos à Receita Federal”, disse. Ele não detalhou quais são as outras propostas sob análise.
Haddad contou também que uma das demandas de Lula é por uma reforma neutra do ponto de vista fiscal. “Se tiver algum ganho de renda é para compensar alguma outra medida de desoneração”, afirmou.
Detalhes do imposto mínimo
Conforme apuração da Folha, a proposta de imposto mínimo sobre pessoas físicas milionárias em análise teria uma alíquota entre 12% e 15% da renda sobre quem recebe acima de R$ 1 milhão por ano.
Para fazer a cobrança, seria feita uma comparação entre o valor da aplicação do imposto mínimo sobre a todas as fontes de renda da pessoa – como rendimento de aplicações financeiras, lucros e dividendos, salário etc – e o que ela efetivamente pagou sob o sistema atual. Se ela pagou menos que a alíquota mínima, deverá complementar a diferença até atingir o patamar de 12% a 15%.
Outro objetivo da proposta, segundo Haddad, é aproximar o Brasil da média internacional das alíquotas praticadas pelos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Milionários pagam menos no Brasil
Um estudo feito pelo Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional) no ano passado, com base nos dados do Imposto de Renda Pessoa Física 2022 (ano-base 2021), constatou que os contribuintes que declararam ganhos totais acima de 160 salários mínimos (R$ 176 mil por mês ou R$ 2,1 milhões anuais) pagaram, em média, 5,43% de alíquota efetiva de Imposto de Renda, ou seja, muito abaixo do imposto mínimo em estudo.
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O levantamento demonstrou ainda que os milionários pagaram menos que profissionais no serviço público considerados “privilegiados”.
A alíquota média para carreiras da administração pública direta correspondeu a 9,54%, sendo esse índice maior entre servidores do Ministério Público (11,83%), membros do Poder Executivo (12,15%), servidores do Poder Judiciário (12,53%), carreiras de gestão governamental e analista (13,66%), servidores do Poder Legislativo (13,76%), servidores do Banco Central (14,48%), carreiras de auditoria-fiscal e fiscalização (14,73%) e advogados do serviço público (15,66%).
“O povo trabalhador, proporcionalmente, paga mais imposto do que o rico. Então, o que nós queremos fazer é isentar as pessoas que ganham até R$ 5 mil e no futuro isentar mais. Na minha cabeça, salário não é renda. Renda é o cara que vive de especulação. Esse, sim, deveria pagar Imposto de Renda. Mas o povo trabalhador chega no fim do ano e pega a participação no lucro dele, um pouquinho, e vai lá: 27% de Imposto de Renda. E são a maioria. São eles que sustentam esse país, porque o rico paga, proporcionalmente, menos imposto. Esse debate não tem que ser feito escondido. Tem que ser público. As pessoas têm que saber quem paga o quê e quanto se paga. É isso que falta nesse país”, afirmou Lula na entrevista à rádio.
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Potencial de arrecadação
A criação do imposto mínimo para milionários com uma alíquota efetiva de 12% tem o potencial de arrecadar R$ 44,8 bilhões por ano, segundo cálculo feito pela Warren Investimentos em relatório divulgado nesta quarta.
O cálculo foi feito com dados da declaração do IRPF de 2022 (ano-base 2021) e identificou que 251.951 pessoas poderiam ser abarcadas pelo imposto mínimo.
“Fizemos uma conta técnica em cima dos dados públicos. Fiquei até surpreso com o valor alto”, explicou o economista-chefe da Warren, Felipe Salto, que assina o relatório junto com Josué Pellegrini e Gabriel Garrote.
Para Salto, a tributação adicional dos mais ricos pode dar certo, a depender dos detalhes da sua implementação. Especialista em contas públicas, ele lembra que aumentar a faixa de isenção do IRPF só seria legalmente viável mediante à apresentação de medidas de compensação da perda de arrecadação.
Uma eventual isenção de IR dos que ganham até R$ 5 mil exigirá medida de compensação porque a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) estabelece que as renúncias tributárias só podem ser aprovadas se acompanhadas de estimativas de impacto econômico-financeiro da política e de eventuais medidas compensatórias.
Articulação no Congresso
Ao ser questionado se o projeto deve ser enviado antes do fim do ano ao Congresso Nacional, Haddad afirmou que “não há pressa em mandar, há pressa em aprovar”. Segundo ele, o governo está prezando por um texto com análises técnicas “bem feitas” a fim de dar segurança aos deputados e senadores.
O minitro comparou o processo ao da reforma tributária. “Como nós resolvemos a tributária? Resolvemos explicando. Enquanto nós internamente não estivermos absolutamente convencidos da proposta, ela está em análise e com o presidente acompanhando cada movimento nosso”, disse.
Em entrevista nesta quinta, Haddad adotou um tom cauteloso sobre o uso da nova forma de arrecadação para financiar o aumento da faixa de isenção do IRPF.
“Não estou com nenhuma pressão sobre esse assunto [isenção], porque há alguns critérios que o presidente faz questão que a medida atenda. O primeiro deles é o fato de que ela tem que ser uma reforma neutra, do ponto de vista arrecadatório. Não pode ter perda de arrecadação e não pode ter ganho de arrecadação”, afirmou Haddad.
Com informações de Folha de S.Paulo
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil