Sindicalistas analisam levantamento feito pelo UOL; entre os principais pontos de atenção estão a falta de médicos e de leitos e a espera na marcação de consultas
Em entrevista ao site da CSB, a vice-presidente da Central, membro do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e presidente da Federação Nacional dos Odontologistas (FNO) e do Sindicato dos Odontologistas do Estado da Paraíba (SINDONTO/PB), Joana Batista de Oliveira Lopes, e o secretário do Meio Ambiente da CSB Rio de Janeiro e presidente do Sindicato dos Farmacêuticos do Estado do Rio de Janeiro, Francisco Claudio de Souza Melo, analisaram os principais problemas da saúde pública e privada brasileira.
Os problemas foram apontados a partir de uma pesquisa recente feita pelo UOL. A reportagem se baseou nos dados do Sistema de Indicadores de Percepção Social (IPS), do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do Fisc Saúde 2016, do Tribunal de Contas da União (TCU), da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), do IBGE, e um ranking encomendado ao Reclame Aqui e outro elaborado pela Agência Nacional de Saúde (ANS).
Faltam médicos
Em novembro do ano passado, em audiência pública no Senado Federal, o presidente do TCU, ministro Raimundo Carreiro, afirmou que a falta de médicos é o “o principal problema do SUS” (Sistema Único de Saúde). De acordo com informações do Conselho Federal de Medicina (CFM), há somente um médico para cada 470 brasileiros. Segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), há 17,6 médicos para cada 10 mil brasileiros.
Joana Batista afirmou que uma das causas para o número insuficiente de médicos é a má condição de trabalho imposta principalmente pelo sistema público. “Um dos problemas mais graves enfrentados pelo SUS é a precarização do trabalho, a terceirização e o descaso com os profissionais de saúde, remuneração com gratificações e salários baixíssimos”, frisou.
“Outro problema é a jornada de trabalho em que o profissional de saúde só pode ter duplo vínculo público”, disse. Ou seja, o médico não pode ter contrato com mais de dois municípios, mesmo com dias disponíveis. “Esse médico fica à disposição do serviço privado, enquanto isso o povo sofre nas filas dos serviços públicos”, afirmou a vice-presidente.
Longa espera para marcação de consulta
Conforme informações do Fisc Saúde 2016, o País tem uma média de 2,8 consultas por habitante no ano de 2012, o 27º índice entre 30 países. Entre os países mais bem colocados estão Coreia do Sul (14,3), Japão (12,9) e Hungria (11,8).
“Quem depende do SUS para realizar uma consulta ou exame sabe como a espera pode ser longa. Com equipes formadas por um número insuficiente de profissionais, que precisam trabalhar sobrecarregados para atender à demanda, a qualidade e a rapidez do atendimento ficam comprometidas”, analisou a dirigente.
Faltam leitos
Uma pesquisa de 2017 do Datafolha, encomendada pelo CFM, apontou o incremento do número de leitos como a terceira medida que o governo deveria tomar para que a saúde pública tivesse progresso. Segundo ranking do Reclame Aqui, a falta de leitos foi a 8º reclamação mais feita pelos brasileiros. De acordo com a Associação Nacional de Hospitais Privados, o Brasil tem 2,3 leitos por mil habitantes. A OMS recomenda entre 3 e 5.
“O problema do SUS está diretamente relacionado ao financiamento. É indispensável começar a rever a tabela do SUS. Ao mesmo tempo, é preciso encontrar urgentes formas de financiamento para a construção de novos hospitais públicos. No ponto a que se chegou, ou se age com rapidez ou as consequências serão desastrosas”, frisou Joana Lopes.
Atendimento na emergência
Em agosto de 2016, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou pesquisa de satisfação dos brasileiros com 13 serviços públicos. De uma escala de 0 a 100, o atendimento na emergência recebeu 20 pontos. Em estudos do Ipea sobre a saúde pública, o tópico teve grande rejeição: 31,1% (postos de saúde) e 31,4% (urgência ou emergência).
“As suas portas de urgência e emergência ainda apresentam dificuldades evidentes, em maior grau, provocadas pela imensa demanda de condições clínicas de urgência e emergência na ‘Rede de Urgência e Emergência (RUE)’. Não houve aumento do RUE na proporção que aumenta a necessidade da população”, ressaltou a vice-presidente da CSB.
Falta de recursos para a saúde
Conforme a OMS, somente 3,6% do orçamento do governo federal foram repassados à saúde em 2018. O levantamento mostra que a despesa com saúde no Brasil é de 4 a 7 vezes menor do que o de países como Reino Unido, França, Argentina e Chile. Por conta de emenda à Constituição que congela os gastos públicos por 20 anos, a proporção não mudará em futuro próximo. Segundo o Ipea, o contingenciamento representa perda de R$ 743 bilhões para o SUS no período.
Para a vice-presidente, o montante destinado ao SUS “não é suficiente para garantir um sistema universal”. “O subfinanciamento do SUS é crônico e data de sua criação”, diagnosticou.
Formação de médicos
Conforme publicou o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), quase 40% dos recém-formados não são aprovados em seu exame. No resto do Brasil, apenas Goiás e Rondônia aplicam testes para avaliar o conhecimento adquirido no curso. De acordo com o Ministério da Educação, duas em cada 10 faculdades de medicina não atingiram nota desejável no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) em 2016.
“A gente sabe que a educação não está do jeito que a gente gostaria que estivesse. Isso acontece em todos os níveis para todas as profissões. Temos uma grande liberação por parte do pelo Ministério da Educação de faculdades e universidades para formar pessoas, e essa educação, algumas vezes, não é uma educação de qualidade. Muitas faculdades abrem e depois fecham porque não há funcionários para manter os cursos. Sem uma fiscalização adequada, saem profissionais despreparados”, afirmou Francisco Claudio de Souza Melo.
Mensalidades dos planos de saúde
O valor das mensalidades dos planos de saúde é a principal crítica dos usuários (39,8%), conforme o Ipea. De acordo com a ANS, a categoria “mensalidades e reajustes” ficou na terceira posição entre as reclamações em pesquisa com consumidores feita nos três primeiros meses do ano passado.
“As mensalidades dos planos de saúde são extremamente abusivas. O governo precariza a saúde pública para que de forma emergencial haja terceirização como forma de ‘salvação da lavoura’. Eles destroem o SUS, destroem o serviço público, toda a saúde pública, para ter como forma de salvação os planos de saúde”, frisou o secretário do Meio Ambiente da CSB Rio de Janeiro, Claudio Melo.
Cobertura do convênio
Outra reclamação dos clientes é a cobertura insuficiente. Na pesquisa produzida pela ANS, o tema ficou em primeiro lugar nas críticas. No estudo do Ipea, a cobertura pouco abrangente é o segundo ponto mais citado: 35,2% dos entrevistados reprovam o serviço.
Melo explica que considera a carência do plano absurda, já que essas empresas lucram com o pagamento da maioria dos outros clientes, que poucas vezes ao ano fazem exames ou se consultam com especialistas.
O levantamento do UOL também apontou como grandes problemas da saúde a quantidade de serviços que não têm reembolso do plano de saúde e a discriminação por sexualidade ou classe social enfrentada no atendimento.
Proposta
Joana Batista de Oliveira Lopes é militante da saúde e aponta como um importante passo para a melhoria do setor uma proposta de piso nacional para todos os trabalhadores do SUS custeado pelo governo federal. “É inadmissível que servidores públicos cujas profissões se encontram regulamentadas, com o mesmo nível de formação e exercendo as mesmas atividades, em um sistema que é único e universal, sigam percebendo salários diferenciados de cidade para cidade, de região para região”, criticou.