Uma cooperativa de Medianeira (PR) foi condenada por assédio eleitoral contra seus empregados e deverá pagar indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 500 mil.
A decisão é da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-PR), que considerou que a empresa feriu a livre convicção de voto dos empregados e prestadores de serviço, violando princípios garantidores do Estado Democrático de Direito, atingindo toda a sociedade. O julgamento ocorreu em 10 de outubro, na sede do Tribunal, em Curitiba.
Em 2022, de acordo com a denúncia, a cooperativa promoveu uma série de atos visando influenciar e até mesmo coagir seus empregados a votar em determinado candidato a presidente da República. Afirmava que o outro candidato traria o “caos” e que a cooperativa estaria ameaçada, assim como o emprego de seus trabalhadores.
O diretor da empresa utilizava os meios de comunicação internos para direcionar os votos dos trabalhadores, incluindo a rádio da cooperativa, exaltando o seu candidato e depreciando o opositor.
Relacionada: MP do Trabalho registra explosão de denúncias de assédio eleitoral: 14x mais casos em 2022
Em liminar concedida ainda em 2022 contra a cooperativa, a juíza do Trabalho Tatiane Raquel Bastos Buquera citou trechos de mensagens enviadas ao cooperados pelo diretor-presidente da cooperativa:
“Agora estamos seguindo um caminho e à frente não teremos uma encruzilhada, mas uma estrada bifurcada, indicando duas direções: uma para a esquerda, o socialismo, com o que tem de pior em um governo, engajando pessoas jovens, intelectuais e as universidades com uma nova largada na escalada da corrupção; ou seguimos para a direita, construindo um país que cultiva valores e governa com moralidade.
Me preocupo com a Lar, com meus filhos, meus netos e com as novas gerações. A Lar tem gerado valor, pagando dividendos aos associados, participação dos resultados aos funcionários e intenso apoio a eventos sociais das comunidades.
Para meus filhos e netos, como para as novas gerações, quero um país descente e com desenvolvimento.
Não quero me arrepender, no futuro, de não ter me posicionado para evitar um desastre diante do atual momento político. Por isso, me dirijo a você, líder, a hora é agora, vamos falar com as pessoas e colocar estes dois cenários, estes dois mundos, pois precisamos estar conscientes para escolher.
O presidente Bolsonaro trabalhou com equipe técnica, fazendo o melhor em um tempo difícil até que um tempo melhor surgisse para fazer ainda melhor, sempre com a marca de uma gestão séria.
Pensemos nisto, sabendo que o caminho melhor para a nossa geração, para os nossos filhos e netos é reeleger o presidente Bolsonaro.”
Os atos foram denunciados ao Ministério Público do Trabalho, que ajuizou a ação civil pública, pleiteando danos morais coletivos.
A 1ª Turma do TRT-PR afirmou que ficou evidente que a empresa ultrapassou os seus limites diretivos e se utilizou de seu poder econômico para tentar influenciar o voto de seus empregados e prestadores de serviços, por meio de publicações e programas de rádio, “pintando” um “cenário de terror”, caso um dos candidatos vencesse a eleição, com ameaças explicitas à manutenção dos empregos.
O colegiado entendeu que a reiterada prática de intimidação aos empregados que, embora não coagidos fisicamente, “foram moralmente direcionados a escolherem o candidato que, segundo a empresa, adotaria políticas econômicas que possibilitariam a manutenção dos empregos, configurou o assédio eleitoral”.
A conduta do empregador feriu o direito de voto, que é um direito fundamental previsto no artigo 14 da Constituição Federal e que pertence a todos os cidadãos. A norma prevê, também, o voto secreto e com valor igual para todos. Ainda, a Constituição Federal consagra, em seu artigo 1º, o pluralismo político como fundamento do Estado Democrático de Direito e, em seu artigo 5º, a liberdade de consciência, a proteção da intimidade e da vida privada, a liberdade de expressão e o direito à convicção política.
Já a Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) prevê expressamente que por “discriminação” compreende-se toda distinção, exclusão ou preferência fundada, entre outras hipóteses, na opinião política, sendo que esta não pode ser utilizada para destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão, frisou o Colegiado ao embasar o julgamento.
A 1ª Turma ressaltou que houve conduta ilícita, dano e nexo causal, além da ofensa ao patrimônio jurídico de uma coletividade, ou seja, uma ofensa significativa e intolerável a interesses extrapatrimoniais, “reconhecidos e inequivocamente compartilhados por uma determinada coletividade”.
A condenação “é de suma importância para a sociedade, sobretudo pelo efeito pedagógico para os demais empregadores. Trata-se de atuação institucional firme para proteção do regime democrático, marca do Estado Brasileiro, e que se realiza justamente pelo pluralismo, liberdade de orientação política e respeito à diversidade”, disse a procuradora do Trabalho Cláudia Honório, de Foz do Iguaçu, que ajuizou a ação.
“O poder diretivo do empregador não é absoluto, e não pode, jamais, implicar discriminação, coagir ou direcionar o exercício do voto, sob pena de configurar abuso de direito, violando o valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana”, concluiu.
O acórdão da ação civil pública será redigido pelo desembargador Eliázer Antonio Medeiros. A decisão de primeiro grau, que já havia concedido o dano moral coletivo, é da juíza Tatiane Raquel Bastos Buquera, titular da 1ª Vara do Trabalho de Foz do Iguaçu.
O valor do dano moral coletivo será revertido ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) ou a outra destinação social, a critério do Ministério Público do Trabalho.
O caso refere-se ao processo ACPCiv 0000880-55.2022.5.09.0095.
Informações: Ministério Público do Paraná