Acordos devem ser assinados antes do período de apuração e necessitam de aval do sindicato dos trabalhadores e de mecanismos para aferir cumprimento de metas
Uma decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) pode tornar mais difícil para as empresas afastar a incidência de contribuição previdenciária sobre programas de Participação nos Lucros e Resultados (PLR). A 2ª Turma da Câmara Superior definiu ontem parâmetros para se obter a isenção: devem ser assinados antes do período de apuração e necessitam de aval do sindicato dos trabalhadores e de mecanismos para aferição do cumprimento de metas.
Foi a primeira vez que a nova composição da Câmara Superior analisou alguns pontos, inclusive alterando entendimento anterior, favorável aos contribuintes. Na mesma sessão, os conselheiros julgaram a tributação de bônus de contratação (hiring bônus, valor pago para atrair o funcionário), mantendo a tributação. Os temas foram analisados, respectivamente, em processos envolvendo a Alcoa Alumínio e o banco de investimentos Credit Suisse.
Os planos de PLR, previstos na Constituição, foram regulamentados somente em 2000, pela Lei nº 10.101. O benefício depende de acordo e tem carga tributária reduzida – não incide contribuição previdenciária. Porém, quando a Receita Federal entende que o contribuinte descumpriu pré-requisitos da lei e que a remuneração tem caráter salarial, cobra a contribuição previdenciária, que é de cerca de 20%.
Por conta de divergências sobre o que caracterizaria descumprimento, empresas acabam recorrendo à esfera administrativa. No caso da Alcoa Alumínio, três pontos foram o centro da discussão, referente a resultados alcançados entre 2008 e 2009: a data de assinatura do acordo, a existência de mecanismos para checar o cumprimento de metas e o aval de sindicatos.
O julgamento dividiu os conselheiros. O desempate foi feito pelo presidente, por voto de qualidade. Prevaleceu o entendimento de que a data de assinatura do acordo – posterior ao início do período de apuração do PLR – poderia retirar da verba uma característica essencial à recompensa pelo esforço feito para alcance de metas.
A necessidade de mecanismos de aferição também foi reforçada, por impedir a comprovação de que a meta foi cumprida. “Para que se configure metas claras é necessário que quem está sujeito à regra possa medir se está alcançando”, afirmou o relator, conselheiro Luiz Eduardo de Oliveira Santos, representante da Fazenda.
Além disso, a assinatura de sindicato é uma imposição da própria lei, no entendimento do relator, e não basta a empresa apenas procurar os representantes. A Alcoa Alumínio pode recorrer da decisão na Justiça ou no Carf, por meio de embargos.
O julgamento sobre bônus de contratação também foi definido por meio do voto de qualidade. O Fisco entende que o bônus tem natureza salarial e cobra o recolhimento de contribuição previdenciária sobre o valor.
O assunto foi discutido pela primeira vez na Câmara Superior em um processo envolvendo o banco de investimentos Credit Suisse. No caso, a fiscalização verificou a garantia de pagamento de US$ 2 milhões, como hiring bônus, no contrato de um executivo feito em 2008, para que ele permanecesse no banco até, pelo menos, 2009.
Para o relator, conselheiro Luiz Eduardo de Oliveira Campos, o fato de ser um pagamento único não basta para configurar a eventualidade. “O conceito de remuneração engloba toda verba recebida em decorrência do contrato de trabalho”, afirmou.
No julgamento, o banco também discutia a cobrança de contribuição previdenciária sobre plano de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) acordado no mesmo ano do cumprimento das metas. O advogado do banco, Rubem Perlingeiro, do escritório Ulhôa Canto Advogados, defendeu no Conselho que exigir a celebração do acordo no ano anterior ou início do ano pode inviabilizar um PLR. “A celebração de acordo de PLR, principalmente quando envolve bancos, é muito difícil. Ela se estende ao longo do ano.”
O voto do relator, conselheiro Luiz Eduardo de Oliveira Campos reformou decisão anterior, de turma do Conselho, e determinou o retorno do processo para a turma a fim de que sejam analisados outros aspectos da autuação que não haviam sido debatidos. O advogado do banco afirmou que os US$ 2 milhões incluem outros valores além do bônus de contratação.
O advogado Leandro Bettini, do contencioso administrativo fiscal do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr e Quiroga Advogados, destacou que, por meio de voto de desempate, a decisão sobre PLR alterou posição anterior da Câmara Superior do Carf. “O tema é relativamente novo. Antes havia decisão favorável ao contribuinte, por maioria”, afirma.
Pelas decisões anteriores, bastava, por exemplo, o contribuinte provar que procurou o sindicato e o acordo poderia ser fechado durante o período de aferição do PLR, desde que antes de seu pagamento. O bônus de remuneração, por sua vez, foi pouco julgado no Carf, de acordo com o advogado.
A decisão acaba obrigando as empresas a dar maior atenção a detalhes e formalidades nos programas de PLR, dificultando a elaboração dos planos, segundo Fábio Lunardini, do Peixoto & Cury Advogados.
Procurados pelo Valor, o Credit Suisse e a Alcoa Alumínio preferiram não comentar as decisões.
Fonte: Valor Econômico