O trabalho como motorista de aplicativo configura vínculo empregatício. Nessa relação, embora a luta entre capital e trabalho esteja mascarada pela tecnologia, o algoritmo faz as vezes do empregador.
Essa é a interpretação do desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4) Marcelo D’Ambroso, relator do processo em que a multinacional Uber foi condenada a pagar R$ 1 milhão por dumping social na semana passada.
Na linguagem técnica, algoritmo é uma sequência finita de instruções ou operações executada para resolver um problema computacional. No caso dos aplicativos de transporte, é uma ferramenta que reúne todas as informações disponibilizadas pelo motorista e pelo passageiro e, a partir delas, define preços e trajetos, prioriza um trabalhador em detrimento de outro, estabelece punições e recompensas.
O dumping social, segundo aquela decisão, consiste em “prática reiterada pela empresa do descumprimento dos direitos trabalhistas e da dignidade humana do trabalhador, visando obter redução significativa dos custos de produção, resultando em concorrência desleal.”
Na avaliação do desembargador, a Uber causou danos não apenas ao motorista que entrou com a ação, mas a toda a sociedade. Portanto, o valor da indenização deverá ser pago a uma entidade pública ou filantrópica a ser definida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
“O algoritmo possibilitou a implantação do chamado trabalho zero hora, sonho de consumo do capitalismo selvagem para remunerar única e exclusivamente as horas efetivamente trabalhadas, sem direitos sociais nem benefícios”, afirma Marcelo D’Ambroso ao Brasil de Fato.
“Não há nada de novo nisso. É apenas uma outra forma de mascarar a luta entre capital e trabalho, operando em favor do poder econômico, com algumas maldades: evita a consciência de classe, na medida em que esses trabalhadores não se encontram e não se conhecem, dificultando a atividade sindical e de luta pela melhoria da sua condição social; mascara a própria condição de trabalhador do indivíduo prestador de serviços, pulverizado numa lógica de ‘empreendedorismo’ na qual ele empreende e quem lucra é o outro”, completa.
Nesta entrevista, o desembargador analisa os impactos das plataformas digitais no mundo do trabalho e o papel do Judiciário na garantia dos direitos humanos.
Sobre o processo específico que resultou na condenação por dumping social, D’Ambroso não pode fazer comentários, uma vez que o caso ainda está em aberto e cabe recurso.
Confira a entrevista completa do desembargador no portal Brasil de Fato