Para Pezão, tráfico se aproveita das manifestações para atacar UPPs

O governador defende o papel do partido como “sustentáculo” da aliança governista desde o mandato de FHC e acha que o PMDB não deve abrir mão de uma candidatura presidencial própria em 2018

Após duas gestões como vice de Sérgio Cabral (PMDB), o novo governador do Rio, o também pemedebista Luiz Fernando Pezão, assumiu com um triplo desafio: governar o Estado em um dos momentos mais turbulentos na área de segurança pública nesta década, tornar-se conhecido em seu próprio Estado e, claro, eleger-se. Com baixo percentual de intenção de votos, menos de 10%, não parece, porém, intimidado.

Com a autoridade de quem saiu do interior, da pequena Piraí, um dos menores municípios fluminenses, com 26,3 mil habitantes, propõe novos parâmetros para um pacto federativo e insiste na necessidade de renegociação das dívidas de Estados e municípios.

Trata a relação com a presidente Dilma Rousseff como um de seus maiores trunfos na disputa que travará com outros aliados do Planalto pela vaga no Palácio Guanabara, mas reforça – sempre que possível – laços com lideranças tão diversas quanto os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e auxiliares de Fernando Henrique Cardoso.

O governador defende o papel do partido como “sustentáculo” da aliança governista desde o mandato de FHC e acha que o PMDB não deve abrir mão de uma candidatura presidencial própria em 2018. “Tenho dito de forma sistemática que o PMDB tem que ousar e ter candidato à Presidência da República”.

Sonha longe, mas precisa voltar rapidamente à realidade. Pressionado pelo recrudescimento do crime organizado em comunidades consideradas pacificadas, terá que dar conta rapidamente das circunstâncias da morte do dançarino Douglas da Silva Pereira na comunidade do Pavão-Pavãozinho. Como no caso do pedreiro Amarildo, morto na Rocinha no ano passado, novamente a suspeita recai em policiais de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). “Vou conversar com o Beltrame amanhã [hoje]”, diz.

Valor: Qual será o foco da sua campanha à releição?

Luiz Fernando Pezão: Em dezembro, era conhecido por 23% do eleitorado. Hoje, sou conhecido por 46%. Não tenho pesquisa desses 20 dias que estou no governo, mas tenho convicção de que o governo tem muita coisa para mostrar. Na segurança mesmo. Pode questionar que tem hoje um recrudescimento em algumas áreas, onde o tráfico quer voltar, locais mais conturbados onde a gente está sob testes, mas os legados são significativos. Um apartamento na Barão da Torre, em Ipanema, [próximo à favela] valia R$ 80 mil. Agora, vale R$ 1 milhão. A política de pacificação teve ganhos extraordinários para o cidadão, para o entorno, mas não são em oito anos que vamos vencer essa guerra.

Valor: Esse momento mais crítico da segurança não será o alvo principal dos seus adversários?

Pezão: Acho que depois das manifestações, o tráfico se aproveitou. Até alguns políticos se aproveitaram desse momento e passaram a questionar as UPPs. Mas não tem caso de sucesso maior na política de segurança do país. Quando a gente poderia imaginar que teríamos 11 centros de pesquisas se instalando no Fundão, em frente à [favela da] Maré. São empresas, investimentos voltando para o Rio. Nesses sete anos, mais de 23 mil empresas se instalaram no Estado. Saímos de um orçamento de R$ 33 bilhões para R$ 84 bilhões.

Valor: O senhor acha que houve uma falha da inteligência em não antecipar esse recrudescimento da violência em áreas pacificadas?

Pezão: Não. O traficante do Pavão-Pavãozinho [Pitbull] estava preso. A justiça o liberou no indulto de Natal, para ir e voltar. Ele voltou e está barbarizando lá. Vamos ter que prender de novo. Acho que, no Rio, a gente tem que fazer um grande pacto. O código penal do Rio não pode ser o mesmo do Acre. Os Estados têm que ter alguma autonomia nessas áreas.

Valor: O senhor já tem alguma proposta para isso?

Pezão: Não. O Beltrame está fazendo. Isso vai ser apresentado. Eu vou conhecer os detalhes amanhã [hoje]. Até junho, julho, o Beltrame vai apresentar. Já vamos extrapolar o número [de UPPs] que o Sérgio [Cabral] tinha falado na nossa reeleição. Vamos chegar a umas 45 UPPs com a Maré. Das grandes, ocupamos todas.

Valor: O governador Sérgio Cabral saiu com o prestígio muito abalado, como o sr. pretende contornar isso?

Pezão: Não estou preocupado. O que as pesquisas mostram sobre a imagem do Sérgio é que ele tem 24% de ótimo e bom. Isso foi de onde partiu a primeira eleição do Eduardo Paes [prefeito do Rio]. Ando de cabeça erguida nos 92 municípios do Estado. Esse Estado passou 30 anos brigando com Brasília. Hoje, tudo que eles fizeram aqui deu certo. O presidente Lula era entusiasta e a presidente Dilma é entusiasta igual. Ela diz que é impossível separar os sete anos e três meses de governo deles da nossa administração.

Valor: O fato de ter outro candidato apoiado pelo presidente Lula não preocupa [senador Lindbergh Farias, do PT]?

Pezão: Não. Acho que está cedo. O povo só vai se ligar em agosto, setembro na eleição. Até lá tem muita coisa para ser feita.

Valor: A presidente Dilma também estava distante da disputa do Rio. Reaproximou-se depois daquela semana conturbada em Brasília, em que a bancada do PMDB na Câmara acabou impondo uma derrota ao governo. A que o senhor credita essa mudança de humor?

Pezão: Ela sempre falou comigo que queria andar e ver as obras. Foi ela mesma que pediu agenda de 15 em 15 dias no Rio para ver as obras e entregar. Isso é coisa do Congresso.

Valor: O senhor acha que diante da aliança entre PT e PMDB o senador Lindbergh pode desistir da candidatura ao governo do Estado?

Pezão: Nem trabalho com isso. Acho natural todos os partidos se colocarem. Isso é o fortalecimento dos partidos.

Valor: E se o senhor for para o segundo turno, tem expectativa do apoio dele?

Pezão: Tenho muita. Ajudei muito na candidatura dele ao Senado. Apresentei a ele o interior, aos prefeitos e ex-prefeitos. Ele não conhecia nem 10 das 92 cidades.

Valor: Então ele tem uma dívida?

Pezão: Não considero dívida. É uma liderança nova do PT que tem que ser respeitada. O PT acha que ficou prejudicado por ter ido a reboque do PMDB. Acho que o PT cresceu com a gente. Uma das coisas que o PMDB faz muito bem e as pessoas no país não entendem é que o PMDB respeita muito os acordos políticos. Por isso conseguimos fazer as grandes coligações, ser um sustentáculo desde o governo Fernando Henrique e do governo do Lula e da Dilma. A gente respeita liderança, respeita os acordos, as tratativas de uma eleição, a montagem de uma coligação. O PT saiu de duas prefeituras para 11. Tem um senador, tem o vice-prefeito do Rio. Todos os partidos cresceram na nossa aliança.

Valor: Na eleição presidencial, quem tem que ser o candidato este ano: a presidente Dilma ou o Lula?

Pezão: Ah aí [risos] tem que ver… já tenho tanto problema aqui na minha coligação… mas acho que tem que ser a Dilma. Se você pega o primeiro mandato do presidente Lula, ele teve muita dificuldade [para se reeleger]. Tanto que não foi reeleito direto, foi para o segundo turno. E a Dilma, que tinha muito menos vivência política de lidar com a máquina, com parlamento, prefeitos e governadores, saiu-se muito bem. O país é muito complicado e difícil. A centralização em Brasilia absorve, o político mais experiente tem dificuldade.

Valor: O fato do empresariado estar muito crítico ao governo Dilma não pesa?

Pezão: O empresariado está sempre crítico. Isso não ganha eleição. Eu particularmente acho que ela se saiu muito bem diante da vivência que ela tinha. Agora tem as dificuldades que todos tiveram.

Valor: O senhor defende a renegociação da dívida de Estados e municípios. Acha que tem chance de passar até o fim do ano?

Pezão: Não sei. Falei com a presidente Dilma em 2010. Ela ficou nervosa dizendo que era Lei de Responsabilidade Fiscal, que não queria mexer. Disse que poderíamos fazer um pacto pelo investimento na infraestrutura do país. Eu disse: a senhora reduz os juros a um nível aceitável e, com o que reduzir, Estados e municípios fazem um fundo de desenvolvimento para o país. Se somar o Brasil, dá uns R$ 50 bilhões. Ela não aceitou.

Valor: O senhor acha que é um tema que tem que ser discutido?

Pezão: Não tenho dúvida nenhuma. Temos que rediscutir o pacto federativo senão o Brasil fica capenga. Sou municipalista. Acho que tem que ter mais dinheiro nos municípios.

Fonte: Valor Econômico

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