Novas regras não elevam desemprego de domésticos

Embora o número de trabalhadores domésticos tenha continuado a diminuir no ano passado, a taxa de desocupação do segmento não subiu. Em 2013, o número de empregados nos serviços domésticos diminuiu 7,7% nas seis regiões metropolitanas cobertas pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME) em relação a iguais períodos de 2012. A retração é a mais intensa desde 2002, início da série histórica disponibilizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entre 2007 e 2013, o volume médio de pessoas que desempenhavam serviços domésticos diminuiu em 281 mil e chegou a 1,404 milhão, ainda segundo o levantamento.

Apesar da redução, o desemprego não cresceu nesse segmento. A taxa média de desocupação nos serviços domésticos foi de 2,3% no ano passado, bem abaixo, portanto, da taxa de desemprego oficial, de 5,4%. Para analistas ouvidos pelo Valor, os números mostram que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 66, promulgada em abril, que amplia os direitos dos trabalhadores domésticos e, por consequência, encarece o serviço, não promoveu uma “onda de desemprego”, como aventado na época.

 arte27bra-111-domestico-a4Gabriel Ulyssea, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), observa que a redução da ocupação nos serviços domésticos é uma tendência anterior à regulamentação da atividade. “O aquecimento do mercado de trabalho, em particular o setor de serviços, fez com que muitas trabalhadoras domésticas migrassem para outras ocupações”, avalia. A combinação de queda do desemprego, aumento da formalização e salário mínimo tornaram as ocupações alternativas mais atraentes para essas trabalhadoras, afirma, ao mesmo tempo em que encareceram o seu custo de contratação para as famílias. Para ele, a PEC pode ter acelerado esse fenômeno e promovido uma evasão mais rápida de trabalhadores para outras áreas. “A consequência é obviamente uma redução da demanda. Mas, como isso aconteceu nesse contexto de aquecimento do mercado de trabalho, não houve aumento do desemprego”.

Os dados da PME mostram que o volume de empregados no setor tem caído de forma consistente pelo menos desde 2010, a taxas médias anuais de 2,3%, 3,6%, 2% e 7,7% em 2013. Ao mesmo tempo, o desemprego no setor, que era de 6,8% em 2003, vem diminuindo paulatinamente nos últimos dez anos, chegando a 2,2% em 2012 e mantendo relativa estabilidade no ano passado (2,3%).

Adriana Nunes Ferreira, professora do Instituto de Economia da Unicamp, relaciona a redução da ocupação no emprego doméstico, além da migração para outras áreas, também ao aumento da população não economicamente ativa (PNEA) que não gostaria de trabalhar. O aumento da renda familiar permitiu aos jovens estudar por mais tempo, aos mais velhos, sair mais cedo do mercado de trabalho e, em outros casos, a alguns membros da família a sair do emprego e se dedicar apenas à casa, afirma. No ano passado, a PNEA que não gostaria de trabalhar avançou 2,4% em relação a 2012. “O argumento de que a formalização das relações de trabalho é prejudicial ao emprego é uma velha tese conservadora, já há muito desmentida pelos fatos”, comenta.

Alexandre Loloian, técnico da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), observa que muitas mensalistas optaram por virar diaristas no ano passado na região metropolitana de São Paulo. Segundo os dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), feita em parceria com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o número de empregadas mensalistas caiu 9,7% em relação a 2012, reduzindo o estoque para 411 mil pessoas. Na contramão, o volume de diaristas avançou 5,7%, para 240 mil. “Isso sim pode ser efeito da PEC”, afirma.

Os dados para as seis regiões metropolitanas que compõem a amostra da pesquisa seguem no mesmo sentido. Segundo levantamento feito pelo Dieese a pedido do Valor, o total de mensalistas caiu em 8% em 2013, enquanto o de diaristas aumentou em 2% na comparação com o ano anterior.

Na capital paulista, a mudança nem sempre é motivada por uma redução da demanda. Rose Silva, por exemplo, achou mais vantajoso permanecer como diarista, apesar da insistência da patroa em assinar a carteira. “Eu já pago meu INSS [Instituto Nacional do Seguro Social] e, mesmo com a carteira assinada, não teria direito a seguro desemprego e FGTS [Fundo de Garantia do Tempo de Serviço]”, explica. A PEC 66 regulamenta temas como duração da jornada de trabalho e piso salarial. Benefícios como seguro desemprego e FGTS só passarão a valer depois que lei entrar de fato em vigor. Alexandra Conceição, que trabalha como mensalista no Rio de Janeiro, preferiu esperar pela aprovação da lei com a carteira assinada. Com os encargos extras impostos pela formalização, afirma, o salário diminuiu um pouco, mas ela prefere “ter os direitos garantidos”.

Em São Paulo, Rose consegue sair do emprego principal no horário do almoço e aproveita as tardes para fazer faxina em residências menores. Ela cobra a partir de R$ 60 por uma permanência de quatro horas. Dessa forma, o salário no fim do mês é bem mais vantajoso, afirma. Para Lúcia Garcia, supervisora do sistema PED, do Dieese, essa é uma tendência que deve se fortalecer nos próximos anos. “As casas são cada vez menores e, por isso, não é preciso mais tanto tempo para mantê-las em ordem. Além disso, as famílias tradicionais já não são regra, muita gente mora sozinha”, pondera.

Fonte: Valor Econômico

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