Trabalhadores e empresários realizarão um ato público nesta quinta-feira (9) conjunto em defesa da manutenção da desoneração da folha de pagamentos em São Paulo. O protesto será na Avenida Paulista (esquina com a Rua Augusta), na capital paulista, a partir das 8h30.
A manifestação ocorre após o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Cristiano Zanin, suspender a desoneração a pedido do governo federal. A decisão gerou contrariedade em diversos setores da sociedade e pode causar um aprofundamento da precarização das relações de trabalho no país, além de demissões em massa. A desoneração atinge 17 setores da economia que, juntos, empregam mais de 9 milhões de pessoas.
Pelo sistema da desoneração, as empresas fazem uma substituição tributária e pagam imposto de 1% a 4,5% sobre sua receita bruta em vez de recolher 20% de INSS sobre a folha de pagamento. A medida em vigor desde 2011 era válida até o fim de 2023, mas foi prorrogada até o fim de 2027 por decisão do Congresso Nacional.
“A queda abrupta da desoneração, provocada por ação do Executivo no STF, levará a forte aumento de tributos sobre a folha, demissões massivas de mão de obra e elevação de preços de produtos para a população. Conclamamos todos a participarem do movimento, que mostra o reconhecimento das vantagens da desoneração para o emprego, a sustentabilidade das empresas e o desenvolvimento do país”, diz parte do texto divulgado pelos organizadores da manifestação.
Mandado de segurança
Na última terça-feira (30), o Sindicato dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação de São Paulo (Sindpd-SP) – em conjunto com a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação (Feittinf) – entrou com um mandado de segurança pedindo à Justiça Federal que retome a desoneração da folha de pagamento do setor de TI até que o julgamento do caso seja concluído pelo STF.
“Mudar o regime tributário agora é um desarranjo no sistema muito grande. Vai gerar desemprego e, se mantido isso [suspensão da desoneração], no meu setor que é Tecnologia de Informação vai gerar precarização, vai aumentar pejotização, cooperativas fraudulentas de trabalho. Porque o patrão ele tem um planejamento tributário e ele vai querer se adaptar de alguma forma”, argumenta Antonio Neto, presidente do Sindpd-SP e da CSB.
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O ato é apoiado por centrais sindicais, como a CSB, por federações sindicais, como a Feittinf, e pelo sindicato dos trabalhadores de TI de São Paulo, o Sindpd-SP. No fim de abril, as entidades sindicais emitiram uma nota oficial (leia aqui) na qual criticam a decisão do ministro do STF e a ação da Advocacia Geral da União (AGU), autora do pedido de suspensão, em nome do governo federal.
“É surpreendente ver o governo empenhado em revogar uma medida implementada por um governo do PT, enquanto demonstra pouca vontade política em revogar as políticas prejudiciais dos governos de Temer e Bolsonaro. Se o mesmo empenho fosse direcionado para revogar as maldades da Reforma Trabalhista e da Previdência, poderíamos estar mobilizando a classe trabalhadora por uma causa mais popular, justa e com potencial de melhorar significativamente a vida dos trabalhadores”, diz trecho da nota.
Enxurrada de ações
Após o mandado de segurança impetrado pelo Sindpd-SP e Feittinf, entidades representativas das empresas de TI e de outros setores também entraram com ações tentando impedir a mudança abrupta do regime tributário.
A Confederação Nacional de Serviços (CNS) afirmou no processo que moveu contra a liminar que os contribuintes “acordaram da noite para o dia com um inesperado aumento de seus custos fiscais, sem que pudessem ter tempo hábil para se planejar financeiramente a fim de fazer frente à nova despesa tributária criada pela decisão cautelar”, o que, segundo a entidade, representa uma afronta ao princípio da segurança jurídica.
O argumento das empresas segue a mesma linha da ação movida pelo Sindpd dias antes, que também ressaltou que a liminar de Zanin “feriu de morte” o princípio da segurança jurídica por acabar com a previsibilidade ao mudar o regime tributário das empresas abruptamente, sem um prazo hábil para adaptação.
“As empresas de TI seriam penalizadas duas vezes: uma porque não teria mais o benefício da desoneração e a segunda porque têm que preparar a atualização do sistema para poder entrar com o processamento de dados na folha de pagamentos já com o novo sistema. Existem prazos para isso e o prazo que foi dado é muito curto para implementar abruptamente”, disse o presidente da CNS, Luigi Nese, em entrevista à TV Record.
Impacto na Previdência
De acordo com levantamento da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brassom), a Previdência Social teria deixado de arrecadar R$ 58 bilhões nos últimos seis anos se não houvesse a política de substituição tributária. Apenas em 2023, seriam R$ 12,7 bilhões a menos.
“É importante frisar que essa política gerou empregos, e gerou empregos formais, o que pode parecer um detalhe, mas não é, porque esses empregos formais têm arrecadação para o INSS, FGTS e o Imposto de Renda do trabalhador, que é recolhido na fonte”, disse o diretor da Brasscom, Sergio Sgobbi.
Entenda o caso
A lei da desoneração se aplica a 17 setores econômicos que, juntos, são responsáveis por 9,3 milhões de vagas de emprego no país. No regime, em vez de o empresário pagar 20% sobre a folha do funcionário, o tributo pode ser calculado com a aplicação de um percentual sobre a receita bruta da empresa, que varia, conforme o setor, de 1% a 4,5%.
A prorrogação da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia até 2027 foi aprovada pelo Legislativo em outubro do ano passado, mas foi vetada integralmente pelo presidente Lula menos de um mês depois. Em dezembro, o Congresso derrubou o veto de Lula, com votos de 60 senadores (contra 13) e 378 deputados (versus 78).
Além de contrariar sindicalistas, o ato do presidente contrariou 84% dos deputados (430 dos 513 votaram a favor do texto) e a maioria dos senadores no Senado, a proposta passou com facilidade, aprovada em votação simbólica, que acontece quando há consenso entre os parlamentares.
As entidades representantes dos 17 setores desonerados, dos trabalhadores e de organizações da sociedade civil fizeram coro pela derrubada do veto do presidente. Essas instituições estimam que ao menos 1 milhão de vagas sejam perdidas sem a desoneração.
No início deste mês, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, adiantou que a AGU judicializaria a questão. Dias antes, o presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), excluiu a reoneração da folha de pagamento dos municípios brasileiros, instituída pela MP (Medida Provisória) 1.202/2023. A decisão foi tomada quando o parlamentar prorrogou por mais 60 dias os efeitos do texto.
O tema voltou ao centro do debate em 25 de abril, quando, a pedido do governo federal, o ministro do STF Cristiano Zanin concedeu uma liminar suspendendo a lei da desoneração da folha de pagamento alegando falhas no processo legislativo, especialmente a falta de observância em relação à Lei de Responsabilidade Fiscal. A decisão do ministro tem efeito imediato.
Meta de déficit fiscal zero
Editada no fim do ano passado, a medida originalmente pretendia reonerar a folha de pagamento de 17 setores econômicos dos municípios com até 156 mil habitantes e também acabar com os incentivos tributários do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos). O governo defendeu que a medida era necessária para cumprir a meta de déficit fiscal zero prevista para 2024.
A edição dessa MP gerou atritos com o Legislativo, já que o Congresso Nacional havia derrubado o veto presidencial que barrou a desoneração desses impostos dos municípios e dos 17 setores econômicos poucos dias antes. Após negociações com os parlamentares, o governo recuou e editou uma nova MP, excluindo a reoneração às empresas, mas mantendo a dos municípios e as mudanças no Perse.
De acordo com Pacheco, pela regra da noventena – prazo de 90 dias para que uma lei de alteração de tributos passe a ter efeito – as prefeituras passariam a sofrer os efeitos da reoneração de impostos em 2 de abril. Em vez dos atuais 8% de alíquota de contribuição previdenciária sobre as folhas de pagamentos, arcariam com 20%.